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Críticas

Cineplayers

Esta refilmagem é medíocre comparado ao filme original. Nem a dupla de bons atores principais salva.

4,0

Trama Diabólica (às vezes chamado de Jogo Mortal) é um suspense de 1972 que não apenas está em minha lista de melhores filmes de todos os tempos, como na de muitos cinéfilos que amam bons filmes baseados em atuações e diálogos. Naquela oportunidade, Michael Caine e Laurence Olivier traçaram, durante mais de duas horas, um duelo psicológico lotado de tensão e situações inteligentes, que terminaria em um clímax primoroso. O tempo todo, somente dois atores na frente das câmeras, desferindo diálogos cruéis e inteligentes um contra o outro, em um desafio de egos e de arrogância. Então, 35 anos depois, eis que surge o ator e diretor Kenneth Branagh para nos apresentar a uma versão século XXI daquele longa-metragem.

Vou tentar entrar apenas um pouco no mérito da refilmagem (mas vai ser difícil), destacando que repudio essa prática, pois ela, em raríssimas exceções, vem para adicionar alguma coisa à obra original. Mas o filme de Branagh é um trabalho tão, mas tão inferior ao filme de Joseph L. Mankiewicz, que nem mesmo a presença de Michael Caine no elenco (desta vez fazendo o papel de seu antagonista no filme de 72) salva esta nova versão da mediocridade, tanto como refilmagem ou como um trabalho independente de comparações. Não é à toa que foi um fracasso absoluto nas bilheterias, e desembarcou no Brasil diretamente nas locadoras – e em poucas delas, pelo que pude notar até aqui.

Conhecendo o fato de que a duração do filme tem apenas 86 minutos, contando os créditos, fica óbvio o primeiro grande problema do filme: a falta de desenvolvimento da relação entre o milionário Andrew (Caine) e Milo (Jude Law). Sem contar com os diálogos inspirados do filme original, Sleuth – a refilmagem – passa uma sensação de urgência em surpreender o espectador, transitando de um ato ao próximo sem impacto algum. Talvez o roteirista Harold Pinter já antecipara que boa parte do público da refilmagem já teria visto o original (o que eu particularmente duvido, pois Trama Diabólica é uma pérola quase escondida do grande público) e resolveu não inventar demais. A verdade é que as surpresas são pífias, quase funcionando como tentativas cômicas de buscar reação de espanto em seu público. Claro que esta é a opinião de quem está “contaminado” pelo conhecimento da trama do filme original, e é impossível para mim, portanto, avaliar se pelo menos a passagem do segundo para o terceiro ato (quem viu o filme deveria saber do que estou falando) foi ou não surpreendente. No filme original, essa passagem me deixou embasbacado.

Há algumas diferenças estruturais na história, mas basicamente é o mesmo filme com um cenário moderno. Falando nisso, o cenário é muito minimalista – uma casa moderna mas quase limpa por dentro, como se fosse um palco de teatro (vale lembrar que a origem inicial do filme é uma peça teatral de Anthony Shaffer). Cheia de dispositivos de segurança e outros eletrônicos, nota-se a necessidade de distanciar esse filme, visualmente, do original. Acontece que os apetrechos mecânicos e hoje antiquados do filme (incluindo os bonecos) de 1972 são incontáveis vezes mais charmosos e têm um lado sombrio, assustador, que nenhum circuito fechado de televisão poderia sonhar em ter.

Os dois personagens do filme são desenvolvidos como um típico filme de Hollywood: praticamente nada! Se no original Olivier nos era apresentado como uma figura encantadora (mesmo que arrogante), cheia de maneirismos e prazeres caros e estranhos para os homens comuns, que adorava jogos – e você realmente podia sentir isso – o personagem de Caine, nesta refilmagem, é apenas um velho escritor com problemas pessoais e um senso de humor duvidoso. Pelo menos o roteiro manteve a sensação de dúvida no espectador: lá pelas tantas é impossível saber se o que os personagens estão falando é real ou se faz parte de um novo jogo entre ambos. Essa é uma sensação muito positiva no caso de um suspense psicológico, pena que aqui o filme termine mal resolvido ao extremo, e o ato final afunde-se em uma desnecessária sequência envolvendo certas tendências sexuais de um dos personagens, ao invés de investir em um novo jogo – um desempate entre ambos que nos daria um clímax coerente com a proposta do filme.

Um Jogo de Vida ou Morte é um filme totalmente mal resolvido, apressado e visualmente feio, uma sombra apagada perto do original de 1972. E nem adianta tentar elogiar um possível “embate” de atores (no caso, Caine e Jude Law), pois o roteiro é tão superficial que dá pouca margem para qualquer um deles ter alguma cena realmente boa e passível de merecer comentários honrosos. Até a maquiagem, crucial para o segundo ato do filme, acaba estragando o pouco que a obra tem a oferecer, por ser óbvia demais (novamente, quem já viu o filme deveria saber do que estou falando). A direção feia de Branagh, cheia de planos óbvios e repetitivos, aliada ao cenário simplista demais, coroa um trabalho que poderia muito bem não ter sido produzido.

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