Chega aos cinemas a quarta aventura da carismática série A Era do Gelo, animação que vem marcando o cinema com bom humor e crítica ambiental há exatos 10 anos. Todavia, a criatividade e a graça contínua, empregada nos longas do início da franquia, congelaram. Tudo está repetitivo e aborrecido, sem qualquer novidade, a não ser o aparecimento de novos personagens – desculpa para prováveis futuras explorações – e conjunções a respeito da constituição da terra a partir dos desastrosos atos de sua mais ilustre figura, o esquilo Scrat.
Manny (voz de Ray Romano), Diego (voz de Denis Leary) e Sid (voz de John Leguizamo) retornam com a história girando em torno do mamute. Seu excessivo cuidado paterno causa intrigas e palavras dolorosamente disparadas minutos antes de um desgelo fulminante que termina por separá-lo da família quando uma cratera eclode a sua frente. O continente se rompendo rima com o relacionamento fraterno se desfazendo, deixando os inseparáveis amigos sobre um iceberg, à deriva no oceano, enquanto do outro lado assenta o remorso. Perdidos no mar, tem início uma odisseia para o trio – e outro integrante – que enfrentará riscos como a fúria de uma tempestade, sereias e o avanço de piratas navegando num navio de gelo, liderado pelo inescrupuloso macaco Entranha (voz de Peter Dinklage).
Quem ficou de fora dessa quarta empreitada foi o cineasta brasileiro Carlos Saldanha, diretor dos 3 primeiros filmes, que vem se dedicando à animação Rio. A bomba caiu sobre as mãos da dupla Steve Martino e Mike Thurmeier – este segundo dividiu a direção com Saldanha em A Era do Gelo 3 (Ice Age 3, 2009). Familiarizados com esse universo, ambos tratam com responsabilidade a leveza da trama, preparando um filme enxuto e alegre, condescendente com um público jovem que não sofreu com o notável desgaste da série. Intrigas tolas, relações estremecidas e conflitos amorosos – surge um par romântico para Diego – são algumas repetições de ideias usuais que fizeram mal à franquia, que se fortalece quando Scrat está em cena. Esses pequenos instantes são ao menos o bastante para empurrar a história - sua associação com Atlântida é certamente o melhor momento do filme.
Há uma dramatização que acompanha a família dos mamutes, quando a filha de Manny, a adolescente Amora, culpa o pai por um fracasso amoroso. Nesse âmbito se expõe as possibilidades de relações com uma impregnada moral de auto conhecimento e respeito pelo outro, não importando gênero, etnia, raça, etc. Tudo é realizado de maneira infantil e pouquíssimo eficiente, travestindo valores por interesse pessoal e estereótipos típicos da adolescência, acentuando o bullying no distanciamento de um determinado grupo por não corresponder às expectativas deste.
A qualidade da narrativa é ignorada em nome da diversão, com passagens realizadas unicamente para o efeito 3D, buscando impressionar com a profundidade das cenas, que ilustram as magnânimas geleiras ou o oceano dançando enquanto espirra água na tela. O formato compreendendo a moda se mistura com tipificações do cotidiano, transitando vagamente por noções de caráter humano representados por animais: o abandono graças ao envelhecimento, a família em discórdia, a cultura de um povo causando estranhamento social, o respeito pela diferença e a loucura questionada.
Tecnicamente, porém, o filme é inquestionável. O cuidado na composição dos personagens é tremendo, com detalhes significativos bem trabalhados - por exemplo, os pelos e os olhares. O desenho de produção, auxiliado pelo 3D, contribui para o universo refletido, enobrecendo as belas paisagens compostas por imensas geleiras, ilhas perdidas no horizonte e o alto mar. Nestes cenários de rebuscadas elaborações visuais, o longa mantém a igualitária qualidade de seus antecessores. Pra somar, boas cenas de ação são criadas, dominando a ótica da violência daquele tempo de modo contido por óbvias razões. Uma cena remetente a Coração Valente (Braveheart, 1995) garante uma boa piada aos mais crescidos. Diante tantas questões, a fraqueza da empreitada é perceptível, e sua necessidade de reinvenção é necessária para derreter a má impressão desta continuação infeliz.
Está mesmo na hora de criar desenhos novos. A "turminha" pré-histórica já deu no que tinha que dar, ainda mais agora depois do voo solo que o Carlos Saldanha deu em sua carreira saindo da saga "Era do Gelo", sem nem "ensinar a próxima geração" a fazer um filme do estilo.