Um filme que não assusta mais, mas que mantém o seu charme de uma época que não existe mais.
“It’s Alive!”
Claro que Frankenstein não causa hoje o mesmo furor que causou na década de 30, quando foi lançado. Porém, se analisarmos a importância do filme para o gênero horror, fica impossível negar o status de obra-prima a esta fita. Vendo pelo olhar atual, pode parecer bobo e clichê, mas aos lentos passos da evolução, podemos dizer que, de clichê, ele não tem nada; muito pelo contrário, sendo um dos primeiros a adaptar a ousada obra de Mary Shelley para as telonas, em uma iniciativa muito positiva da Universal, a série de filmes de monstros do estúdio acabou sendo o formador de tais clichês, muitos copiados, poucos igualados.
A história vem do livro clássico de Shelley escrito em 1816, quando a autora tinha apenas 19 anos, baseado em um sonho que tivera aos 18. Dr. Henry Frankenstein (Colin Clive) está recluso em seu castelo, ao contrário do que seu pai, Baron Frankenstein (Frederick Kerr), e sua bela noiva, Elizabeth (Mae Clarke), desejam. Tentando fazer com que ele volte para casa, eles não imaginam a experiência insana que o doutor está fazendo em seu laboratório: recriar a vida através de um corpo todo costurado, com vários pedaços de diversas pessoas. O problema é que o cérebro roubado para a experiência é de um ex-assassino, o que torna o novo vivo um verdadeiro perigo para a sociedade.
O terror de Frankenstein não está no explícito, mas sim nos textos subentendidos através das palavras ou ações. O ato de abertura do filme, em que uma pessoa vem e diz sobre o horror contido na obra, já preparava o público para o que vinha a seguir – e, da sua forma, já tornava tudo mais assustador. Um dos momentos mais fortes é quando o doutor, na presença de sua amada e de seu cunhado, explica que sua criação é feita de pedaços de várias pessoas. Em contraponto, nos momentos onde o horror tenta ser mais explícito, como quando o Frankenstein fica no mesmo quarto de Elizabeth ou então no final, com o boneco sendo jogado do moinho em fogo, fardaram o longa ao tempo.
Só que, naquele tempo, isso era suficiente para fazer as pessoas sentirem medo. Enquanto hoje o ultra-realismo é usado para personificar cada morte e fazer o público ter medo, em Frankenstein não era necessário isso. Ao mesmo tempo em que era um dos primeiros a brincar com o medo do público no cinema falado (o cinema mudo possui suas obras-primas do gênero; muito mais chocantes, por sinal), o seu poder como arte está nos pequenos detalhes, nos singelos movimentos: maltratado pelo criado do doutor, quando Frankenstein vê a criança, sua vontade era apenas brincar, e não fazer o que fez.
Fora que a belíssima direção de James Whale (que tem até um filme sobre sua vida, chamado Deuses e Monstros) contribui para que o trabalho, além de tudo, seja incrivelmente belo. Nessa mesma cena da menina, a paisagem ao fundo é simplesmente explêndida, fora os enquadramentos, que já são de uma composição invejável para o período pré Cidadão Kane. E o filme parecia estar mesmo predestinado a se tornar clássico, uma vez que o personagem se tornou imortal para a história do cinema (todos o relacionam à caracterização deste filme, seja em homenagens, desenhos, sátiras, etc), além de uma série de seqüências clássicas – a minha preferida é quando o doutor, enlouquecido pelo sucesso de sua experiência, começa a gritar a frase que iniciou esta análise; outra também bastante legal (e arrisco dizer que pode ter sido chupada de O Encouraçado Potemkin) é quando o pai, horrizado pela morte da filha, caminha com ela nos braços pelo meio da cidade.
O filme também traz alguns aspectos ilógicos, claramente forçados para romantizar toda a experiência ao público. Como explicar, por exemplo, as mortes tão simples dos coadjuvantes e como os protagonistas, que sofreram ataques muito mais graves, sobreviveram? E outra, se Maria se afogou, como todo mundo pode afirmar que ela foi assassinada? Isso é claramente uma deixa, que o autor nos induz através da afirmação de um personagem, para que a caçada ocorra, e não um fato que tem um background convincente para que possamos acreditar no que foi dito – uma preocupação que não existia na época; um aperfeiçoamento do roteiro que veio com o tempo.
O que sobra nos dias de hoje é a sua fonte de pesquisa como cinema, pois como entretenimento, especialmente como horror e suspense, claro que existem melhores opções. Sua característica mais marcante, a personificação do monstro em si (apresentando o ator como ? na abertura, mas dando os devidos créditos a Boris Karloff no final), pode não ser real como nos dias de hoje, mas é a caricatura perfeita do charme de uma era que não existe mais.
Aí é que está...queria muito assistir o filme, e assim entrar na atmosfera daqueles primeiros filmes de terror,
mas agora, talvez acabe decepcionado.