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Críticas

Cineplayers

Bonito e emocionante, capaz de levar qualquer pessoa às lágrimas. Mas também tem seus problemas.

7,0

Filmes são realizados com os mais diferentes objetivos. Existem os produzidos unicamente para levar a plateia às risadas, outros criados para fazer o espectador refletir sobre o que assiste e também aqueles cujo grande objetivo é tocar o coração e gerar lágrimas do público. Neste último grupo, estão obras como Love Story e Laços de Ternura, verdadeiros sucessos que conquistaram plateias de todo o mundo e fizeram empresas de lenços lucrarem com suas vendas. Ano passado, o principal expoente dessa linha foi Marley & Eu, uma produção que fez chorar até marmanjos de coração duro. E a disputa do filme-lenço de 2009 já tem o seu campeão: Uma Prova de Amor, novo trabalho de Nick Cassavetes.

Baseado em um best-seller de Jodi Picoult, o filme conta a história de como uma família lida com o câncer terminal da filha adolescente. O inusitado da situação fica por conta de Anna, irmã da garota doente, que aciona um advogado com o objetivo de processar os pais para assumir direitos sobre seu corpo. Tudo porque Anna foi um bebê geneticamente planejado para servir como doadora à irmã, fato ao qual a garota não quer mais se submeter. Tem início, então, não somente uma batalha legal, mas uma disputa dentro da própria família, enquanto lidam com a proximidade da morte da menina com câncer.

Pela sinopse, percebe-se que o Uma Prova de Amor é um potencial gerador de lágrimas. A história envolvendo crianças à beira da morte, laços familiares em turbulência e as questões geradas a partir disso só poderiam resultar em um filme emocionante, capaz de tocar corações. E a obra de Cassavetes (diretor do ótimo Diário de uma Paixão) consegue isso, mesmo que algumas vezes tenha que apelar para recursos nada discretos. Uma Prova de Amor é, sem dúvida alguma, um filme que cumpre a sua proposta, sendo capaz de fazer a plateia sair do escuro do cinema com o rosto inchado e vermelho de tanto chorar.

Mas vamos com calma. O roteiro, escrito pelo próprio Cassavetes e por Jeremy Leven (de Don Juan de Marco), chama a atenção desde os primeiros minutos pela fórmula adotada: ao invés de contar com apenas um narrador, o filme aposta na múltipla narração, com cada personagem se apresentando e refletindo sobre como a doença de um parente influenciou suas próprias vidas. Não é um recurso novo (Martin Scorsese, por exemplo, fez isso em Os Bons Companheiros), mas é uma opção ousada e, acima de tudo, eficaz, que oferece uma maior compreensão em relação a cada personagem e a forma com a qual eles encaram a difícil situação.

Porém, se demonstra coragem nesse sentido, o roteiro se amedronta em questões essenciais. O filme trata de temas extremamente polêmicos e profundos, principalmente a geração de crianças com o único objetivo de servirem de doação. Chega a ser decepcionante, então, ver como a história evita discutir o tema, tratando a ação da pequena Anna mais como um fato inusitado do que como um ponto de partida para a reflexão. Por exemplo, o dilema moral, inevitável aos pais que se vêem diante de uma decisão dessa magnitude, é tratado em duas ou três linhas de diálogos, sem jamais receber a profundidade merecida. Afinal, é justo conceber uma criança com o único propósito de salvar outra?

Ao fugir dessa questão essencial à própria história, o filme se apequena. E, o que é pior, acaba criando uma imagem nada agradável do pai e, principalmente, da mãe (personagem de Cameron Diaz), como se os dois não se preocupassem com Anna. O sentimento real de Sara pela filha permanece um mistério durante todo o filme e é, sim, uma pergunta que deveria ser respondida. Mas a personagem é complexa, como se pode perceber com a constante recusa em desistir da filha: isso se dá sua tanto por não querer perdê-la quanto por não querer perder o sentido de sua própria vida, uma vez que a batalha se tornou sua única razão de ser.

