Um grupo de astronautas perdido em um planeta estranho após um pouso de emergência, sendo perseguidos por criaturas nativas de natureza desconhecida – a premissa clássica de muitas ficções-científicas, desde aquelas pioneiras dos anos 1950 como O Planeta Proibido (Forbidden Planet, 1956) até as mega produções Planeta dos Macacos (Planet of the Apes, 1968) e Alien, O Oitavo Passageiro (Alien, 1979). O interessante nessa sinopse reciclada ano após ano é a vida que ela ganha de acordo com o diretor que a tem em mãos. Mario Bava, mestre supremo do cinema de horror italiano, foi um cineasta que ofereceu um filme ímpar com base nesse enredo em O Planeta dos Vampiros (Terrore nello spazio, 1965), uma pérola lançada recentemente no Brasil pela distribuidora Versátil.
O Planeta dos Vampiros teve um orçamento paupérrimo, que foi compensado pela criatividade de Bava e sua capacidade de fazer muito com pouco. Muitos dizem que foi a influência direta para que Ridley Scott filmasse seu famoso Alien mais de dez anos depois, e hoje ocupa um lugar de pouco destaque na filmografia de seu realizador. Apesar de ser a única ficção-científica de Bava, O Planeta dos Vampiros se destaca principalmente por sua incursão no horror da situação vivida pelos personagens – uma tripulação perdida em um planeta habitado por parasitas invisíveis. Não sabendo com que tipo de vida estão lidando, os tripulantes a princípio são influenciados pelas criaturas a brigarem entre si, e a partir disso temos uma luta não apenas contra os perigos daquele planeta como também os perigos da própria natureza humana.
O aproveitamento de Bava com relação às estruturas da ficção-científica se baseia em uma remodelagem do gênero, adaptando-o ao seu universo particular de horror, por isso a não preocupação em parecer verossímil ou realista, e sim absurdo e assustador. O elemento de medo, particularmente o medo do desconhecido, é sua principal força propulsora. Dentro dessa relação do enfrentamento de algo que foge à compreensão humana se fundamentam muitos de outros filmes seus, como os clássicos Lisa e o Diabo (Lisa e il Diavolo, 1973) e Ciclo do Pavor (Operazione Paura, 1966). Esse desequilíbrio entre os lados que se enfrentam, de modo a colocar os protagonistas em desvantagem com relação aos alienígenas, torna toda a aventura ainda mais desafiadora e assustadora, e é uma forma muito inteligente de driblar o baixo orçamento ao apostar em um vilão que jamais aparece em sua forma verdadeira.
Tendo isso em mente, fica claro que O Planeta dos Vampiros não pode ser analisado unicamente como uma ficção-científica, mas principalmente como um filme de terror. E não é preciso muito para identificar a marca registrada de Bava mesmo em meio a cenários incomuns, como uma nave espacial ou uma gruta alienígena. Seu trabalho e cuidado artesanais com as cores, as formas e os movimentos é exatamente o mesmo encontrado em outros filmes, oferecendo momentos de grande beleza visual, como na sequência em que alguns tripulantes (entre eles a beldade da Norma Bengell) adentram em uma cíclica caverna iluminada por luzes vermelhas esverdeadas, ou quando se deparam com os esqueletos gigantes de origem desconhecida.
Há também um contraste no que diz respeito aos ambientes filmados por Bava. Enquanto o interior da nave é capturado por planos médios ou fechados, como que amplificando a sentimento de acuação dos personagens, os ambientes externos são filmados em planos abertos que reforçam a sensação de perdição e estabelecem o clima de caçada humana requerido pelo roteiro. Ao intercalar várias seqüencias dentro e fora da nave, a dinâmica cadenciada por Bava vai culminando em um rumo cada vez mais sufocante e desesperador, auxiliado por um hipnótico jogo de luzes.
Pouco antes do fim da projeção, o discurso até então implícito na história ganha voz ativa ao criticar as relações humanas e a forma como o ser humano se mostra, em situações de sobrevivência, o seu próprio e pior inimigo. Esses temas viriam a ser continuados e melhor discutidos por Ridley Scott em Alien e mais recentemente em Prometheus (idem, 2012), assim como em diversas outras ficções-científicas, e por isso O Planeta dos Vampiros se mostra mais valioso enquanto cinema de gênero no seu sentido mais puro e sincero, sendo capaz de absorver o espectador em seu universo absurdo e deliciosamente irreal durante as suas duas horas de duração.
Sou fanzão do Bava, mas desse não consigo gostar.
B pra cacete,como quase qualquer ficção desses anos e por isso é bom.
Os Ets como espectros de som e luz é o mais interessante.
Confesso não ser muito conhecedor do cinema de Bava, mas daquilo que já vi, noto nele um dos grandes cineastas de gênero das décadas passadas. Já vi várias recomendações para este filme, reforçadas neste belo texto. Vou procurar, sem dúvidas. Parabéns, Romero.
Engenhoso pelas condições precárias que teve, mas não é lá muito bom.