O mais recente filme de Steven Soderbergh não era dos mais aguardados em Cannes. Talvez por isso tenha surpreendido as baixas expectativas. Behind the candelabra (2013) tem um recorte bem definido: a relação amorosa de duas pessoas – seu início, seu auge, sua decadência e seu fim. O que eleva a história da possível banalidade é a dimensão biográfica: os personagens são baseados no showman Liberace e seu namorado Scott.
Para quem não conhece a excêntrica a figura de Liberace, ele era um virtuoso pianista americano que ganhou fama em programas de entretenimento televisivos, chegando ao posto de artista melhor pago entre 1950 e 1970. Ele foi adotando um estilo cada vez mais extravagante, no palco e na intimidade. Um estilo inegavelmente gay. No entanto, sua homossexualidade era insistentemente negada para preservar a relação com a mídia e com os fãs – em sua maioria, mulheres maduras e de idade.
A narrativa é cronológica, inclusive ritmada por cartelas que indicam a passagem dos anos. A primeira cena existe para fazer entender os acontecimentos que levaram Scott a conhecer Liberace. A última simboliza a despedida final. Assim como seu personagem, que dedicou a vida a entreter as pessoas, o filme exita enquanto obra de entretenimento. É engraçado, traz atuações memoráveis de Michael Douglas e Matt Damon, e em momento nenhum se perde. O nível é constante, mantem-se regular mesmo durante a crise. Se Scott reclama de se sentir claustrofóbico na casa que divide com Liberace, esse sentimento não perpassa a tela. O excesso não sufoca, o peso não nos atinge, talvez porque o humor bem acertado insufle leveza na história.
Em francês, o nome muda radicalmente para Ma vie avec Liberace (Minha vida com Liberace). Título um quanto mais sincero. Primeiro porque assume o ponto de vista narrativo de Scott. Segundo porque delimita de forma mais consciente o escopo do filme. O nome “Behind the candelabra” parece trazer consigo a pretensão de revelações de um “Por trás da fama”. Afinal, o que há por trás do candelabro, que Liberace orgulhosamente postava em cima de seu piano? A homossexualidade escondida? Os detalhes de uma relação amorosa?
Enquanto o trabalho de arte, figurino e maquiagem recriam um universo espetacular à altura dos personagens, a estética kitsch do excesso e do brilho não são absorvidas pela linguagem do filme – na contramão de filmes como o brasileiro Doce Amianto (2013), que em todos os níveis se deixa impregnar esteticamente pela extravagância de seus personagens. Se o diretor de arte Howard Cummings elegeu as superfícies reflexivas, espelhadas, como metáfora da vida de Liberace, Soderbergh parece não ter se debruçado conceitualmente sobre sua história, realizando um bom filme, mas incoerentemente contido e tradicional.
Ok, agora veja Terapia de Risco.
Verei sim, a discussão me estimulou. E dependendo do que aparecer, farei um texto.
Mas piloto automático... Bem, como ele sempre comanda a mise-en-scene da sua forma peculiar (aquilo que tira Haywire, por exemplo, da superfície do exercício de gênero), também não se encaixa. Embora às vezes ele trabalhe no piloto automático mesmo.
Mas quando a mise-en-scène não contribui com a narrativa, o que podemos fazer? Mas enfim, vou sair da net que está muito tarde para debater essas coisas, haha.