Charmosa, talvez essa seja uma definição adequada para o que o diretor Jack Clayton fez ao adaptar pela terceira vez no cinema o clássico da literatura O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald, lá em 1974. Somos transportados para a época retratada, a primavera de 1922, com seus grandes carros, mansões e luxuosos figurinos. O filme representa, entre outras coisas, o Estados Unidos, o sonho americano, seu crescimento econômico após a guerra e o capitalismo soberano. Não obteve o prestígio merecido do ponto de vista narrativo. A crítica foi rude. Foi adaptada outras vezes para o cinema, em 1926 foi realizado por Herbert Brenon – alguns dizem tratar da versão mais fiel –, em 1949 foi a vez de Elliott Nugent construir sua versão. Em 2000, Robert Markowitz adaptou para a televisão e, agora, em 2013, está nas mãos de Baz Luhrmann.
Narrado pelo personagem Nick Carraway, primo de Daisy e vizinho de Gatsby, a história se inicia com certa frieza, timidamente. Ouvimos de Nick, sem julgamentos e com uma consciência avassaladora, discursos sobre o estranho vizinho, um homem aparentemente inacessível, organizador de festas majestosas, mas que jamais comparece a elas. No jardim ao lado, em frente ao casarão magnânimo, noites são viradas com música, dança e pessoas que aparecem entusiasmadas por convites ou por ouvirem falar sobre o novo rico situado promovendo diversão. Era o tipo de gente que Carraway reprovava. Este conta sobre suas insatisfações e de como conhecera o vizinho. O tal Gatsby só vem aparecer definitivamente após mais de 30 minutos de projeção. Igualmente aos habitantes da cidade, apenas ouvimos falar, ou o assistimos rapidamente, surgindo em algum lugar como uma sombra. Quando a protagonista, Daisy Buchanan, ouve seu nome, pergunta: Gatsby? Qual Gatsby? Um zoom expande a feição da intérprete Mia Farrow empalidecida. Aí a história toma um rumo.
Tempos do pós guerra com os Estados Unidos dirigindo-se para a crise. Um homem ostentado, um estranho cuja fortuna provém do desconhecido. Jay Gatsby, vivido com altivez por Robert Redford, é uma incógnita romântica. Um grande personagem. Este nos é insólito já que custamos para alcançar seu íntimo. Ele se revela junto aos seus desejos pairados sobre a Long Island, separando sua mansão de seu afeto. Tudo é desejo, o império conquistado fora motivado por ele e os anos que lhe manteve afastado da paixão omissa foram pela busca por uma conquista orgulhosa, obsessiva, almejada pela cobiça de uma ilusão.
Uma cena, aquela a qual Gatsby lança camisas sob o olhar encantado de Daisy, ficou marcada em sua época, como se banhasse a moça com luxuria. Mia Farrow está exuberante vivenciado a moça encantada, sua personagem aparece a princípio esquisita, afetada, com nuances artificiais que nos faz questionar seu papel. Tudo isso, por sua vez, é face de sua figura tão bem construída, uma fraude enquanto mulher, vislumbrando unicamente o triunfo. O passado negado mutilado, esquecido como um flerte dissoluto, retorna no presente como interesse libertário, engajador de sua condição torpe numa sociedade cujos homens ricos exibem troféus com pomposos vestidos.
A narração é lógica, segue um arco dramático bem definido, mantendo o segredo de seu misterioso protagonista. As consequências da primeira grande guerra ainda estão sendo superadas, jovens heróis aproveitam à fama. A juventude da época, os bonificados, gozavam das regalias econômicas com grandes eventos. O trabalho de direção artística é preciso ao reconstituir esmeradamente os imensos casarões e os caminhos por onde os carros desfilavam. Em contrapartida, a rua da oficina, onde o outdoor com os grandes olhos observa tudo que acontece numa onipresença imaginária, é dominado por cores escuras. É o local para se manter distante, escondido, onde os pecados são mantidos enterrados.
Não é tão extraordinário quanto o romance de Fitzgerald. Foi o que a crítica mais questionou. É muita injustiça comparar. Enquanto filme, tornou-se referência e é constantemente lembrado. A versão de 74 é a mais relevante, roteirizado por Francis Ford Coppola, responsável pela trilogia “O Poderoso Chefão”. É exuberante em forma e na disciplina de seus atores em retratar com competência a dupla central. Emergimos naquele universo, observando tudo tal como o personagem objetal, o outdoor envelhecido. A direção exagera deixando a história à deriva em detrimento do visual. Entre obsessões e crimes, entre a beleza da sociedade burguesa de mentira e a lápide do tempo que finda em troca de conveniência e desprezo, a obsessão por conquistas fez de vítima a consciência daquele o qual o amor cegou.
6,5
Eu ainda acho esta versao bem melhor do Baz Lurham,por ser fiel a epoca em que a historia se passa.
É um filmaço.Envolve,tem boa historia e Redford em alta.
Excelente mesmo.
Parabéns pelo texto! Fiz a crítica da versão de 2013 e to aguardando aprovação, gostei bastante do filme mais atual também, mesmo com o exageros de Luhrmann.