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Críticas

Cineplayers

Christian Petzold alcança novo patamar com belo drama sobre reconstrução humana e imagética.

9,5

Christian Petzold é definitivamente um cineasta querido na Alemanha natal. Sua fama já tinha vazado para outras partes do mundo, mas ele ainda era indiferente pra mim. Mesmo o belo trabalho anterior (Barbara), tão incensado, aplaudido e premiado, não tinha necessariamente me tocado, apesar de reconhecer suas qualidades. Essa impressão finalmente vem por terra com a estreia do novo Phoenix, que se ambienta num período do qual já estou de saco cheio há muito tempo (a Segunda Guerra Mundial), mas retrabalha um jogo de máscaras sociais e desconstrói perfis românticos de heróis do gênero, aqui alquebrados e de caráter duvidoso.

Petzold volta a contar com a colaboração habitual de Nina Hoss, a melhor atriz alemã da atualidade, um produto exportação que o próprio diretor transformou em estrela; e ela agradece a ele com eventuais shows de interpretação, como aqui. Seu rosto dúbio nunca foi tão bem  aproveitado, porque aqui ele é a matéria prima para o roteiro apresentado, e em torno dele giram os reflexos dos espelhos emocionais que perpassa toda a produção.

Nina vive uma sobrevivente de um campo de concentração que se desfigurou e, por conta disso, reconstruiu todo o resto, assim como a vida. De volta à própria casa, sua melhor amiga lhe informa que talvez seu marido (vivido pelo mesmo Ronald Zehrfeld que também já trabalhou com o diretor diversas vezes, inclusive em Barbara) tenha servido de relator durante sua prisão, e que talvez seja ele o responsável pela sua desgraça. Como ele não a reconhece e insiste para que ela se passe pela própria mulher (que ele insiste ter morrido), aos poucos ela tenta compreender o homem que talvez nunca tenha conhecido e remexer um passado duro demais.

O filme brinca com a imagética a todo tempo, da construção cinematográfica e também das personas que somos obrigados a vestir diariamente, transitando no jogo de espelhos e fazendo a brincadeira durar do início ao fim sem perda de fôlego. E é nesse jogo que o filme de Petzold sai da pura história contada para o "algo mais" que caracteriza os grandes momentos, transformando a angustiante trajetória da personagem em uma metáfora cinematográfica por excelência, com o duplo de Nelly sendo vivido por ela mesma.

Com cenas impactantes e cheias de poesia como o passeio de Nelly pelos escombros da cidade assim que volta pra casa, Petzold enfim me ganha e me coloca em expectativa para seu próximo longa. Todo o elenco, mesmo os cameos, parecem completamente integrados à narrativa e imersos naquela realidade, absorvendo toda a atmosfera assustada e melancólica geral. Com um desfecho enigmático e explosivo, Phoenix deixa no ar as respostas certas para um excepcional debate após sessão, mas de concreto fica a ideia de que as máscaras não duram pra sempre.

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