Um filme surpreendente de Brian De Palma, misterioso e excitante.
Um dos diretores mais controversos do cinema está de com o thriller Femme Fatale. Brian De Palma é um sujeito tão odiado quanto amado. Se você prestar atenção nas críticas deste seu último filme, vai perceber o porquê. Adorado por muitos, e detestado por tantos outros, Femme Fatale tem todos os ingredientes de um bom filme do diretor: mulheres bonitas e fatais, que alucinam os homens (O Pagamento Final), técnicas de filmagens modernas e ousadas, como tela dividida (Olhos de Serpente), ação sofisticada (Missão: Impossível) e personagens fortes (a maioria de seus filmes, mas só para citar um outro, Scarface).
Este é cinema do bom! Mais do que apenas contar uma boa história, cheia de reviravoltas, segredos, bandidos (e poucos mocinhos), tensão, De Palma nos envolve visualmente nela como poucos diretores seriam capazes de fazer. Muitas pessoas acharão tal paixão pela imagem, que no filme vale tanto quanto a história, um desperdício de tempo. Estas pessoas esquecem que cinema também é isso. Prazer visual. E o prazer visual presente em Femme Fatale é dos mais requintados.
Contudo, Femme Fatale não é um filme de arte, porém também não é puro e bobo entretenimento. É muito dos dois. É uma aula de cinema ao mesmo tempo que conta uma história altamente sensual, interessante, e tensa. Rebecca Romijn-Stamos (da refilmagem de Rollerball e de X-Men) é vista no papel mais sensual do cinema desde Diane Lane em Infidelidade. O filme esbanja sensualidade (mais para os homens) nas cenas entre a atriz e Antonio Banderas. É uma presença notável em cada frame, embora isso mais pela sua beleza do que pela sua interpretação, que não é má, porém não apresenta nada de especial também.
O filme começa no Festival de Cannes, onde um grande roubo vai acontecer. Laure (Rebecca Romijn-Stamos) é a isca para seu grupo conseguir efetuar o tal roubo. O golpe dá certo, mas Laure foge com a mercadoria, traindo seus comparsas, que passam a perseguí-la a partir daí durante todo o filme. Fora de perigo, porém, ela é confundida com a filha de um casal, que passou por uma horrível experiência e quer se matar. Laure acaba assumindo a identidade da tal filha do casal (a semelhança física é estrondosa). Passam-se sete anos. Entra em cena Nicolas Bardo (Antonio Banderas), um fotógrafo que consegue tirar a foto da mulher do embaixador dos Estados Unidos na França. Ela é Laure (em sua nova identidade), já com sua vida completamente mudada. Os dois, então, acabam se envolvendo em uma história de muita tensão, erotismo e traição.
Pela sinopse, é fácil se enganar e pensar que Femme Fatale é um thriller de suspense como inúmeros outros, que podem ser encontrados facilmente nas locadoras. Porém, uma enorme reviravolta perto do final do filme acaba mudando completamente seu caráter. Coisas que eram já não são mais, situações que aconteceram já não mais aconteceram. Esse é o ponto chave do filme. Tal reviravolta pode confundir e afastar o público do filme. Mas De Palma sabe o que está fazendo (ele mesmo roteirizou o filme), e se você conseguir jogar a sensação de frustração por “parecer” ter sido enganado, a partir daí o filme pode se tornar um delicioso estudo para seu cérebro de distinção de realidade e ficção. Você deverá reviver certos acontecimentos na sua mente, tentando entender o que se passa. Muita coisa é explicada, porém no final ficam muitas perguntas e dúvidas no ar. Naturalmente, as pistas estão no filme, De Palma dá várias dicas para você entender exatamente o que se passa na tela. É só raciocinar um pouco.
Utilizando uma fotografia típica dos filmes de mistério antigos, com uma trilha sonora que incrivelmente se encaixa muito bem (dá tensão e emoção ao filme), Femme Fatale é, antes de tudo, um presente de De Palma aos amantes do cinema, que procuram um pouco mais do que simples entretenimento (embora como já foi falado, também seja isso). O filme também funciona como um delicioso Noir (ver matéria sobre O Falcão Maltês), com personagens interessantes mas nenhuma grande interpretação - homenageando e emprestando inúmeros elementos de filmes como Pacto de Sangue (Double Indemnity, 1944, dirigido por Billy Wilder), que é apresentado logo na primeira cena de Fatale.
Mas se esse lance de Noir, técnicas de filmagem e homenagens dentro do filme não são pra você, tudo bem, basta saber que Femme Fatale tem uma história ótima para os amantes de um bom mistério, cenas quentes, ferventes e muito suspense. Só um porém: você não pode esperar por uma trama mastigada. Vá com o cérebro ligado. A experiência vai ser ótima.
Importante: alguns dos segredos e curiosidades (há mais) de Femme Fatale. Só leia caso tenha visto o filme (ou não se importe em estragá-lo antes de vê-lo).
- A maior pista de que tudo que acontece logo após a cena da banheira é um sonho é o relógio. Ele, a partir daí, marca sempre a hora em que Laure adormeceu no banho: 3:33. Isso pode ser conferido mais tarde na sala de interrogatório (com Nicolas Bardo). O horário é o mesmo. Depois de minutos de conversa, o horário ainda é o mesmo. Obviamente, o tempo não existe em sonhos.
- Outra pista sobre o sonho: na primeira vez, o aquário presente na cena da garota suicida está transbordando; na vida real, não. O aquário transbordando no sonho é a interpretação da mente de Laure para a banheira escorrendo água pelo topo.
- Pouco antes de entrar na banheira, um programa de televisão questiona se você, conhecendo o futuro, viveria para mudá-lo. Laure responde que sim. E é o que acaba acontecendo no final, quando em vez de deixar a garota se suicidar, ela salva sua vida.
- Curiosidade: na passagem de avião está escrito “Quinta”. Esta é uma das companhias envolvidas na produção do filme.
- Uma especulação: a tomada final do filme, com a enorme foto-montagem de Bardo, simboliza o quebra-cabeças temporal que é o filme: em uma mesma cena, Laure aparece em dois momentos de tempo diferentes. Um antes dos sete anos se passarem, outro depois.
- O tema deja-vú, que acontece abertamente no filme para a personagem Laure (ela vê muitas coisas que já aconteceram duas vezes – no sonho e na vida real), é apresentado ao espectador no cartaz colocado no poste perto do bar da Igreja, onde Laure e sua amante (ou a mulher que a ajudou no golpe de Cannes) conversam.
- O filme que Laure assiste logo na primeira cena de Femme Fatale é Pacto de Sangue. Nele, você vê uma mulher como Laure será no decorrer do filme: fria, que usa os homens para seus interesses.
[plaft]
Ah Luís, tem piores vai! ahuahua
Pior que tem.
Digam o que quiserem, mas que De Palma é um mestre nesse tipo de filme, isso não há o que discutir. Grande filme. Nota 9