Saltar para o conteúdo

Juízo, O

(O Juízo, 2017)
4,9
Média
4 votos
?
Sua nota

Críticas

Cineplayers

O terror da indiferença

3,0

Outrora um diretor promissor, há 20 anos, Andrucha Waddington embarcou já há muito numa espécie de piloto automático narrativo. Abandonou o cinema como fonte de experimentação formal que propôs com longas como Gêmeas ou Casa de Areia e foi para a TV comandar sua adaptação de Sob Pressão, que ele desenvolve como realizador muito melhor na tela pequena do que na grande. Só que esse novo O Juízo não necessariamente se adequa a esse lugar estacionado, mas talvez esteja numa situação ainda mais ingrata. Qual seria o motivo para conferir o novo longa de Andrucha?

Com um roteiro de Fernanda Torres mexido durante anos (já foi intitulado "As Bruxas"; inclusive, filme visto, sinto que pouco ou nada sobrou do primeiro tratamento), me admira observar que a bela escritora que Fernanda é inexiste no filme visto. Com o belo roteiro de Redentor dirigido pelo irmão Cláudio já demonstrada sua capacidade igualmente demonstrada também em livros e crônicas o material mostrado aqui não apenas é preguiçoso, como também redundante. Não se trata do caso de uma produção repleta de clichês que em nada nos surpreende, pois O Juízo nem chega a seduzir. 

Não faltam atrativos ao projeto. Além de Andrucha ser originalmente um belo diretor e até conseguir compor (poucos) bons planos como o de Carol Castro deitada sob a árvore, e dos inúmeros predicados de sua roteirista, a fotografia foi entregue a Azul Serra, que não vai muito além da escuridão extrema com uma nesga de luz fantasmagórica, uma textura suja em todos os setores narrativos (passado e presente, vivos e mortos, indiscriminadamente), não encaixando mesmo os chavões imagéticos a contento; a imagem de Carol Castro de braços cruzadas e esfregando-os é o típico frame que todos os filmes que lidaram com o fantástico de alguma forma utilizaram.

Um elenco encabeçado por um belo ator (ainda que subestimado) como Felipe Camargo, com participações pequenas porém como sempre incríveis como as de Lima Duarte e Fernanda Montenegro, com um Fernando Eiras discreto como o personagem pedia, ainda assim o longa-metragem não consegue fazer jus a nenhum desses atores, nem capitanear suas presenças a um rol de interesses. Não ajuda o fato de dois personagens grandes serem interpretados por artistas "verdes", como são os casos de Criolo e Joaquim Torres Waddington. O segundo nem chega a comprometer, só não imprime nada; o cantor, no entanto, já tendo interpretado algumas outras vezes, não está à vontade aqui e isso é perceptível.

A trama base do filme mistura referências de vários clichês do gênero terror: a casa assombrada, o personagem que enlouquece quando em contato com forças antagônicas, os típicos fantasmas, passando por situações ligadas ao espiritismo. Em determinado momento a câmera focaliza a luz e se prenuncia um eclipse que não faz qualquer sentido, nem tem um prosseguimento além desse plano. O filme cai nessa armadilha outras vezes, apontando para saídas falsas que nem representam jogo do gênero, mas apenas esquecendo as situações pelo caminho.

A sensação ao final de O Juízo é de incompreensão generalizada. Ainda que sua trama atraia, seu elenco seduza, sua atmosfera oprima, sua direção encante, ao olhar crítico trata-se de um material limitado, principalmente desnecessário, e que não consegue realizar satisfatoriamente as suas pretensões, mesmo as mais simples e relacionadas ao gênero. Sem assustar, sem incomodar, sem injetar um mínimo de força vital ao projeto, resta ao espectador a indiferença.

Comentários (0)

Faça login para comentar.