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Críticas

Cineplayers

Filme menor de Spielberg feito para TV em 1971 não deve nada a seus grandes suspenses.

8,0

Spielberg logo no início de carreira já demonstrava potencial com esse lançamento que acabou sendo lançado diretamente para a televisão. E que potencial! A partir de uma premissa simplíssima - um carro sendo perseguido por um caminhão - ele nos oferece doses praticamente perfeitas de suspense e tensão. Tudo à luz do dia. Com a graciosa característica de conseguir prender o espectador, este trabalho não deve muito a seus melhores filmes de suspense de alto orçamento, tais como Tubarão e O Parque dos Dinossauros, mostrando que o diretor nasceu para brilhar.

O que mais impressiona hoje em dia (34 anos depois) é o apuro técnico de Encurralado. Mesmo sendo um lançamento para a televisão de um diretor ainda razoavelmente inexperiente e sem contar com a tecnologia dos computadores, o diretor nos presenteia com ângulos de câmera e planos inteligentes e sagazes, conseguindo o feito de adicionar emoção em praticamente todas as cenas. Seria fácil fazer de um filme que se passa quase que inteiramente sobre o asfalto algo entediante (Sem Destino, lançado dois anos antes desse, que o diga), mas a habilidade do diretor em desenvolver a tensão de forma crescente espanta essa crença.

David Mann (Dennis Weaver, que foi convidado para atuar no filme graças a seu trabalho no clássico A Marca da Maldade), um sujeito ordinário, sai logo de manhã cedo em viagem de negócios de carro. Deve atravessar uma rodovia no meio do deserto para chegar a seu destino. Seu pecado? Irritar-se com um caminhão lento na estrada. A irritação é recíproca, e logo o caminhoneiro passa a perseguí-lo de forma cada vez mais perigosa, e o que começa como um joguinho bobo logo vira uma busca frenética e mortal do caminhoneiro para acabar com a vida de Mann. O clima desolador do deserto, aliado às pessoas estranhas que encontra pelo caminho (caipiras que parecem sair da versão original de O Massacre da Serra Elétrica) e, principalmente, o fato de o motorista do caminhão permanecer anônimo durante todo o filme, formam os elementos perfeitos para um grande suspense.

O nome original do filme - Duel - funciona como uma perfeita analogia ao gênero faroeste. Foi lançado quando Sergio Leone era o rei desse tipo de filme, não por coincidência. Mann e o caminhoneiro disputam um duelo sobre rodas. O vilão barbudo e musculoso (crê-se!) contra o mocinho hábil, mas que tem que enfrentar as injustiças dos opressores para conseguir sobreviver. Não há como fugir do duelo. A única maneira de vencer é utilizando-se da inteligência. Esse é exatamente outro ponto especial do filme. Sabemos que uma hora a perseguição deve terminar. Mas como poderia um carro pequeno contra um enorme caminhão-tanque? Essa pergunta tem a capacidade mágica de segurar - ainda mais - a atenção do espectador.

É um filme sem história, sem desenvolvimento de personagens. Na verdade, possui até mesmo algumas inconsistências em seu roteiro. No final, é um filme gratuito, mas que ainda com todos esses fatores contra si, funciona perfeitamente como cinema - pois cinema não é somente a capacidade de contar uma história bem contada, e sim a capacidade de entreter sem ferir a inteligência do espectador (ou, se for para fazer isso, que o faça com elegância), de fazer cativar quem está assistindo à projeção, e por isso esse filme hoje pode ser considerado muito importante, ainda que seja tão oco. Ele mostrou ao mundo o grande diretor que Spielberg acabaria por se transformar (assim que Tubarão fosse lançado, quatro anos mais tarde) e mostrou que cinema e entretenimento podem coexistir, quando não subestimar quem o assiste. Quando o filme tem a capacidade de nos fazer sentir e nos fazer importar pelos seus personagens, ele funciona, pois deixamos de ser espectadores passivos e passamos a vivenciar os acontecimentos, como se estivéssemos lá, na tela. Vendo esse filme, fica complicado não suar frio com David Mann. E fica difícil não sentir prazer quando se assiste a cinema assim.

Encurralado serve como exemplo bastante adequado de filme autoral, sem interferência de estúdios. Geralmente são dois os tipos de diretores que conseguem fazer esse cinema: os diretores independentes e os diretores que são mega-sucesso e estão em boa fase na carreira, quando tudo dá certo. Spielberg passou do primeiro tipo para o segundo nesses longos anos de carreira. Obviamente cometeu deslizes - alguns até grandes, vide Hook - mas desde os anos iniciais de carreira mostrou ter o diferencial que já colocou seu nome na história do cinema, de onde ninguém poderá rebaixá-lo. David Mann só queria atravessar a rodovia para um encontro de negócios, mas graças a Spielberg e ao roteirista Richard Matheson (hoje um senhor de 79 anos que ainda está vivo na carreira, algo raro), fomos presenteados com muito mais do que isso - um suspense bárbaro! Vida longa a ambos no mundo do cinema.

Comentários (2)

Renato Coelho | sábado, 17 de Agosto de 2013 - 17:22

Esse filme é um clássico. Lembro-me que passava sempre de sessão Coruja da Globo e ficava acordado até tarde pra vê-lo. Naquela época, dos meus 15, 16 anos nem sonhávamos com internet e a única oportunidade para assistir não poderia deixar passar. Hoje, graças a Deus, podemos assistir esses clássicos com facilidade e a um preço bem barato. Esse filme remonta à minha infância.

Cristian Oliveira Bruno | segunda-feira, 25 de Novembro de 2013 - 21:58

Grande trabalho de Spielberg. Filme tenso do inicio ao fim.

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