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Críticas

Cineplayers

Um típico Nick Hornby.

5,5
O britânico Nick Hornby, filho de pais divorciados e apaixonado por futebol, literatura e música, possui um estilo inconfundível para quem já leu um livro seu ou uma adaptação literária: os personagens obsessivos e disfuncionais, carentes de afeto e investigando a realidade a partir de seus repertórios de referências culturais. O filme Alta Fidelidade, adaptação de seu primeiro romance, talvez seja o exemplo mais conhecido, atraindo uma duradoura aura de culto através dos anos.

Juliet, Nua e Crua, adaptação do seu penúltimo livro homônimo de 2009, repete toda a tradição “hornbyniana” sem muita variação: trata-se da história de Annie (Rose Byrne), cujo marido Duncan (Chris O’ Dowd) é obsessivo há anos pelo músico Tucker Crowe (Ethan Hawke), cantor de rock alternativo que lançou apenas o álbum Juliet e então sumiu. A paixão de Duncan é tão desmedida que o mesmo frequenta um fórum onde discute com os amigos a importância, o legado e o paradeiro de seu ídolo.

Tudo começa a mudar quando Duncan está fora de casa: Annie recebe o disco “Juliet Naked”, uma versão crua e sem a produção final que consagrou o disco fictício. O fato de Annie ouvir o disco quando Duncan está fora de casa e não gostar do disco, desperta uma crise: o marido, professor de uma faculdade onde analisa séries de televisão (como não poderia deixar de ser; é uma história de Nick Hornby, não?), passa a ter um caso com a colega Carrie (Megan Dodds) ao mesmo tempo que Annie posta uma crítica negativa no fórum e passa a se corresponder, justamente, com o lendário Tucker Crowe.

Os anos não fizeram bem ao músico, que ganha algum dinheiro com os royalties das vendas, coleciona filhos de relacionamentos fracassados com quem mal mantém contato e atualmente mora nos fundos da casa da ex-esposa. A correspondência com Annie abre uma nova possibilidade em sua vida. Da atração inicial surge a inevitável vontade de se ver pessoalmente e experimentar uma nova série de complicações quando Annie, que trabalha na Prefeitura em um trabalho que odeia, experimenta se relacionar com alguém que lhe dá a atenção que quer, incentiva a experimentar coisas novas e, de tiracolo, traz o pequeno filho Jackson, que desperta seus instintos maternais de novo – já que Duncan nunca quis ter filhos.

Dirigido por Jesse Peretz (O Idiota do Meu Irmão), ex-baixista da banda de rock alternativo The Lemonheads, o filme é nada mais que um Alta Fidelidade ou Um Grande Garoto protagonizado por uma mulher procurando por novos rumos na vida ao invés de um homem perdido e desesperado. O que acaba sendo a melhor coisa em um filme comum e preguiçoso em sua fidelidade ao estilo inabalável e confortável do autor. Agora, finalmente temos uma protagonista que move a trama ao invés de reagir à trama. Mas para por aí.  

Típico filme do que convencionou a se chamar “indie”, Juliet, Nua e Crua tira grande parte da sua força da mescla de comédia verbal com um drama leve sobre a passagem para a vida adulta, mas isso para por aí. No caso clássico de “viu um, viu tudo”, o filme tem os típicos diálogos sobre discos, os desencontros da vida amorosa e situações constrangedoras que, ainda que não propriamente ruim, claramente denotam uma saturação estilística.

Para complementar, Peretz não faz questão de inventar muito, sem muita preocupação com a encenação, na mais básica das gramáticas das conversas em planos e contraplanos. É seguro, é familiar e, sobretudo, é a mesma coisa. Talvez um pouco grande demais, já que muitos personagens que antes pareciam interessantes (como Duncan ou alguns dos filhos de Jesse) se tornam personagens um tanto esvaziados, recursos cômicos e/ou obstáculos para as vidas bagunçadas dos protagonistas. Um certo poder de síntese faz falta aqui, se esticando além do necessário em tramas que no final não importam muito. O clímax suspenso e quase aberto do epílogo talvez seja o momento mais corajoso de um filme absolutamente comum.

Mas é certo que quem aprendeu a rir, chorar e se identificar com os patetas apaixonantes de Nick Hornby irá se atrair com o seu estilo todo próprio mas nem tão inimitável assim, já que Juliet, Nua e Crua é tão conformado que, aproveitando o tema musical, chega a soar como “autokaraokê”, cópia barata do próprio estilo que consagrou. A acomodação e repetição infinita pode até manter o interesse vivo – mas até quando?

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