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Críticas

Cineplayers

A obra-prima que é reconhecida hoje por iniciar o gênero noir. Um filme incrível.

9,0

O Falcão Maltês é um dos maiores clássicos da era preto-e-branco do cinema. É considerado o pioneiro dos filmes noir. Se você está boiando, aqui vai a definição da “Enciclopédia de Cinema Katz” para noir: “...foi um termo usado para descrever os filmes Hollywoodianos da década de 40 e começo da de 50, nos quais eram retratados o submundo escuro e sombrio do crime e da corrupção. Filmes cujos heróis, bem como os vilões, eram cínicos, desiludidos e, freqüentemente, solitários e inseguros, fortemente ligados ao passado e indiferentes quanto ao futuro. Em termos de estilo e técnica, o filme noir caracteristicamente abusa de cenas noturnas (internas e externas), com cenários que sugerem realismo e com uma iluminação que enfatiza as sombras e acentua o clima de fatalidade.”

Pois é, a descrição acima é, portanto, a descrição do que você encontra em O Falcão Maltês. Como pioneiro, ele inspirou dezenas, talvez centenas, de diretores, e continua os inspirando até hoje. Vejamos uma pequena lista de filmes noir considerados extremamente importantes:

Crepúsculo dos Deuses – Filme do inesquecível diretor Billy Wilder, feito em 1950;
Pacto de Sangue – Outro dirigido por Wilder, em 1944;
O Terceiro Homem – Dirigido por Carol Reed, tem Orson Welles no elenco. De 1949;
A Marca da Maldade – Este dirigido por Orson Welles, em 1958;
The Big Sleep – Dirigido por Howard Hawks, em 1946. Conta com Humphrey Bogart como protagonista;
A Sombra de uma Dúvida – Simpático filme de suspense do mestre do gênero, Hitchcock, feito em 1943.

Há ainda muitos filmes para citar, tão ou mais importantes ainda, porém a lista acima já dá um bom suporte para quem quiser mergulhar no mundo dos filmes noir. Hoje em dia, há bastante discórdia entre críticos e especialistas do cinema, em considerar novos filmes lançados com as mesmas técnicas descritas acima como sendo noir. Dois casos recentes são 'O Homem Que Não Estava Lá' e 'Los Angeles – Cidade Proibida'. Pela definição, já se excluiriam ambos filmes, pelo fator lógico da data, afinal são filmes realizados nos últimos anos. Porém, a temática e a técnica não devem nada aos filmes da lista. Sendo assim, para não entrar em discórdia, costuma-se atualmente dizer que filmes lançados com essas características não são noir, e sim são homenagens a filmes noir. No final, é tudo a mesma coisa.

Agora que você já está pelo menos um pouco inteirado sobre o estilo de O Falcão Maltês, e conhece a sua importância para o cinema, vamos falar do filme em si. É sobre um grupo de pessoas que farão de tudo para colocar as mãos em uma estátua de um pássaro coberta de ouro e cheia de jóias preciosas por dentro. Sam Spade, o personagem de Humphrey Bogart, é um detetive particular que é contratado por uma mulher misteriosa, que está envolvida com um homem misterioso. Contando sua história, Samuel logo percebe que a mulher está mentindo, e quando o seu parceiro é assassinado enquanto trabalhava para ela, descobre estar participando de uma complicada história envolvendo a busca pelo tal falcão, enquanto diferentes personagens cheios de segredos vão cruzando seu caminho. Afinal, onde está o falcão? Será que alguém já o possui e está tentando enganar aos outros? Por que a mulher foi ao escritório de Samuel contando mentiras? Há inúmeras outras perguntas que o roteiro vai jogando para você no decorrer dos mais de 100 minutos de filme, e todas elas terão sua resposta num dos finais mais interessantes (não necessariamente surpreendentes) de um filme de mistério policial já lançado.

Este filme é a terceira adaptação para o cinema de um romance de Dashiell Hammett. As duas versões anteriores são consideradas fracassos pelo fato de o roteiro estar muito distante do livro. Porém, aqui, o roteirista, que é também o diretor John Huston, fez um belíssimo trabalho, apresentando os personagens pouco a pouco, revelando seus segredos, enquanto cria outros mistérios, na medida certa. O filme lembra outro clássico, Chinatown, de Roman Polanski, lançado em 1974 e protagonizado por Jack Nicholson. Você acompanha todos os acontecimentos através das descobertas e surpresas do detevive Samuel (em Chinatown, a partir de um caso de adultério, o personagem de Nicholson, outro detetive, também começava a descobrir coisas muito mais importantes do que uma simples traição), e vive toda a tensão que ele vive, ao saber das traições, mentiras, enquanto tenta encontrar e juntar todas as peças de um enigma.

O Falcão Maltês possui um ótimo roteiro e também uma ótima direção, pois, apesar de a história se desenrolar lentamente (e com o tempo até repetidamente), o diretor John Huston consegue deixar seus personagens sempre interessantes, e você sabe que alguma coisa que mudará o rumo das investigações de Samuel está sempre para acontecer. Apenas as interpretações de todo o elenco são um tanto exageradas, mas não no sentido de “forçadas”. Você nota facilmente um toque de charlatanismo no rosto e expressões faciais de todos os atores. Não é um ponto negativo, chega até a ser engraçado. Talvez por antigamente, com a falta dos recursos técnicos que existem hoje em dia, os atores tinham que se esforçar muito mais com suas interpretações, o que poderia resultar em exageros eventuais. Vários filmes da época (anos 40) lembram essa charlatanice. É algo interessante de se ver...

Tem-se ainda que mencionar a excepcional trilha sonora, que faz com que o clima de suspense e mistério envolvendo a história e os personagens do filme fiquem ainda mais sedutor. Trilhas sonoras como estas são raras hoje em dia nos filmes do gênero. Em vez de apelar para sons agudos, ensurdecedores, a trilha é limpa, interessante, e você percebe que ela sempre está lá, ajudando a contar a história, mas sem exageros. Uma curiosidade é que o filme chegou ao Brasil inicialmente com o nome de Relíquia Macabra, mas após seu relançamento, decidiu-se sabiamente deixar a tradução literal.

Hoje em dia a trama do filme seria considerada bastante batida, mas mesmo assim, depois de mais de 60 anos, ainda chama a atenção com suas surpresas e reviravoltas. Não é à toa que o filme está tão perto do topo da lista de melhores filmes de todos os tempos divulgada pela AFI há alguns anos atrás. O Falcão Maltês é um filme altamente recomendável; é uma obra que, mesmo não sendo perfeita, entra no novo milênio ainda conseguindo influenciar diretores atuais. George Lucas, por exemplo, cita o filme na faixa de comentários de Star Wars Episódio 2 – O Ataque dos Clones. O filme tem moral.

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