Saltar para o conteúdo

Críticas

Cineplayers

Noite estranha numa década perdida.

7,5

No que concerne às produções cinematográficas da década de 1980, muitas focaram sua atenção no universo juvenil, procurando desmitificá-lo e representá-lo através de personagens que compunham esse mundo, atraindo os olhares do público para um outro ângulo da adolescência: o das experiências. Baseando-se nisso, diversos artistas ganharam reconhecimento por serem notórios entusiastas desse período da vida, utilizando a figura do jovem como centro dos mais variados filmes e gêneros. Era possível ver o adolescente como herói de suas histórias, lutando contra seus próprios medos e compreendendo que não só de incertezas se constitui essa fase. Tudo era uma análise de seu comportamento e de suas tendências, sempre fantasiada com músicas efusivas e visuais exagerados.
 
A Hora do Espanto (Fright Night, 1985) é o tipo de filme que além de estabelecer a visão do mundo pelos olhos de um protagonista jovem, consegue transformar toda aquela trama de horror numa analogia aos temores e indagações que lhe percorrem a mente. Com isso, ele resgata uma atmosfera peculiar, de nostalgia, presente em diversas produções pertencentes àquela década, evidenciada por cenários sempre berrantes e uma ação ainda ingênua. Entre outros gêneros, o terror se tornou um meio para que diretores e roteiristas deixassem a cargo do adolescente o heroísmo e a coragem; era cada vez mais frequente vê-los como protagonistas, destinados a enfrentar o mal com as armas e a intrepidez de que dispusessem.
 
Certamente, é um conceito um tanto quanto piegas, muito embora fosse justamente isso que trazia a alguns filmes oitentistas uma charmosa aura de nostalgia. Em A Hora do Espanto, já havia um encanto pelo antiquado (mesmo para a época), denunciado tanto em diálogos quanto na caracterização de certos personagens. Seja nos conhecidos artifícios para se aniquilar um vampiro (desde crucifixos às estacas de madeira) até a construção cenográfica de suas moradias, ficava evidente o fascínio pela famigerada mitologia das entidades noturnas, num período onde essa passava a sofrer grandes alterações. É possível visualizar em Jerry Dandrige alusões claras ao Conde Drácula, do semblante triste e apaixonado a uma notável elegância nos gestos; mas a visita à obra literária de Bram Stoker não é sentida somente através de seu antagonista, como também pela curiosa figura do decadente apresentador televisivo Peter Vincent, uma mistura divertida de Van Helsing com Bela Lugosi.
 
Assim como a atenção voltada ao obsoleto, o gosto pelo mistério se tornava uma das características mais marcantes da obra, servindo como fio condutor para todos os eventos que viriam a se suceder. O protagonista se via rendido pela curiosidade, especulando os acontecimentos da casa ao lado em uma clara referência a Janela Indiscreta (Rear Window, 1954), onde, assim como o personagem vivido por James Stewart, o jovem Charley Brewster observava os movimentos de seu vizinho através da janela de seu quarto, com ajuda de um binóculo; esse alerta de algo errado põe não somente sua vida em perigo, como também das pessoas que ama. O filme ilustra essa sinistra situação com um clássico cenário de pavor, preenchido com as tradicionais residências norte-americanas e um clima mortífero predominante nas passagens noturnas.
 
Tudo aqui evoca o espírito de uma década perdida no tempo, de uma inocência que ainda se fazia patente, fosse através da imensa dificuldade do casal protagonista em ter sua primeira noite de amor (visto que os filmes teen de hoje já ultrapassaram há muito essa faixa), ou mesmo dos conflitos claros entre a credibilidade e o ceticismo. É comum de toda criança o mergulho na fantasia, na crença em tudo que os adultos não são capazes de enxergar; assim se dá a aventura de Charley, na confiança em seus próprios olhos e no desafio de convencer os demais da veracidade daquela situação. Desse modo, o espectador conseguia despertar empatia pela trajetória daquele rapaz, uma vez que ali, acima de tudo, não se encontrava mais que um adolescente querendo ser ouvido e levado a sério.

O seu considerável sucesso quebraria, nem que momentaneamente, a excitação do público para com os slasher movies, que deixava de lado os massacres cometidos pelos serial killers para focar sua atenção na alucinante batalha de um jovem contra estranhas criaturas. A Hora do Espanto é um filme aberto, que se encerra com reticências, seja pelo ensejo de realizar-se uma sequência (que viria a ser lançada três anos depois) ou mesmo pela evidência de que ainda há mais para se contar após ali. O caso é que, de um modo ou de outro, os olhos vermelhos que espreitam na escuridão logo no desfecho denunciam o mesmo que a misteriosa cena inicial, pois a lua cheia que surge na sinfonia dos uivos deixa clara a mensagem: teremos uma longa noite pela frente.

Comentários (11)

●•● Yves Lacoste ●•● | sexta-feira, 07 de Outubro de 2011 - 22:14

Tá vendo. Mais elogios quanto ao remake.

O Junior deve ser mais um daqueles que acha um crime refilmar clássicos!!!

Rodrigo Barbosa | segunda-feira, 10 de Outubro de 2011 - 06:58

Esse daqui é ótimo. O remake é bom. Simples assim!

Alexandre Cavalcante | domingo, 16 de Outubro de 2011 - 11:39

Spoiler (não leia se ainda não tiver visto o filme)
O Bruno pode ter viajado um pouquinho, mas o filme original tem algumas coisas estranhas. O personagem do Ed Evil é seduzido pelas propostas do vampiro Jerry (tanto no original quanto no remake) como se ele não tivesse mais que fingir algo, quanto a ele tá quase na cara mesmo.
A respeito do cara espionar o vizinho, o remake traz umas mensagens subliminares. Não, aquilo não é subliminar, aquelas piadas acabaram com o personagem. O rapaz do remake não quer transar por nervosismo e fica vendo o vizinho, até a namorada joga uma "quase" direta sugerindo que Charley é gay.
No remake quando Jerry vai falar com a mãe do rapaz, ele diz que está sendo assediado por Charley.

No original eu não acho que tenha isso, mas no remake a Disney adorou colocar esse tipo de indireta.

Faça login para comentar.