É um pena, portanto, que um papel repleto de camadas tenha ficado nas mãos de uma atriz limitada como Cameron Diaz. Não que ela esteja mal, porém, também não é capaz de transmitir todos os sentimentos de Sara ou torná-la crível diante da difícil situação na qual se encontra. Fica claro que sua capacidade dramática está amarrada às comédias românticas. O mesmo vale para Jason Patric, outro ator de pouco alcance, que faz de Brian mais um boneco em tela do que uma pessoa real. Seu personagem, na verdade, é prejudicado por ser deixado de lado pelo roteiro, com apenas um momento no qual demonstra algo além do unidimensional. Já Joan Cusack e Alec Baldwin apresentam atuações eficazes, ainda que as motivações do advogado para pegar o caso jamais convençam.

A verdade é que o elenco infantil dá um verdadeiro baile no adulto. Abigail Breslin e a desconhecida Sofia Vassileva entregam um verdadeiro show de interpretação. Breslin já é conhecida do grande público (inclusive já concorreu ao Oscar por Pequena Miss Sunshine) e demonstra mais uma vez o seu talento e carisma no papel difícil de Anna. Mas é Vassileva quem realmente conquista o espectador. A atriz não somente demonstra coragem e entrega ao atuar careca durante quase todo o tempo, como também combina com perfeição toda a tristeza, doçura e melancolia da personagem. Seus sorrisos forçados, diante da inevitabilidade de seu destino (especialmente na cena com toda a família no hospital), são de cortar o coração.

Breslin e Vassileva ainda são as responsáveis por boa parte da emoção contida em Uma Prova de Amor, graças à relação entre as duas irmãs, verdadeiro núcleo da obra. A química entre as duas atrizes excede os limites da tela e o amor entre elas contagia o espectador. Na realidade, as cenas com Vassileva, seja com Breslin ou com Thomas Dekker, que interpreta o namorado Taylor, estão entre os melhores momentos da produção. O romance, aliás, talvez seja a parte mais bonita e tocante de todo o filme. É quando a narrativa realmente passa a falar fundo com o espectador e a emoção surge naturalmente – a minitrama com Kate e Taylor daria, certamente, um belíssimo filme por si só.

De certa forma, é a partir deste momento que Uma Prova de Amor realmente consegue contagiar o espectador. Até então, no subenredo envolvendo a questão judicial, a produção parecia ter dificuldades de estabelecer essa identificação com a plateia, uma vez que as reações e atitudes tomadas pelos personagens permaneciam um mistério. Há uma forte diferença de tom entre os momentos sobre o processo e as cenas passadas em família – os segundos são infinitamente mais fortes, o que leva à pergunta sobre se a história envolvendo a atitude de Anna é realmente necessária. Tudo bem que ela é o ponto de partida para a trama, mas, como o roteiro se acovarda ao gerar discussões e os momentos emocionantes são aqueles passados no núcleo familiar, fica a dúvida se o filme não poderia ter focado somente em como os Fitzgerald lidavam com o câncer da filha.

É aí, aliás, que Uma Prova de Amor atinge o seu objetivo: emocionar. Cassavetes pode apelar para alguns recursos discutíveis – como as constantes cenas em câmera lenta, nas quais o som diegético desaparece e a trilha sonora sobre com alguma música emocionante –, mas essa forma de manipulação somente funciona porque o espectador está imerso na história e nos personagens. Em um filme sem valor dramático ou narrativo, cenas como essas são apenas vergonhosas; em Uma Prova de Amor, elas são emocionantes. Além disso, elas não são exageradas a ponto de se tornar piegas, e Cassavetes cria alguns belíssimos momentos, cenas de pura emoção nas quais é difícil não se emocionar, como a sequência na praia ou a já citada relação entre Taylor e Kate.

Assim, Uma Prova de Amor consegue despertar sentimentos reais na plateia. É um filme com problemas narrativos, sim, e que poderia ter mais coragem e um pouco mais de sutileza na tentativa de emocionar. Mas, por outro lado, conta com uma história que é, ao mesmo tempo, bonita e triste, capaz de se conectar com o público de uma forma que poucos outros filmes conseguirão neste ano. Assim como Uma Prova de Amor passa a belíssima lição de aceitação da morte, o espectador também deve aceitar que Nick Cassavetes fez um filme com a intenção única de emocionar.

E nisso, as lágrimas dizem melhor que as palavras, ele é muito bem sucedido.

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