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Críticas

Cineplayers

O preço do fanservice.

5,0
Star Wars: Capítulo VIII - Os Últimos Jedi foi motivo de grande controvérsia entre os fãs da saga de George Lucas por conta de inúmeras subversões e decisões ousadas dentro do universo. Não satisfez certa parcela ver tantos elementos mudados pelo filme de Rian Johnson. Mas, seja como o for, é um filme necessário dentro da saga - assim como também o era O Império Contra-Ataca. É a maior prova disso é o morno Han Solo: Uma História Star Wars

Calcado nos filmes de samurai e nos seriados de ficção científica, George Lucas criou um universo muito grande com personagens que colecionam feitos admiráveis. Só a própria quantidade de livros mostra que é impossível apenas a saga dar conta da vida de todos os personagens daquele universo, então a série de spin-offs A Star Wars Story surgiu como um conceito interessante de aprofundar para o espectador vários eventos que antes foram apenas mencionados. Nesse sentido, Rogue One: Uma História Star Wars surgiu como uma experiência bem sucedida, explorando o peso dramático do esquadrão suicida que se propôs a roubar a planta da temível Estrela da Morte.

Ao tentar contar a história de Han Solo, a Disney-Lucasfilm, porém, parece desejar de volta o clima mais ameno de épocas como Despertar da Força e Rogue One e menos polêmica como Os Últimos Jedi - afinal, grande parte do motivo do universo trocar de mãos é o fato da grande e quase generalizada insatisfação com a trilogia prequel. Vai ver por isso que a origem do contrabandista mais amado e odiado da galáxia e seu fiel companheiro Chewbacca arrisque tão pouco.

O filme teve uma gestação difícil após uma troca de diretores após as filmagens já iniciadas, com Ron Howard assumindo o lugar de Phil Lord e Christopher Miller (Uma Aventura LEGO) para filmar o roteiro de Lawrence Kasdan, roteirista de O Império Contra-Ataca, escrito em parceria com seu filho Jonathan. Cheio de grandes e pequenos êxitos na carreira como Splash - Uma Sereia em Minha Vida, Cocoon, Uma Mente Brilhante e O Código da Vinci, seu ecletismo fala por si. Mas, ainda que consiga comandar algumas cenas de ação empolgantes, há um elemento determinante em falta no filme: peso dramático.

Contar de onde Han Solo veio, como conheceu Chewbacca e Lando Calrissian, de onde tirou seu sobrenome, sua blaster gun e sua nave Millenium Falcon, além de histórias como o percurso de Kessel em 12 parsecs parecia quase uma necessidade, mas o filme esqueceu quase que completamente da tensão de um conflito. Várias chances são desperdiçadas em favor de agradar um público supostamente interessado em apenas ver o que já conhece: tomemos como exemplo Qi’ra, personagem de Emilia Clarke (Game of Thrones), basicamente um apêndice de Han: a garota fantástica (o próprio arquétipo da manic pixie dream girl, como chamam em inglês, só que dando uns sopapos de vez em quando), par romântico do protagonista e que moldará sua visão das relações, não possui o potencial de ter entrado para uma organização criminosa devidamente explorado. Quando entra em cena, é para falar com o protagonista ou sobre ele.

Esforçado, é chover no molhado dizer que Alden Ehrenheich não é nenhum Harrison Ford. Ainda que o intérprete original tenha aprovado sua atuação, o ator até pega direito o timing das tiradas carismáticas e o ar que mistura confiança e arrogância, mas ainda passa longe da personalidade cretina e conflituosa que tantos aprenderam a amar. Ainda parece muito duro como Solo, ainda na superfície do personagem. Não é o caso, por exemplo, de Donald Glover, que pega o personagem original de Billy Dee Williams e incorpora à vontade o estilo bufão e fanfarrão de Lando Calrissian sabendo tanto ser ácido quanto ridículo ou mesmo dramático, quando lhe é solicitado. Pessoalmente, um spin-off de Glover como Lando seria feito exatamente: é o caso de carisma que não só foi bem lido da fonte original mas também expandido. Sua relação afetiva e sugestivamente panssexual com a rebelde e individualista androide L3 possui uma química que Alden e Emilia jamais conseguem nem soltar faísca.

E o próprio filme entrega vários pontos a mais para argumentar sua falta absoluta de peso: que seja observado o alienígena piloto Rio ou o mercenário Tobias Beckett, personagem de Woody Harrelson (Assassinos por Natureza), cujos grandes conflitos pessoais na vida são dispensados com um ou dois diálogos utilitários. Ou são esquecidos ou viram um apêndice de Han na construção de sua mitologia. Após sofrer perdas, o próprio Han ao corte de uma elipse já voltou ao estilo canastrão. Nisto o filme é sintomático, e não há nada que passe nem perto da dinâmica com Leia Organa ou o congelamento em carbonita: você gosta de Han Solo, você verá o nascimento do “mito”. Ainda que não haja nenhum mistério nesse mito, é verdade, que entrega o que foi pedido, não ofende ninguém, e termina.

Solo é o que esperaríamos de um Star Wars em ponto morto. Alguns podem advogar a favor da despretensão, afinal trata-se de um heist movie, com um protagonista fanfarrão, não é para ser dramático que nem os filmes protagonizados pelos sisudos jedi… Mas se ficarmos na superfície, na base puramente das piadas e das referências, temos um filme mais preocupado em ser produto cultural que requenta o que já veio antes do que como uma narrativa interessante. Do jeito que saiu, não precisava nem ter sido feito, pois não agrega em muita coisa. Que argumentem que dá para “passar o tempo”, até dá; mas de tão inofensivo, é pouco provável que seja lembrado daqui a alguns anos. Que a próxima história Star Wars roube um pouquinho para sua narrativa do hipercombustível tão perseguido em Solo, senão era melhor ter parado em Rogue One.

Comentários (2)

Matheus Bezerra de Lima | segunda-feira, 28 de Maio de 2018 - 17:33

Lawrence Kasdan foi apenas o roteirista de Império Contra-Ataca. O diretor foi Irvin Kershner.

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