Há um claro desejo do debutante no cinema Diego Freitas em abraçar o mundo com seu O Segredo de Davi no que tange abordar o nascimento de um psicopata e a execução do crime perfeito, temas esses que passeiam desde os ricos experimentos de Alfred Hitchcock com Festim Diabólico e Psicose até a densidade de clássicos como O Silêncio dos Inocentes e a provocação amoral, utilizando um exemplo mais recente, de Lars von Trier com seu A Casa Que Jack Construiu, no qual O Segredo de Davi, por pouco, não se assemelha a uma versão brazuca. Partindo de um viés contemporâneo onde o jovem David do título (Nicolas Prattes) descobre suas tendências psicopatas ao cometer seu primeiro assassinato e encontrar boa tarde do prazer no ato ao filmar com sua câmera e postar as mortes de forma anônima na internet, o roteiro também de Diego Freitas abre as portas para um potencial estudo de personagem por detrás de suas tendências, mas se embaralha ao articular tão mal suas várias ideias e se “apropriar” de uma estética hollywoodiana que, mesmo que pouco usual ao cinema nacional de gênero, descamba para a prepotência quando se revela um mero floreio para um script cambaleante. O que carrega O Segredo de Davi para o fundo são, principalmente, todos os excessos promovidos por Freitas, desde a ambientação supostamente carregada por uma trilha sonora intrusiva e que dita artificialmente a tensão das situações, o trabalho estético que, embora caprichado por si só (há enquadramentos que valorizam a iluminação das locações), pouco adiciona aos objetos finais da fita, ou a construção caricata de Davi, que leva Nicolas Prattes a sentir o peso de um personagem necessitado de nuances para torná-lo narrativamente atraente ao público, e com isso resvalar numa composição caricatural que sempre parece acima do tom, revelando a insegurança do intérprete que, ao lado de rostos desperdiçados que vêm e vão conforme a necessidade do roteiro (Neusa Maria Faro e André Hedges sucumbem ao artificialismo do conjunto), entrega pouco do que o papel realmente exige. E não somente o uso da suposta homossexualidade de Davi revela um profundo mal gosto na abordagem, como a própria subtrama familiar envolvendo o passado do protagonista termina por travar e desviar o foco do roteiro de ausências consideráveis, o que denota falta de habilidade, preparo ou até mesmo planejamento por parte da produção, e não estranhe se você terminar os quase 120 minutos com certa confusão na cabeça: as rupturas narrativas, temporais e de lógica interna de O Segredo de Davi são um sinal de que a principal falha de O Segredo de David está em abordar tanto ao mesmo tempo. Por incrível que pareça, não é impossível vislumbrar lapsos de interesse no trabalho de Diego Freitas e apegar-se a eles para levar a experiência até o fim. Há ideias, em especial no campo visual, muito potentes e que revelam um cineasta desejoso para adentrar no campo da experimentação de gênero que nomes como Gabriel Amaral, Juliana Rojas e Marco Dutra tanto promoveram recentemente. O que O Segredo de Davi apresenta é este despreparo na percepção do que realmente importa na tela. Os simbolismos estão lá, mas não provocam o suficiente. A sofisticação é notável, mas cai no banal em certo momento. Há diversos contrassensos, e nisso há poucas oportunidades para que o filme supere suas escolhas duvidosas.