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Críticas

Cineplayers

A refilmagem fast-food de (quase) sempre.

2,0

Um fato incontestável no meio da Hollywood atual: existe uma carência enorme de ideias. Originalidade nunca foi um requisito obrigatório para que um filme se tornasse bom, mas há anos que a escassez de inspiração dos roteiristas da grande indústria tem sabotado diversas histórias e narrativas, onde tudo é mergulhado numa onda de incessantes clichês e obviedades. E apesar deste problema englobar o cinema como um todo, dois gêneros em especial se tornaram as principais vitimas: a comédia e o terror. Enquanto o primeiro gênero obriga muitos dos diretores e roteiristas a se apoiarem na repetição incessante de piadas e gags já vistas em milhares de filmes, o segundo já usa e abusa de diversos artifícios que tentam, de alguma forma, trazer o sentimento de medo ao espectador. E nos últimos anos, é possível contar nos dedos as produções que conseguiram obter sucesso na reunião de alguns dos costumeiros elementos do gênero e, ao mesmo tempo, trazer algum frescor (não estranhe se Invocação do Mal for o primeiro exemplo contemporâneo a surgir na sua cabeça).

Poltergeist: O Fenômeno é mais um destes “belos” exemplos de que a indústria precisa, urgentemente, se reinventar. Refilmagem do clássico do horror de Tobe Hooper lançado nos anos 80 (que está bem mais para uma ficção cientifica com sensíveis toques de humor negro), o projeto até criou certa expectativa quando anunciado, especialmente por ter o diretor Sam Raimi (de A Morte do Demônio e Arraste-me para o Inferno) como um dos produtores, mas ledo engano. Atualizando a já conhecida trama da família Bowen (Freeling, no original) para os dias atuais, com a presença constante da tecnologia como meio de fazer a narrativa andar, o que temos é mais uma típica obra onde, já nos primeiros cinco minutos de projeção, os diálogos, composições de cenas e trilha sonora já nos dão pistas fortes do que poderemos esperar ao longo da trama. Em resumo, reina uma previsibilidade gritante.

Existe, no entanto, um certo esforço do roteirista David Lindsay-Abaire (de Oz: Mágico e Poderoso) e do diretor Gil Kenan (A Casa Monstro) em abordar certos temas e fazer do filme uma experiência, no mínimo, visualmente atrativa. Lindsay-Abaire, por exemplo, pega a constante presença da tecnologia (TVs, celulares, tablets) como uma forma de falar sutilmente sobre a nossa própria relação com estes instrumentos, ao mesmo tempo em que a situação financeira do casal Bowen é uma ponte para construir alfinetadas em cima da onda de desempregos pós-queda da bolsa ou até mesmo do capitalismo. E Kenan, apesar de ainda pouco experiente no ramo, sabe como filmar certas cenas, trabalhando em cima de planos abertos e de movimentos de câmera que desafiam o olhar do espectador. Mas o fato é que tais esforços em trazer alguma força para a experiência acabam não passando disso: esforços.

Pois Poltergeist: O Fenômeno é, em suma, uma reciclagem do que há de mais redundante no gênero terror: fenômenos estranhos, objetos se movendo, portas batendo, sussurros sendo ouvidos, a casa intimidadora, o casal cético, as crianças com forte tendência a enxergar o sobrenatural, a adolescente mimada, palhaços, sons altos nos momentos de susto e, claro, um ou dois coadjuvantes que irão surgir lá pelas tantas para ajudar a salvar o dia. O original de Tobe Hooper carregava muitas destas características, é claro, mas o diretor soube como injetar uma boa dose de auto-ironia e transcrever a experiência para um outro nível. Já esta versão moderna, apesar dos vários momentos de humor voluntário (os involuntários também estão lá), peca ao levar-se à sério demais, acreditando que o necessário já reside no básico. Um erro mortal.

As inevitáveis comparações com o original apenas diminuem o efeito de um filme, por si só, já condenado ao limbo. Kenan tenta reproduzir algumas das cenas e elementos que fizeram a fama do filme de Hooper, mas numa velocidade digna de um fast-food. Enquanto que Hooper trabalha bastante com a sugestão e com o invisível aos olhos, Kenan exagera na crueza e na pressa em impactar o espectador, o que desconstrói qualquer nível de tensão que tais cenas poderiam render. E algo mais impressionante é que, mesmo com a evolução das técnicas visuais, os efeitos especiais gritantes e espalhados ao longo do filme apenas nos incomodam com o tom fake no qual mergulham as cenas de maior ação, o que até nos faz sentir saudades do CGI tosco do original de Hopper (que, convenhamos aqui, não envelheceu tão bem em termos técnicos).

Como bem ali em algum texto do filme pela internet afora, Poltergeist: O Fenômeno pode ser resumido como um dos típicos terror-espetáculo feitos para o público atual, que acredita que mais é sempre melhor. Não há mais valorização na subjetividade ou no trabalho com o imaginário do público. O que devemos ter agora é o explicito, o mastigado, o óbvio, aquilo que faz o chamado entretenimento passageiro. E a refilmagem de Poltergeist é isso: um produto mastigado e sem nenhum atrativo fora disso, recorrendo ao moralismo e ao óbvio. E assim, apenas vai restando os leves fiapos de esperança de que o gênero, de fato, se reerga novamente com o tempo.

Comentários (4)

Alexandre Koball | sábado, 06 de Junho de 2015 - 19:19

Parecia uma bomba mesmo desde sempre.

Luiz F. Vila Nova | segunda-feira, 08 de Junho de 2015 - 11:04

Já eu que sou muito fã do original, gostei deste aqui, que apesar das limitações, respeita o original e busca uma nova abordagem para a trama.

Alexandre Koball | terça-feira, 15 de Setembro de 2015 - 10:23

Vi finalmente, estragaram as duas cenas boas do original: árvore e palhaço. É tudo corrido e sem construção nenhuma. Pífio mesmo.

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