Dirigido com eficiência por Kevin Macdonald, 'Intrigas de Estado' é um entretenimento adulto e inteligente.
Em uma época em que novamente se espalham por todo o país (e pelo mundo) filmes covardes como Anjos e Demônios, adulterados como O Exterminador do Futuro: A Salvação e desrespeitosos como Transformers: A Vingança dos Derrotados, eis que surge, sem grandes alardes, escondido entre os blockbusters e em pouquíssimas salas de exibição, um alívio para aqueles que ainda acreditam que o cinema pode ser encarado como um entretenimento adulto e inteligente: trata-se deste interessante Intrigas de Estado, dirigido com eficiência por Kevin Macdonald - que estreou na ficção em 2006, com O Último Rei da Escócia.
Baseado na minissérie de Paul Abbott, exibida pela BBC inglesa em 2003, o filme gira em torno do repórter investigativo Cal McCaffrey (vivido por Russell Crowe), que tem oito horas para apurar uma história um tanto cabeluda que envolve o congressista Stephen Collins (Ben Affleck), assassinatos (sendo a amante de Collins uma das vítimas) e uma possível conspiração envolvendo a PointCorp - corporação titã que fornece serviços para as guerras no Afeganistão e no Iraque.
Partindo daí, Intrigas de Estado desenvolve-se em uma trama muito bem amarrada e cheia de conflitos e diálogos inteligentes, que estimulam a atenção do espectador a todo o momento. Assinado por Tony Gilroy, Billy Ray e Matthew Michael Carnahan, o roteiro retrata as artimanhas corporativas, a incendiária vida sexual de políticos e, principalmente, a importância da mídia impressa (sintetizada no belo desfecho do longa) e do verdadeiro repórter - profissional capaz de arriscar muita coisa para conseguir uma apurada reportagem, como é o caso aqui de McCaffrey.
A fim de que esse emaranhado narrativo funcionasse direito, Macdonald caprichou no trato de seu elenco, encabeçado pelo excelente (e pançudo) Russell Crowe. Auxiliado pela montagem de Justine Wright, que felizmente corta momentos edificantes dispensáveis (como os closes faciais que, ao fim de cada embate entre personagens, costumam permanecer duradouramente estáticos, com pouco ou nenhum significado), o diretor dá o suporte necessário para os atores, de forma coerente, trabalharem seus papéis. Afora Crowe, Rachel McAdams (lindíssima), Helen Mirren e Robin Wright Penn estão muito bem, assim como os coadjuvantes de luxo Jeff Daniels, Jason Bateman e Viola Davis. Diferentemente, Ben Affleck está péssimo mais uma vez: inexpressivo ao cubo, ele é constantemente engolido pelos atores com quem contracena. Às vezes, funciona, como em sua derradeira cena, na qual Crowe o devora sem piedade (estando este mentindo ou não).
Além dessas escolhas acertadas, Macdonald foi esperto e não descuidou do visual, concebendo um projeto ambientalmente detalhista (daí surgirem as comparações entre o imaginário Washington Globe, jornal onde McCaffrey trabalha, e o verdadeiro Washington Post). Contando com fotografia soturna e equilibrada de Rodrigo Prieto (indicado ao Oscar por O Segredo de Brokeback Mountain) e o background musical de Alex Heffes (que emprega nos créditos finais a bela canção 'Long as I Can See the Light'), o diretor filma as duas horas e pouco de projeção com uma sólida eficiência, emanando muita tensão em uns dois ou três pares de cenas - o que, atualmente, é algo a ser destacado. Há, por exemplo, uma sequência em um estacionamento que é, desde já, um dos melhores momentos de suspense do ano.
Mesmo assim, Kevin Macdonald, apesar do esforço, não apresenta em sua encenação um processo tão elaborado, falha que os cinéfilos mais experimentados certamente não perdoarão. Para estes, o filme provavelmente não passará de um típico thriller hollywoodiano. Interessante, bem intencionado e cheio de ótimas referências a Todos os Homens do Presidente, de Alan J. Pakula, mas ainda assim um típico thriller hollywoodiano. Pode até ser, mas, de qualquer forma, Intrigas de Estado é suficientemente adulto e inteligente para ser visto no cinema. Sem falar que é muito melhor do que os filmes de Ron Howard, McG e Michael Bay juntos. E ponha muito nisso.
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