Os três filmes da trilogia Bourne, estrelados por Matt Damon no papel do agente desmemoriado caçado por seus antigos superiores, foram, provavelmente, as produções que mais influência tiveram no recente cinema comercial norte-americano – especialmente no gênero ação. Sua abordagem realista e o estilo quase documental de Doug Liman e Paul Greengrass (no qual prevalecia o uso de câmera em constante movimento) foram copiados diversas vezes nos últimos anos, inclusive na reinvenção da franquia James Bond. Mais importante do que isso – ao menos aos olhos dos estúdios –, a trilogia arrecadou quase 1 bilhão de dólares em todo o mundo. Assim, quando Damon e Greengrass se recusaram a retornar à história de Bourne, a Universal se viu com um grande problema: como dar continuidade à série sem seus principais nomes?
A solução, felizmente, não foi colocar outro ator para interpretar o personagem – afinal, Bourne é Damon da mesma forma que Indiana Jones é Harrison Ford –, mas criar outro protagonista para aquele mesmo universo, outro agente originado nos programas secretos do governo norte-americano. É uma ideia, digamos, aceitável, mas jamais necessária. Em outras palavras, este O Legado Bourne (The Bourne Legacy, 2012) não existe porque havia mais história a ser contada, mas sim pelo fato de que o estúdio queria sugar ao máximo os milhões que Bourne ainda poderia render e precisou inventar uma desculpa para estampar o nome do agente mais uma vez em um cartaz. E esta, convenhamos, nunca é a razão ideal para uma continuação.
Assim, o Legado Bourne é um filme repleto de problemas, ainda que não totalmente ruim. Sim, o roteirista e diretor Tony Gilroy (também responsável pelo texto das produções anteriores) tenta de todas as formas amarrar a nova trama com a história da trilogia, o que resulta em uma narrativa muitas vezes desesperada e artificial, e Jeremy Renner não carrega uma superprodução com a mesma naturalidade de Matt Damon, mas a obra consegue funcionar como um eficiente filme de ação. Gilroy mantém o estilo de Liman e Greengrass, com a câmera sempre em movimento com o objetivo de realçar a tensão, porém – talvez compreendendo como o recurso vem cansando nos últimos anos – faz isso com mais economia e de forma menos epiléptica.
Da mesma forma, o cineasta se mostra eficiente na condução das cenas de ação. Exceto por um ou outro momento no qual a mise-en-scène se torna confusa e é impossível entender o que está acontecendo, O Legado Bourne traz alguns bons momentos que prendem a atenção da plateia, como a longa perseguição em Manila. No entanto, ainda que eficazes, estas cenas jamais se destacam em relação ao que foi visto recentemente últimos anos – falta ao filme mais momentos inspirados como o excelente plano que acompanha o protagonista Aaron Cross escalando uma casa e entrando por uma janela para eliminar um inimigo. O Legado Bourne é aquele tipo de produção que chega às dezenas nos cinemas: entretém razoavelmente enquanto se assiste, mas esquecível logo após a sessão.
Isso ocorre, principalmente, pela inconsistência da trama. As constantes referências aos filmes anteriores podem confundir quem não lembra dos detalhes ou nunca assistiu a trilogia original, mas o grande problema é que não há história para contar. É, basicamente, um novo agente sendo perseguido pelo governo, mas, se em A Identidade Bourne (The Bourne Identity, 2002), a busca do protagonista pela identidade servia como força motriz para a narrativa, aqui isso não existe. Ou melhor, existe, mas não faz muito sentido. Gilroy transforma como ponto principal de sua trama a ideia de que os agentes são quase super-homens modificados geneticamente e precisam de pílulas para continuar assim, fazendo essa a motivação principal de Cross. O roteiro não o transforma em uma pessoa tridimensional como Jason Bourne, mas simplesmente em um homem que faz de tudo para continuar forte e inteligente.
Aliás, a prova de que este parece ser o equivocado foco da história de Gilroy é comprovado ao final da produção (SPOILER). O Legado Bourne encerra pouco após Aaron Cross se tornar independente dos remédios, sem jamais buscar qualquer espécie de conclusão para a trama de sua perseguição pelo governo. A conclusão poderia muito bem se passar no meio do filme, uma vez que ele apenas está fugindo novamente e os responsáveis pelas operações seguirão no seu encalço. (FIM DO SPOILER) Como se não bastasse, Gilroy parece não entender o que tornou a trilogia original tão fascinante: a inteligência do protagonista. Era sempre um prazer acompanhar o rápido raciocínio de Jason Bourne, fundamental para se manter um passo à frente de seus perseguidores. Aqui, são poucos os instantes em que Aaron Cross demonstra essa inteligência superior, tornando-se um herói mais genérico e, consequentemente, menos interessante.
Desperdiçando ainda um ator do talento de Edward Norton em um papel unidimensional e trazendo a personagem de Pamela Landy apenas no fim para uma participação totalmente desnecessária, O Legado Bourne nada mais é do que uma desculpa para encher os cofres do estúdio. Não há qualquer motivação artística para o filme existir, nem em termos de história, nem de personagens. Ocasionalmente eficiente, sim, mas acima de tudo dispensável.
Pena
Superar a Trilogia é tarefa quase impossível, isso todos nós sabemos. Logo, não causa espanto esse ser apenas, quando muito, razoável.
Ridículo!!!!!!!!!!!!!!
Este filme não traz nada de novo, em relação às habilidades dos soldados inseridos no sistema. Com um arranjado simples motivo de "precisar acabar com o programa", vemos um esforçado Rener fazer coisas que já vimos com Damon fazer com mais competência. Talvez, se se desvinculasse da franquia, poderia ser um filme de ação (mais um) destacável.