O diretor Ira Sachs e o roteirista brasileiro Maurício Zacharias têm uma parceria profícua que chega agora no quarto longa-metragem, sempre explorando universos e características muito próprios das relações humanas. Frankie, apesar de tudo, parece ter vida própria em relação aos três anteriores, tendo uma certa independência temática que de alguma maneira circulava sua obra. Pela primeira vez com um elenco extenso, o filme trata de uma reunião familiar que passa por um processo de luto prévio. Acima de tudo, um filme que celebra a liberdade em todos os momentos da vida, ainda que pareça tarde demais.
No centro da trama, a atriz vivida por Isabelle Huppert entra em contato com os laços emocionais e sanguíneos durante uma viagem a Portugal em momento delicado pra si, ainda que o clima seja algo celebratório. Entendo que apesar da dor que envolve o momento, o filme consegue superar essa questão e ter inúmeras cenas bem-humoradas, leves, espirituosas, num ambiente agradável e descontraído, ainda que à espreita do pior. Com muita leveza, a obra discute relações familiares disfuncionais com ramificações diversificadas, casamento por conveniência, a descoberta do primeiro amor, romances bem e mal-sucedidos diversos, enquanto seu grupo de personagens caminha pelas ruas e paisagens portuguesas.
Cada vez menos Sachs vem guardando características dos seus primeiros filmes, como a aspereza sentimental. A ela, deu lugar um olhar iluminado os inúmeros trajetos da vida e das pessoas que os compõem, que eventualmente trocarão de percurso depois do início do caminho. O diretor adquiriu um tom crítico/irônico sobre a humanidade, que o faz relativizar as diálogos extremados apresentadas no roteiro de Zacharias, que acabam beirando o jocoso sempre. Além de tudo o clima faz lembrar um Woody Allen de entressafra, com as tiradas rascantes misturadas a uma espécie de acerto de contas, além do próprio passeio infinito pelas ruas da cidade rememorar o diretor nova-iorquino.
O elenco sabe tirar o máximo e o melhor das situações apresentadas. Não há ninguém menos que muito bem, mas o momento reflexivo de Brendan Gleeson faz toda a diferença e cria um contraponto à exuberância de Isabelle Huppert, a personagem-título com quem ele é casado; dois atores tão excelentes que percebemos a química entre eles até quando não estão contracenando. Greg Kinnear é outro com belos momentos ao lado de Marisa Tomei. Independente de o filme ter uma figura feminina central do porte de Isabelle Huppert, todo o elenco defende belos personagens e não deixa o leme do navio somente nas mãos da francesa. Todos têm espaço suficiente pra dizer a que veio, sem atropelos uns aos outros.
Dura e injustamente criticado em Cannes, Frankie não elabora absolutamente nada de inédito em suas colocações sobre famílias, amigos e as intersecções emocionais entre ambos. Um confortável passatempo no qual 1 hora e meia passa sem olhar para o relógio, mas que não tem o DNA potente que um dia o diretor apresentou. Na falta dos pontos de atração, o elenco do filme transmite a segurança que o espectador precisa para se sentir satisfeito na saída do cinema.
Crítica da cobertura da 43ª Mostra de São Paulo
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