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Críticas

Cineplayers

Um cineasta em plena forma e ainda consistente em sua filmografia.

8,5

Quando Alan Resnais venceu a Palma Comemorativa pelo Conjunto de sua Carreira neste ano em Cannes e não por algum mérito específico de Ervas Daninhas, a primeira impressão foi de que seu novo trabalho se tratava de uma obra menor e de que só tinha participado da Mostra Competitiva pelo nome do diretor e pela data específica, comemorativa dos 50 anos de sua explosiva estreia em Hiroshima Mon Amour, no mesmo festival. Tudo seria apenas uma desculpa para que o júri premiasse o diretor francês de alguma maneira. O próprio cineasta admitiu isso, em seu discurso de agradecimento, não escondendo que gostaria de um prêmio para o filme e não para ele.

Ao assistir ao filme, percebe-se que todos estes medos são infundados. Trata-se, ao contrário, de uma homenagem justíssima, pois seu mais novo filme se encaixa perfeitamente com o restante da obra de Resnais, se mostrando ainda tão inventivo e interessante quanto na década de 50. Suas obras mais recentes possuem o mesmo vigor de antigamente e é incrível que alguém possua uma carreira tão ampla e consagrada, praticamente sem “buracos” de inatividade ou com fases mais críticas. Não podemos nos esquecer que antes ainda de 1959 ele já tinha realizado alguns dos curtas-metragens mais importantes da história do cinema, como Noite e Neblina.

Em Ervas Daninhas, ele começa sua história nos apresentando a Marguerite (Sabine Azéma), uma charmosa dentista que ao sair de uma loja tem sua bolsa roubada. O ladrão joga os documentos e objetos fora. Aí entra em cena Georges (André Dussollier), um exótico homem que fica fascinado pela foto de Marguerite, especialmente ao descobrir um brevê, já que ele também é fascinado por aviões. As duas histórias vão lentamente se aproximando, já que Georges, casado com uma moça bem mais nova que ele, hesita em se aproximar de Marguerite, mas o desejo fala mais alto. Ela, a princípio, agradece a ele por ter achado os documentos, mas só quer distância, sentimento que vai se alterando à medida que ele vai começando a ficar cada vez mais obsessivo e passa a segui-la loucamente.

Com um roteiro enxuto de Alex Reval e Laurent Herbiet, adaptado do romance L’incident, de Chistian Gailly, o longa-metragem contém piadas sensacionais e engraçadíssimas na qual Resnais consegue manter o interesse do espectador, nunca fazendo a plateia perder o fôlego com a trama. O casal de protagonistas são antigos colaboradores de Resnais e já se encaixam perfeitamente no estilo do diretor, criando personagens fantásticos e reais.

O grande mérito do filme, porém, pertence a Resnais. Sua condução é impecável e pena que assistindo no Brasil não seja possível avaliar de forma correta o filme. Tanto no Festival do Rio quanto na sessão para imprensa e a partir desta sexta no circuito comercial o filme está sendo exibido em uma cópia digital da pior qualidade e em formato de tela. Dos 2.35 metros de largura a cada 1 metro de altura, apenas 1.85 estão disponíveis na versão brasileira, distribuída pela Rain. Ou seja, deixamos de ver 22% do filme, e do que podemos observar ainda restaram belíssimos movimentos de câmera brincando sempre com a percepção do espectador diante das personagens e de suas ações e desejos.

O filme fala constantemente disso, dos desejos que movem as protagonistas, num sentido maior da palavra mais do que atração sexual, curiosidade e amor, algo que o cineasta elimina de seu vocabulário. O que move tanto Marguerite quanto Georges é a vontade de experimentar algo novo, de ultrapassar novas barreiras e tentar esquecer a frustração de olhar para o passado e não se sentir realizado por várias de suas conquistas tão celebradas e comemoradas, seja de esfera profissional, romântica ou pessoal.

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