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Críticas

Cineplayers

Conexão forçada.

5,5
Rua Cloverfield, 10, estreia de Dan Trachtenberg no cinema após passar anos dirigindo comerciais e canais de internet e ser cotado para dirigir a adaptação da graphic novel Y: The Last Man, que acabou cancelada, é um filme que nasceu de um roteiro desenvolvido há anos e que por muito tempo foi chamado de The Cellar, autoria de John Campbell e Matt Stuecken, que foi então rebatizado com o codinome Valencia, quando adquirido pela Bad Robot para encobrir detalhes da produção. 

Uma sequência de Cloverfield - Monstro (Cloverfield, 2008) esteve em discussão desde o lançamento do primeiro filme, mas sempre foi postergado devido a agenda e projetos dos envolvidos, o diretor Matt Reeves e o produtor J. J. Abrams. O produtor, que então começava a tomar o mundo de assalto com sua revitalização do cinema blockbuster, queria fazer algo de novo com o cânone do primeiro filme, mas sem repetir o estilo found footage tão em moda à época. Foi então que The Cellar/Valencia começou a ser produzido, e todos os envolvidos notaram similaridades o suficiente no estilo do filme (ambientação de ficção científica, tensão, humor) para transformar o que seria um roteiro “simples” na continuação de um dos blockbusters mais falados dos últimos anos. O resultado acabou sendo chamado por Abrams de um “parente”, uma continuação espiritual de Cloverfield

O que assistimos é um drama de confinamento que se inicia quando a jovem Michelle (Mary Elizabeth Winstead) é levada para dentro de um bunker por Howard (John Goodman), que alega que um ataque alienígena acabou com toda a vida em volta espalhando altíssimos níveis de radiação e começa a conspirar com o outro confinado Emmet (John Gallagher, Jr.) uma forma de escapar do encerramento forçado ali. Um filme que, a bem da verdade, tenta vestir do manto “Cloverfield” mais de uma vez, mas seu drama isolado funciona sozinho, e sua relação com o grande blockbuster acaba se tornando um percalço para o mesmo.

Trachtenberg conduz o filme com apropriada tensão, alterando o espaço limitado - um bunker desenhado para cerca de dois anos de autossuficiência até a radiação começar a dissolver - com espaços e barreiras que vão afunilando o filme a um desfecho trágico a cada minuto, encontrando em Michelle uma protagonista engenhosa e inventiva, a quem cabe escapar do espaço criado de maneira compulsiva e paranoica por Howard. John Goodman constrói seu personagem com sabedoria, interpretando seu misto de razão e desequilíbrio de forma ambígua, sempre sendo difícil delinear onde termina a argumentação e começa a ameaça. A cena onde o trio joga “Perfil” logo após de Michelle e Emmett passarem a planejar a fuga é um bom exemplo disso, sendo um dos grandes momentos do filme.

Porém, enquanto o filme acerta muitas vezes em não sair daquele universo em uma casca de noz e focar grande parte de seu esforço na ambiguidade e nas tentativas de escapar dali, a impressão frequente é que não apenas seria possível passar perfeitamente sem a temática alien, o que dirá do universo que é inserido no filme, o que rende momentos completamente destoantes, sem nenhum laço dramático funcional com o cerne da obra. Ainda que sejam encarada pela produção como algo que iria diferenciar a obra de um suspense correto e eficiente, os “momentos Cloverfield” são um filme à parte, sem tempo para se desenvolver, esticando a metragem com ação frenética sem muito sentido onde antes havia uma queda-de-braço entre duas forças que é apresentada como a grande questão do filme.

Repartir o cargo de antagonismo entre o paranoico humano e o que vem de fora também não mostrou ser uma decisão das mais acertadas: Howard é muito mais assustador do que qualquer coisa que o filme venha a mostrar - onde lhe faltam dentes, escamas e movimentos esquisitos, há uma persona composta, tão aterrorizante quanto cômica, utilizada pelo roteiro tanto para estabelecer os protagonistas quanto para tirá-los da normalidade, provocando dentes rilhando ou sorriso amarelo, tendo até a tradicional música pop em certo ponto avançado do filme servindo de ironia que pontua o suspense construído. 

De resto, o filme pouco escapa de reencenar artifícios já muito empregados por seu “irmão mais velho”, mas dessa vez de forma pouco inspirada, deixando transparecer que cumpre exigências de contrato, fazendo de tudo para que um humilde roteiro escrito pelos idos de 2012 que provavelmente conseguiria fazer algum sucesso em locadoras, streaming ou televisão a cabo consiga um grande elenco, com computação gráfica de primeira linha e com uma grande divulgação para que então pareça uma produção maior do que realmente é. Mas não é o caso, e o filme fica lá pelo meio do caminho, enterrado pela própria conexão forçada a um universo ao qual pertence de forma algo bastarda, diminuindo as próprias questões para alcançar mais exposição. Franquias que tornam obras ao seu redor um subproduto esquecível: um sintoma da indústria cinematográfica agravado pelo último par de décadas: Rua Cloverfield, 10 não foi o primeiro deles e com certeza não sera o último.

Comentários (11)

Vinicius de Moraes | segunda-feira, 11 de Abril de 2016 - 00:40

Serve como entretenimento. Longe de ser uma bomba ou um filme necessariamente ruim,peca em alguns pontos,como essa temática alien do final e outros pontos. Gostei muito de Goodman neste filme,achei bem competente em seu personagem,eclipsando os alienígenas. Aliás, não achei que nenhum dos atores foi mal. Não me arrependo de ver,foi divertido,ao menos

Bernardo D.I. Brum | sábado, 14 de Maio de 2016 - 02:16

Não é o caso... É o gênero para o qual eu mais dei nota alta...

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