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Críticas

Cineplayers

Um épico sobre o amor passado na época das grandes navegações. Belíssimos visuais e romance interessante fazem deste filme uma jóia.

8,0

O Novo Mundo é um épico. Mas não sobre as grandes navegações ou descobertas na América, como o título pode erroneamente indicar. É um épico sobre o amor. Sobre como dois seres humanos de raças e vidas tão distintas podem se tornarem unha e carne, e como a separação pode ser dolorosa. Retrata a força de vontade, quase sobre-humana, para esquecer a quem se ama. Retrata o renascimento do amor em formas inesperadas. O filme, de fato, é poesia visual. Também não é um épico sobre grandes conquistas de um povo. Não deve ser julgado como tal. É mais simples, ao mesmo tempo em que também pode ser considerado infinitamente mais complexo, tanto quanto o amor pode ser.

O filme deve ser sentido, não assistido. As imagens fluem, às vezes como recortes desconexos, sem sentido. Alguns cortes parecem deslocados, gerando um efeito quase hipnotizante – e bom! Não são poucos os momentos em que entramos nos pensamentos mais profundos dos personagens que, através de uma apropriada narração em off (recurso geralmente utilizado de forma a cobrir roteiros preguiçosos, aqui servindo muito bem ao seu objetivo). As imagens da floresta, praticamente virgem, sendo explorada pela primeira vez pelos ingleses, propiciam um clima perfeito para o diretor explorar e brincar com sua câmera. E quando, no ato final, o filme vai para a Inglaterra, Malick surpreende com construções e recriação de época de tirar o fôlego – quase que literalmente.

O diretor Terrence Malick já havia demonstrado esse estilo de forte e cuidadoso tratamento visual com Além da Linha Vermelha, filme de guerra do qual tenho fortes ressalvas quanto à qualidade de seu conteúdo, mas que, indiscutivelmente, possui qualidades artísticas primorosas. A técnica de Malick conseguiu ser aperfeiçoada agora, sete anos depois, com a ajuda, obviamente, de uma rica produção de arte, ainda que o filme seja basicamente um trabalho de relativo baixo orçamento. Prova de que dinheiro não precisa jorrar para gerar beleza.

Mas não há só trabalho visual. Como já fora comentado, entramos muitas vezes na cabeça dos personagens. O amor improvável entre um capitão inglês e uma princesa índia da Virgínia, em meio ao atrito dos selvagens contra o povo do mundo do além-mar. Há um aprofundamento não visto recentemente no cinema comercial para esse tipo de situação. O que ocorre entre ambos os personagens (um Colin Farrell muito decente e Q'Orianka Kilcher, uma atriz novata lindíssima que tinha somente quinze anos na época das filmagens) é semeado, regado e cuidado. Não há um só momento em que esse improvável caso torna-se irrealista ou soa falso. Caso contrário, o filme seria irritante, já que ele é o ponto central do filme, uma epopéia imensa, que custará vidas e quebrará o coração de ambos.

Há aqui e acolá um ou outro desvio, que quebram a seqüência quase hipnotizante de imagens e sons da floresta, que poderiam ter ficado de fora da montagem final. São acontecimentos irrelevantes para a trama central, que servem para aprofundar o mundo e também apresentar alguns personagens menos importantes, o que nesse caso seria dispensável. Tramas quase paralelas, como as discussões internas no forte inglês e a sub-trama envolvendo o pai da princesa – que é simplesmente desinteressante – são exemplos desses acontecimentos. Felizmente, o ato final abandona esses momentos e foca-se em incrementar ainda mais o cuidado estético e os personagens centrais. A entrada de John Ralfe na trama (Christian Bale como coadjuvante de luxo, que parece deslocado no início), formando uma espécie de triângulo amoroso, foi uma opção arriscada por parte do roteiro (escrito pelo próprio Malick), mas que ao final mostrou-se de extrema valia, pelos momentos lindíssimos que seus atos propiciaram no bonito clímax.

O Novo Mundo chegou ao mercado como filme pequeno e passou voando pelos cinemas. Mas deve ser apreciado com carinho agora que está disponível em qualquer lugar. Uma obra que sempre terá um lugar especial em qualquer acervo, uma espécie de novo O Último dos Moicanos, filme dirigido por Michael Mann no início dos anos 1990. É um trabalho que merece ser apreciado, por ser algo raro nos dias atuais: unir arte e entretenimento, com um elenco de estrelas, de forma tão pura. Tem suas falhas, é verdade, mas essas são apenas arranhões em uma paisagem muito maior. Afinal, nada na vida é perfeito, incluindo o amor de um capitão inglês e de uma princesa índia, há alguns séculos atrás, na América do Norte.

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