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Críticas

Cineplayers

O vazio do cinema comercial. De novo, novamente!

2,0

Filho legítimo de Hollywood, definitivamente algo que só a indústria norte-americana poderia nos proporcionar, Fúria Sobre Rodas é uma espécie de Frankenstein dos filmes de ação - recortado, reciclado, mas jamais renovado. Tudo bem, não há necessidade de que tudo que nos é apresentado seja novo e revigorante, há de se ter bom senso quando questionamos a originalidade nos filmes. Nem todo o público a quer e até mesmo parte do público a quer... bem longe! Aí que entram os executivos de negócios de Hollywood, para dar a essa grande parcela do público honestamente o que ela procura. Só que aqui não deu certo – com restrição de audiência R por causa do excesso de sexo e sangue, e principalmente pelo fato do filme ser ruim, horroroso, Drive Angry, ainda que leve o selo “3D” em seu nome conforme lançamento comercial nos Estados Unidos, foi uma lástima nas bilheterias.

Há um tom interessante no estilo de Fúria Sobre Rodas (que não é um filme de ação automobilística, que fique bem claro – até aí nota-se a má intenção dos executivos). Uma forma quase anárquica de mostrar sexo e sangue – como se fosse uma versão de ação de Premonição (Final Destination, 2000) – fulmina em sequências intermináveis de humor involuntário. Não porque os roteiristas são ousados (a cena de tiroteio durante um ato sexual poderia soar como algo genial, mas é simplesmente ridículo, mesmo que o “ridículo” seja subjetivo), mas sim porque eles aparentemente não tinham muita ideia da direção para a qual levar uma história que desde sua cena inicial não tinha pé nem cabeça. Como um retalho mesmo, juntaram um bocado de filmes – muitos deles estrelados pelo próprio Nicolas Cage, que aqui faz a mesma coisa que fez em seus últimos anos de carreira, até nos melhores papéis [leia-se: Vício Frenético (Bad Lieutenant: Port of Call New Orleans, 2009)]. Fúria Sobre Rodas acaba sem identidade alguma e se fôssemos separar alguma sequência aleatória do filme, poderíamos remetê-la a vários outros títulos – a maioria deles, ruins.

O diretor Patrick Lussier já fez pior, com outra estampa 3D gratuita, na refilmagem de Dia dos Namorados Macabro (My Bloody Valentine, 2009). Seu estilo é o mesmo de parte da geração atual de diretores que trabalham no esquema de estúdios, produzindo filmes sob encomenda para rápido consumo. O fracasso deste Drive Angry talvez atrase a carreira de Lussier, já que vai arrecadar apenas uma parcela do que lhe foi dado para torrar em efeitos especiais decrépitos e uma trilha sonora bacana. As atuações convêm ao restante do filme, e é certo dizer que o ator mais talentoso do mundo não conseguiria extrair uma performance shakespereana com um material tão carente.

Encarando Fúria Sobre Rodas como uma comédia, o resultado é levemente superior – o símbolo da seita do vilão do filme (Jonah King, feito por Billy Burke) é um pentagrama esticado no eixo Y. E é interessante como uma obra tão limitada e com apelo popular consegue ser de certa forma complexa para acompanhar. O personagem de William Fichtner – o “Contador” - aparece, reaparece, e apenas no final entende-se seu propósito, mas mesmo o que é explicado não justifica metade das ações dele e de Milton (Cage) para com ele. O ponto positivo, de certa forma, é Amber Heard, cuja personagem Piper vai bem além da função de enfeite erótico para Cage – a garota tem personalidade própria voz ativa e desempenha um papel importante na fraquíssima trama. Muito mais do que o tal vilão, chefe da seita.

Até o momento este leva o título de filme mais inócuo do ano. Em tempos de refilmagens, reboots e transições gratuitas para o 3D, não é pouca coisa levar esse troféu. Mas o ano é longo e o verão norte-americano ainda sequer começou. Cage ficou alguns milhões mais rico e a vida segue, até o próximo pseudo-filme de ação de sua carreira, que já teve momentos maravilhosos como Despedida em Las Vegas (Leaving Las Vegas, 1995), Adaptação (Adaptation., 2002) e o recente e já comentado Vício Frenético. Agora seus fãs (pois é justo ele ter fãs, já que o ator tem muito carisma) ficam renegados a lapsos cada vez mais raros de cinema que não seja feito de obras recicladas. Fúria Sobre Rodas é apenas um erro absolutamente inofensivo e que já pagou (literalmente) seus pecados nas bilheterias.

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