A união entre Pokémon e cinema não é novidade nenhuma. Desde que você precisou fazer sua primeira escolha mais importante da sua vida entre azul e vermelho em um tijolo cinza com tela verde e preta, alguns animes foram criados e vários filmes invadiram as telas de cinema cobrindo as mais diversas gerações dos monstrinhos da Nintendo. Pouco mais de vinte anos depois, chegou a hora desses monstrinhos saírem da pokébola e andarem ao lado de humanos em um mundo real, mas bem fantasioso, em Detetive Pikachu (Pokémon: Detetive Pikachu, 2019).
A real é que filmes baseados em games enfrentam grande preconceito, principalmente pela baixa qualidade geral e pelo não entendimento dos artistas que os produzem de que jogo é jogo, mas filme é filme; é um outro tipo de entretenimento, com abordagem diferente e uma duração de desenvolvimento muito menor (tirando jogos indies, dificilmente um jogo tem a duração de um filme). Rob Letterman, o diretor, parece entender bem isso e usa toda a sua experiência em trabalhos infantis (Monstros vs. Alienígenas, Goosebumps - Monstros e Arrepios) para recriar Pokémon cortando o cordão umbilical daquilo que fez o jogo um sucesso, mas sem perder sua essência.
A própria franquia Pokémon teve spin offs, jogos sem ser da sua série principal, muito diferentes de seu jogo core, como por exemplo Pokémon Stadium e Snap, e Detetive Pikachu parece seguir esse mesmo caminho criativo por, 1. tirar a busca pelo crescimento na aventura e colocar uma investigação simples como headline de sua narrativa; 2. pela primeira vez ambientar os monstrinhos em um ‘mundo real’ e tagarelar o sempre simpático Pikachu, que agora com a personalidade de Ryan Reynolds (Deadpool, né?) está muito mais sarcástico e cool, dialogando bem com essa nova onda de jovens dos anos 2010; um público alvo bem diferente daqueles que foram conquistados nos anos 90 e que, provavelmente irão levar seus filhos ao cinema para ver este filme.
Tim Goodman (Justice Smith, de Jurassic World: Reino Ameaçado e Cidades de Papel) é um jovem do interior que não lida muito bem com a ideia de conviver com Pokémon. Trabalha em uma seguradora até receber a notícia do falecimento de seu pai, que é quando ele precisa ir à cidade grande para descobrir o que houve. Durante essa jornada ele acaba enfrentando fantasmas do seu passado, sombrio para esse tipo de filme, e, claro, desenvolvendo uma relação de amizade com Pikachu, seu novo melhor amigo, e com pessoas bacanas que cruzam o seu caminho.
Apesar desse passado pesado, a história em geral é bem levinha e não há nada de muito complexo para se acompanhar; apesar da modernização no estilo, ainda é um filme infantil em essência e nada contra isso, apenas não espere mais do que o filme oferece. As reviravoltas são previsíveis, a emoção é básica - há uma relação um pouco mais próxima entre Tim e uma repórter estagiária da cidade -, mas tudo isso é envolto com situações que funcionam, com Pokémons que têm sinergia com aquele universo, jamais soando estranhos ou ficando destacados em CGI, e que mantém a essência leve e descompromissada que tanto o jogo quanto o anime sempre tiveram.
Algo que chama muito a atenção é a ambientação, que lembra clássicos de aventura infantis dos anos 80 / 90, com muito neon, luzes, becos esfumaçados e uma grande empresa com interesses maiores por trás de tudo isso. É um filme visualmente espetacular, qualidade padrão Nintendo que não tenta reinventar a roda na caracterização dos monstrinhos (oi, Sonic), são todos exatamente da maneira que conhecemos, mas com pequenas adaptações na cor e no traço para parecerem reais daquele universo, funcionando de maneira eficientemente orgânica. Há uma série de fan services rápidos, com destaque pessoal para as aparições da Jigglypuff e o Snorlax. Se você mantém aquele humor pueril dentro de você, espere boas risadas.
No final, Detetive Pokémon é exatamente isso: um trato no visual, mas que mantém o espírito de sempre para uma nova leva de jovens que estão conhecendo agora a franquia ou exercitando a nostalgia. É um filme divertido, inocente, com um universo grande e cheio de possibilidades, com personagens conhecidos que vão popular cenários gigantescos e com um pitaco de ação aqui ou ali. Algumas coisas ficaram de fora - não fiquei satisfeito em uma equipe aparecer apenas como R -, mas não dá para queimar todos os cartuchos em um filme só, né? Considerando o material baseado em games disponível, Detetive Pikachu se destaca ao lado de nomes como Mortal Kombat e Silent Hill. Ainda falta um grande filme de verdade, mas essa trindade até agora é o que há de melhor no gênero.
Legal! Vou conferir esse quando estrear!
Também não sou fã da franquia ou anime, mas cinema de qualidade é bem vindo. Não esperava nada, mas parece ser legal. Vou conferir assim que possível!
"entre azul e vermelho em um tijolo cinza com tela verde e preta", o que isso quer dizer?
Ele está se referindo à escolha entre as versões "Red" e "Blue" para jogar no GameBoy (que realmente parecia um tijolo cinza).