7,5
Alice Riff consegue um salto observacional em seu novo filme. Após seguir caminhos que desconstroem os conceitos de gênero em Meu Corpo é Político, a cineasta desvenda um microcosmos do Brasil em plena organização para as eleições de um grêmio escolar. Todas as articulações para a criação de chapas, escolha de cargos eletivos dentro de cada uma e as campanhas propriamente ditas nos remetem a um processo que precisamos passar de dois em dois anos e que na última ocasião deflagrou um país partido. A estreia de Eleições nesse momento então, passa a ter um sentido de urgência e necessidade duplicados, com seu conteúdo impressionante.
O trabalho de Alice fica ainda mais claro a partir desse novo longa, uma radiografia do comportamento dos corpos em sociedade. Da naturalização dos movimentos e da interpretação de cada um deles em seu contexto social, ao observar cada lugar de adequação ali, e de como alguns ali tratam de se reinventar, e mesmo os que vestem as carapuças estipuladas. A observação desse contexto dos que interpretam (ou reinterpretam) seus papéis em cada movimento é das coisas mais interessantes do projeto de cinema que a diretora tem pra si: observar os lugares onde cada um se encaixa ou não, e se mover para a direção que cada lhe convém e cabe. As decisões individuais de cada um sendo responsáveis pela ordem de seus corpos em movimento.
O palco em que se transforma a Escola Estadual Alarico Silveira, localizada no bairro da Barra Funda em São Paulo, não fica nada a dever ao que vimos no segundo semestre do ano passado, e um dos méritos de Alice foi perceber esse potencial prestes a acontecer (o filme foi rodado há um ano) e enfatizar os paralelos com a sociedade, com um grupo de LGBTQs de inúmeras ordens, um de feministas consciente e atuante até previamente à campanha, um de meninos largados provavelmente aquele grupo do 'fundão' da classe mais interessado em zoar provavelmente, e o grupo tido como favorito de meninos CDFs e aparentemente certinhos, que produzirão uma faceta ao mesmo tempo surpreendente e totalmente comum ao nosso tempo.
A montagem de Yuri Amaral é um acerto em organizar todo o manancial de eventos em camadas que tanto definem a dramaturgia particular do projeto quanto esse espelho político-partidário com nossos eventos eleitorais, e o próprio roteiro escrito por Alice em parceria com Vanessa Fort consegue unir as pontas encontradas no próprio espaço acadêmico para transformá-las em potência narrativa. Uma espécie de reviravolta final é organizada para ter esse efeito e revelar o movimento real de junção dos meandros políticos à nossa vida, desde muito cedo; uma espécie de prova incontestável de que não há como fugir de política, porque toda vida é intoxicada dela até quando não se imagina.
Não faltam nesse palco a mídia especializada local representada por uma dupla de aspirantes a 'youtubers', o público presente aos debates com suas perguntas relevantes e necessárias à reflexão, o próprio circo criado pelas chapas/partidos com suas campanhas em diferentes propostas e qualidades, além do poder superior na esfera política do filme representada pelo corpo docente - que, tal qual no campo do Estado, tem atitudes no mínimo polêmicas - e o país se mostra na frente da tela por 1 h e 40, tão ricamente apresentado em suas contradições e problematizações, um programa para todas as idades e faixas etárias, um filme político completo, com um final que todos nós gostaríamos de ter presenciado nas eleições passadas, ou em todas as vindouras.
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