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Críticas

Cineplayers

"Temos nosso próprio tempo."

6,5

Segundo Albert Einstein, a realidade é composta por dois fatores essenciais: o espaço e o tempo. Sem um deles é impossível que exista qualquer coisa. Cientificamente esse raciocínio já foi comprovado, mas para o ser humano fica difícil limitar suas teorias sobre a complexidade de nossa existência a apenas dois “meros” fatores. Nasce aí um desejo impossível de ser realizado por qualquer um: alterar essa lógica e poder viajar no tempo. No cinema, na literatura e em outros tipos de ficção, esse tema sempre exerceu um fascínio imenso em seus autores, de modo que as máquinas do tempo já são elementos recorrentes na memória de todos. Se tratando de filmes, logo vem à mente a engenhoca do Dr. Brown (Christopher Lloyd) feita a partir de um Delorean, em De Volta para o Futuro (Back To the Future, 1985). Seguindo essa linha de raciocínio, até que demorou para o cinema nacional apostar em uma produção dessa temática. O Homem do Futuro (idem, 2011), do diretor Cláudio Torres, trata-se, portanto, de uma colcha de retalhos de todas as histórias que fizeram sucesso em torno desse assunto. Entre uma referência e outra, ele acaba encontrando em seu trabalho uma maneira de abordar o tempo de uma maneira bem particular.

Há algumas semanas atrás, outra produção brasileira de grande apelo comercial foi lançada nos cinemas, Assalto ao Banco Central (idem, 2011), e seu grande problema se encontrou na exceção de referências do cinema norte-americano, comprometendo assim sua originalidade. O mesmo poderia ter acontecido com O Homem do Futuro, se não fosse pela sagacidade de Torres em fugir das conduções e conclusões óbvias e esperadas para esse tipo de tema. Não que o filme seja inovador e diferente de tudo visto até então, mas possui sim uma identidade própria e um carisma tão inesperado que acaba angariando um lugar pequeno, porém valioso, ao lado de seus colegas. Grande parte dessa vitória se deve ao elenco afiado, encabeçado pelo já popular das telonas nacionais Wagner Moura e pela beldade Alinne Moraes.

Wagner, agora longe da imagem do brucutu Capitão Nascimento, interpreta o físico apelidado de Zero, que consegue realizar a façanha de inventar uma fonte de energia nova e totalmente eficiente. Para que seu projeto seja um sucesso, ele precisa de uma série de autorizações governamentais e burocráticas, mas sua paciência não permite tamanha espera. Ilegalmente, ele testa essa máquina e misteriosamente consegue viajar no tempo através dela, voltando para a fatídica noite de 1991 em que foi humilhado e teve seu coração partido por Helena (Alinne Moraes), sua colega de universidade por quem era apalermadamente apaixonado. Decidido a mudar essa lembrança horrível que fez de sua vida emocional um inferno, Zero encontrará com si mesmo para tentar se convencer a não subir no palco com Helena, onde ocorrerá em breve a tal humilhação pública. Mudando a linha de tempo e ocasionando uma realidade paralela, o nosso protagonista acaba descobrindo ter cometido um erro terrível e deve correr contra o tempo para reverter a situação.

Como de costume, o roteiro apronta demais com o protagonista nesse vai-e-vem pela linha do tempo, resultando assim em diversas situações cômicas impagáveis (como quando ele tenta pagar o taxista com uma nota de 50 reais, sendo que em 1991 a moeda vigente no Brasil ainda era o cruzeiro). Mas o que realmente chama a atenção durante toda a aventura é a forma como o tempo ganha um significado dentro da história de vida de Zero. Mesmo voltando no passado e alterando os acontecimentos de lá, ele não conseguiu evitar que sua vida ficasse ainda pior, tendo que voltar novamente no tempo para consertar algo de proporções muito maiores. No fim das contas, chegamos à conclusão de que a infelicidade da vida de Zero não é resultado do seu trauma, mas sim da sua incapacidade de superar problemas que surgem no caminho. Não adianta apagar os erros do passado, pois sempre haverá outros a serem cometidos – o segredo está em viver o presente sem passadismo, visando um futuro livre dos enganos já cometidos.

Como dá para notar, o tempo aqui é quase uma brincadeira nas mãos de Cláudio Torres, que joga com seus personagens a fim de mostrar o quão sem garantia a vida é. Neste ponto se encontra até certo quê de Efeito Borboleta (The Butterfly Effect, 2004), filme que também nos conta – só que de maneira muito mais dramática – as conseqüências catastróficas na vida de um homem que possui o poder de reviver o passado. Afinal, por trás de todo esse fascínio que todos temos pela possibilidade de reparar antigos erros, se encontra um dos maiores paradoxos de nossa existência – o livre arbítrio de tomar decisões e saber lidar com o que resulta de tais.

Despreocupado em seguir regras para o sub-gênero, Torres criou em O Homem do Futuro um conjunto de idéias próprias para a lógica de seu trabalho. Por exemplo, ao contrário do que acontece na trilogia De Volta para o Futuro, nesse filme há sim a possibilidade de uma pessoa se encontrar consigo mesma em outro momento de sua própria jornada sem acarretar conseqüências devastadoras para o universo. Essa ousadia de organizar as coisas do seu próprio jeito permitiu a Cláudio a liberdade de fazer o que bem entende de sua história, sem precisar perder muito tempo com explicações chatas e bobocas durante a trama. Acima de tudo, são idéias divertidas e que exigem pouco dos efeitos especiais (por isso eles são usados moderadamente e jamais caem no terreno do artificial).

Como nada é perfeito, os momentos finais de O Homem do Futuro são bem previsíveis, mas até nesse uso de clichês o diretor soube atribuir charme ao seu trabalho. Durante a trajetória do filme há vários furos de roteiro, por isso não é recomendável ficar tentando achar lógica perfeita para todas as passagens, pois isso certamente só causaria decepção e tiraria todo o foco da trama. O segredo é sentar e se divertir com um cinema bem pipocão e descompromissado. Se Cláudio Torres soube achar “seu próprio tempo” – assim como indica a música principal da obra, da banda Legião Urbana – com esse trabalho inocente e agradável, nada melhor para o espectador do que fazer o mesmo e saber achar nas diversas passagens divertidas da história um ponto com o qual se identificar.

Comentários (14)

Lucas Assis | quarta-feira, 18 de Janeiro de 2012 - 12:39

vomitei meu estômago inteiro quando os dois cantaram legião urbana

Lairton Flores | sábado, 21 de Janeiro de 2012 - 04:09

Referências não vão faltar mesmo, só para exemplificar, me veio a cabeça De Volta Para o Futuro (Filme aliás que sou fã xiita), Efeito Borboleta, Carrie - A estranha... enfim. No entanto me agradou bastante, reconheço que comecei a assistir assim cheio de preconceitos, afinal não lembro do cinema nacional tratar de ficção científica com grande sucesso. Mas depois me rendi e sim, o filme é muito bom e vale a pena assistir e fico feliz pelo Brasil se enveredar de forma tão eficiente nesse gênero.

Silvia Lima | sexta-feira, 03 de Janeiro de 2014 - 15:05

Não é original, mas é divertido e agradável. Wagner Moura, sempre um prazer vê-lo em ação, Aline Morais, linda demais. Gostei muito.

Talita Portela | sexta-feira, 04 de Abril de 2014 - 01:53

vomitei meu estômago inteiro quando os dois cantaram legião urbana [2]

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