Várias desculpas poderiam justificar, embora sem grande êxito, a realização dessa apática obra estrelada pela costumeiramente espetacular Juliette Binoche. Não há nenhum grande foco, existem situações, questões jogadas entre as interações dos personagens que por vezes emulam situações corriqueiras da vida e conotações de desejos reprimidos. É o máximo da narrativa relembrar o quanto mascaramos sentimentos, e isso é pouco, pois a forma com que objetiva a proposta é problemática, com pouquíssima coisa satisfatória. O filme trabalha com um tema fértil: a prostituição. Sobre ela, morais se desenrolam e estereótipos tradicionais se quebram. Trata-se de puro desejo e conforto, facilitações e abstrações.
A história é simples e carrega potencial. Anne (Binoche) é uma jornalista da revista Elle com pretensões de fazer uma matéria contendo entrevistas feitas com estudantes universitárias que se prostituem. Sua curiosidade transcende a motivação dessas garotas, parece buscar nelas uma resposta outrora recalcada em sua vida. Há uma intrusão a intimidade dessas mulheres que até certo ponto se defendem. Quanto a protagonista, percebemos o quanto é legítima sua projeção durantes as conversas, com a atriz habilidosa em cena mostrando-se introvertida, perdida em devaneios enquanto as jovens contam orgulhosamente suas experiências. Anne às vezes se perde na escuta. Já as garotas, Alicja (Joanna Kulig) e Charlotte (Anaïs Demoustier), contam despreocupadamente e com detalhes seus encontros.
Capaz de absorver os detalhes das entrevistas levando a aspectos de sua rotina, relação com o marido, filhos e o trabalho, Anne se apropria dos discursos percebendo-se atada a frustração pessoal, algo que ela não via, ou pelo menos não queria ver. Sua compreensão arrasta-se até um jantar em que ela mesma prepara numa noite a fim de recepcionar o chefe do marido. Essa construção é banhada de metáforas e referências por vezes libidinosas, constatando sua nova condição consciente. A diretora polonesa Malgorzata Szumowska não emprega moral em seu longa e leva as prostitutas a outro âmbito em cena, diferindo do comum retratado onde usam personagens provenientes da miséria e encontrando solução na prostituição. Elas não são vítimas de um contexto. Aqui, acontece por vontade. Faz lembrar as memórias de Mãe, filha, avó e puta quando tece uma crítica a condição da mulher e relata, em defesa das prostitutas, que o mundo não é feito de vítimas e que tudo é negociável, inclusive o sexo.
A temática não é nova e nunca sai de moda. Steven Soderbergh trabalhou com a ex-atriz pornô Sasha Grey em Confissões de uma Garota de Programa (The Girlfriend Experience, 2009) trazendo parecidamente o glamour hipócrita de uma pessoa que vive duas vidas, embora a verdade seja, por vezes, compartilhada. Incontáveis filmes são lembrados quando se trata o assunto, sobretudo na oferta de estabilidade, finalidade sedutora posta nos diálogos. Esses que no filme soam frouxos e vagos, comprometendo o resultado final. Sua limitação pouco envolve, mas instiga reflexão levantando dúvidas a respeito de quando o prazer se esgota. Vale fazer menção a A Bela da Tarde (Belle de Jour, 1967) de Buñuel, infinitamente superior a esse Elles (idem, 2011).
A complexidade que se supunha é passageira. O filme passa, se delonga e se esvai, deixando poucas questões a tratar. As histórias contadas pelas duas entrevistadas são boas, breves e concisas, conciliando cenas sem pudor – e tome perversão com variados clientes – com relatos sinceros de uma vida de luxúria na capital francesa. Em poucas noites dá para arrendar um apartamento em Paris. Sem julgamentos e com um olhar implícito sobre circunstâncias sociais, Elles remete ao jogo de aparências num turbilhão de vaidades, colocando em pontos mulheres bonitas escolhendo um caminho oculto e lidando com a rejeição e levando uma vida comum e voluntariamente feliz. Isso não quer dizer que estimula o espectador a fazer o mesmo, mas dá um tapa na cara de quem se vê superior a elas. Observamos um sorriso no rosto natural nessas mulheres ao contrário de um tímido movimento nos lábios omitindo insatisfação, esses estampados na face da hipocrisia.
6,0
Ainda não vi, mas fiquei altamente curiosa *-*
Assisti e gostei bastante, especialmente da forma como o cotidiano da protagonista e das entrevistas é explorado.