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Críticas

Cineplayers

Quando cinebiografias viram fotocópia.

5,0
Cinebiografias, em um primeiro momento, pretendem mostrar a importância e a vida pessoal de um indivíduo único para cultura popular. Ao menos em tese. O que se vê, em prática, é uma “mononarrativa” que condensa muitas vidas em um enlatado previsível. Dramão europeu com alvará artístico, Egon Schiele - Morte e Donzela segue todo o enredo típico: o artista incompreendido e inovador cheio de problemas pessoais e cuja vida excessiva acaba interferindo em sua arte. 

Discípulo de Gustav Klimt, Egon Schiele faleceu aos 28 anos após perder a esposa para a Gripe Espanhola. No caminho, foi um nome escandaloso do movimento expressionista de Viena. Desafiou a arte que considerava conservadora demais à sua época e consagrou-se e também despertou ódio ao dedicar-se à pintura erótica. No ponto mais baixo de sua vida, foi julgado e condenado por ter seduzido uma menor a posar para seus trabalhos.

Em outras mãos mais imaginativas, há de se imaginar o que a vida de Egon Schiele poderia servir como ponto de partida nesses tempos em que se discute separação entre arte e artista, ética na arte, transgressão e questionamento, enfim. Do jeito que saiu, é mais a trágica história romântica entre o típico artista ou gênio temperamental e sua musa inspiradora, no caso, Wally Neuzil, que foi o grande amor da sua vida e modelo para o seu quadro mais famoso, Morte e a Donzela. Como é típico nesse estilo de filme, obviamente que sua paixão sem limites pela arte interfere na vida dos outros. Quando ela está longe, o filme perde qualquer interesse que já tinha, já que outras mulheres na vida de Schiele carecem de qualquer tridimensionalidade. Já com ela, a mistura de erotismo e dramão água-com-açúcar alterna entre o suportável e o irritante.

Enlatado como é, qualquer transgressão que o artista representa para o bem ou para o mal se perde em um filme absolutamente sem grandes atrativos. Muito por conta de ser observado a partir do ponto de vista da irmã Gerti, com sua dose de atração, repulsa e dedicação pela vida do irmão, com uma relação conflituosa e afetiva e uma intimidade pouco habitual. Após esse flagrante para o espectador sem maiores consequências, logo veremos como os dois irmãos irão se afastar e aproximar ao longo da vida, com a primeira cena dos dois sendo pouco comentada após isso. Então Schiele parece ser só o excêntrico da vez - com uma vida rigorosamente igual a dos outros cuja máxima é “arte é bom, mas prefiro passar vexame”. 

Tudo que é esquisito e escandaloso logo toma ares de conto moral, como acontece em em boa parte das biografias, e é isso. Ray, O Jogo da Imitação, Egon Schiele - A Morte e a Donzela, tudo excessivamente igual, sobre pessoas muito diferentes, em diferentes períodos do tempo, nos Estados Unidos dos anos 50, na Viena do início do século 20, na Segunda Guerra Mundial, no auge do Expressionismo - a máquina da indústria cinebiográfica torna tudo uma maçaroca indistinguível. 

Às vezes, como acontece aqui e Lou, sobre Lou Andreas-Salomé, esses filmes evocam um artista europeu e abusa das locações e abordagem menos puritana para conseguir um alvará de arte superior, mais inteligente que o típico filme de tubarões e/ou explosões que vemos aqui e acolá. Mas a pobreza pouco imaginativa, a abordagem burocrática de um nome tão desvairado, torna Egon Schiele - A Morte e a Donzela um filme sumariamente esquecível.

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