5,0
O Monstro do Armário chamou atenção mundial porque logo em seu debut em longa-metragem o até então curta-metragista e produtor de conteúdo para web Stephen Dunn ganhou o Prêmio de Melhor Filme Canadense no Festival Internacional de Toronto, trazendo como protagonista o ator Connor Jessup, destacado nas séries Falling Skies e American Crime.
Fundindo um drama de autodescoberta com uma abordagem algo fantástica, o filme conta a história de Oscar, um garoto com uma infância conturbada pelo divórcio de seus pais e a testemunho ocular de um crime de ódio homofóbico. Quando torna-se um jovem adulto, vive uma espécie de vida dupla em todas as esferas: mora cada semana com um de seus pais, trabalha em uma loja e tenta entrar para uma Faculdade de Maquiagem em Nova York preparando um portfólio impressionante de efeitos visuais, não desgruda da amiga Gemma, com quem vive entre afeto, discussão e sonhos, e desenvolve uma atração angustiante pelo seu colega de trabalho Wilder.
A homofobia é um tema latente para a obra, com a relação conturbada de amor e ódio que Oscar tem com o pai que não consegue deixar o passado para trás constantemente censurando, repreendendo e discriminando o filho, arrumando confusão em seu trabalho, inventando compromissos e ao mesmo tempo que produz peças manuais e procura se tornar mais íntimo de Oscar. Isso leva Oscar a ser essa pessoa dupla, tanto um jovem talentoso e cheio de potencial quanto um indivíduo confuso, raivoso e autodestrutivo.
O toque fantástico se dá pelas alucinações que tem do dia em que viu o crime de ódio - o espancamento de um jovem homossexual - cada vez que sente desejo por alguém do mesmo sexo e pela sua hamster Buffy, sua “espírito animal”, que conversa com ele e serve como porta de entrada à personalidade introspectiva do protagonista e seu interior perturbado e sempre a ponto de explodir.
Com esse paralelismo estabelecido, Dunn entrega o esperado para nossa época e seus vícios do cinema independente: pontos de vista inusitados e montagem clipada são a cama para elementos como música incidental bastante convencional, personagens além do protagonista frequentemente superficiais e sem grandes complexidades: Wilder é rebelde porém sempre empático com Oscar e seus problemas; a mãe é quase sempre atenciosa com as questões do filho; o pai é sempre um controlador explosivo e violento. Como protagonista, Oscar é o único que recebe um pouco mais de complexidade a ser explorada pelo roteiro.
É compreensível a escolha de um filme assim para a premiação; O Monstro do Armário é um jogo ganho. Os problemas mencionados acima são em parte resultado de um grande conformismo de linguagem: é um filme clichê, para dizer o mínimo. Tudo o que se espera para ser discutido sobre o tema é abordado com extrema pathos: atores chorando e/ou gritando, música lacrimejante ao fundo, metáforas visuais bastante óbvia e pontualmente didática até o limite. Pathos essa, deve-se dizer, bastante acrítica, baseado mais na defesa do protagonista contra as ações do mundo exterior que lhe fere e sua forma confusa e errática de devolver a mescla de abandono com censura. Não há a mínima distância entre o criador da obra e o personagem: ele nasce na tela para ser um herói trágico e todo dispositivo que possa ser utilizado para convencer quem assiste de tal será utilizado.
Enquanto avança para seu final, o filme em sua salada indigesta de drama rasgado, humor deslocado através de comentários sarcásticos e um toque de absurdismo tem um tom algo incerto que só tende a se avolumar. A certo ponto há até mesmo a montagem-sumário resumindo todos os pontos dramáticos importantes (o que, em sua seleção, nos guia para o ponto desejado pelo diretor e não pela jornada emocional que cada um possa ter com o filme) e até um clímax servido de câmera lenta dilatando o tempo de um movimento e aumentando a tensão dramática calculada para aquele momento.
Definitivamente, O Monstro do Armário fica como um filme no meio do caminho: a homofobia externa e internalizada é um tema importantíssimo e necessário para ser discutido, e é aí onde o filme tropeça: deveria ser discutido e não encerrado com diálogos explicativos, psicologismo e a mais básica jornada heróica para se falar sobre um problema. Nesse interim, o filme fica muito mais aparentado com os dramas indies sobre superação vistos todo ano, pouco fazendo para se descolar desse padrão formulaico e que não acrescenta nada, não problematiza, não desconstrói. Ser bem executado e nada mais é o grande problema do filme; não parece haver qualquer ambição além das projetadas, nem terreno para ousar; e o que resulta disso tudo é uma história bastante esquecível.
Visto no Festival do Rio 2016
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