Polanski desaponta após receber o Oscar de Melhor Diretor por O Pianista: Twist é vazio e sem graça.
Ok! Roman Polanski ganhou, surpreendentemente, em 2004, um Oscar de Melhor Diretor, pela obra-prima O Pianista. Nada mais do que justo, afinal, a carreira do sujeito já era fenomenal, e ele conseguiu fazer um filme que superou todos os seus anteriores. Seu próximo filme, infelizmente, foi uma tentativa segura de refilmar, mais uma vez nos cinemas, uma velha história de Charles Dickens, tantas e tantas vezes já contada. Embora o filme possua características que demonstrem, ainda que de forma relâmpago, a capacidade de Polanski em criar cinema, num todo este é um filme altamente dispensável e, porque não dizer, aborrecido.
Muitos de seus adoradores defenderão as qualidades originais do texto de Dickens; outros ficarão do lado da produção de arte, que visivelmente se esforçou para trazer realismo ao enredo, talvez mais do que qualquer outra versão do filme o tenha feito anteriormente, aproveitando-se do fato do avanço tecnológico, é claro. Ora, eu sou um dos adoradores do diretor e não conseguiria utilizar esses nem quaisquer outros argumentos para defender o filme. Oliver Twist pode até ter algum valor artístico, mas é um filme bastante dispensável e sem graça. O que é um choque depois da perfeição que Polanski proporcionou em O Pianista.
Acredito que seu principal problema esteja no seu núcleo, ou seja, no roteiro. Além de já ser uma história bem conhecida, ele é incrivelmente previsível. Todos os passos dos personagens, sobretudo os do pequeno Twist, são adivinháveis tempos antes de eles ocorrerem. Isso dá ao filme uma sensação de constante aborrecimento, que o transforma em uma peça de cinema simplesmente monótona, o que contrasta demais com a filmografia de Polanski. O elenco é razoável, não há grandes estrelas com exceção talvez de Ben Kingsley, e o garoto que interpreta Oliver Twist é, no máximo, ordinário, o que também não ajuda a dar créditos ao filme.
Não há um grande personagem. Oliver não sabe fazer as coisas por si mesmo, e também fica complicado definir quem é o vilão do filme – provavelmente não há um vilão na história, embora haja um monte de pessoas se aproveitando do garoto o tempo todo. Também é complicado descobrir as motivações dos personagens de forma coesa, já que o filme não consegue se focar corretamente em explicar o comportamento da maioria de seus personagens, nem mesmo sabe explicar o que, afinal de contas, quer Oliver da vida, por ser ele um personagem tão irritantemente passivo às pessoas e aos acontecimentos ao seu redor.
Por outro lado, a parte técnica é evidentemente o ponto forte do filme – quando isso acontece, nunca é um bom sinal, pois a técnica nunca deveria se sobrepor ao conteúdo, no máximo igualá-lo. O filme possui um cuidado com recriações de época quase fascinante. Uma pena que a maior parte dele se passe à noite ou em cenários cheios de névoa. Quando a fotografia investe no contraste verde-campo com cinza-cidade, ela consegue provocar reações maravilhosas, mas isso acontece muito pouco, não conseguindo, dessa forma, inspirar poesia, mesmo que visivelmente se esforce um bocado tentando.
A pergunta que pode atiçar a curiosidade de qualquer cinéfilo: “Oliver Twist” tem a cara de Polanski? Absolutamente não! O filme possui traços quase imperceptíveis da filmografia do diretor, mas não é um Polanski legítimo. É bem mais comercial que sua média de filmes e, embora a direção não seja um ponto fraco para o filme, tampouco pode ser considerada metódica ou especialmente inspirada. Longe disso! Seus defensores mais fanáticos podem atirar pedras à vontade, mas ao analisar o filme de uma perspectiva puramente racional, Twist é um filme absolutamente dispensável, e sua avaliação baixa não é exatamente por ser necessariamente ruim (pois é), mas sim por ter sido feito por alguém que, em algumas partes de sua carreira, pode ser chamado de “gênio”, mas resolveu “dar um tempo” em seu último filme.
Tudo isso é uma pena. Está aí um filme que não pode ser recomendado.
"Oliver não sabe fazer as coisas por si mesmo, e também fica complicado definir quem é o vilão do filme – provavelmente não há um vilão na história, embora haja um monte de pessoas se aproveitando do garoto o tempo todo. Também é complicado descobrir as motivações dos personagens de forma coesa, já que o filme não consegue se focar corretamente em explicar o comportamento da maioria de seus personagens, nem mesmo sabe explicar o que, afinal de contas, quer Oliver da vida, por ser ele um personagem tão irritantemente passivo às pessoas e aos acontecimentos ao seu redor"
Engraçado exigir tanto de uma criança, a ponto de dizer que ela é muito passiva e não sabe o que ela quer da vida.
Se o filme explicasse muito a motivação dos personagens, tbm seria criticado pelo fato de subestimar a inteligência do público. Não é preciso explicar. E sim mostrar. E isso o filme cumpriu o papel. Ou será que tudo tem que ser tão certinho? Na vida é assim? Acontecem coisas que temos explicações pra tudo?