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Control

(Control, 2007)
7,9
Média
130 votos
?
Sua nota

Críticas

Cineplayers

Caminhe em silêncio

8,0

“Existência. Bom, o que isso importa?”, questiona Ian Curtis a partir de uma narração em Off enquanto aparece sentado escorado em uma cama, com a luz do dia iluminando o quarto: seu refúgio. Caminhando em meio à paisagem urbana de Manchester, Inglaterra, fotografada num soturno preto-e-branco, está Ian, aquele que será vocalista da cultuada banda Joy Division. Seu caminhar silencioso revela a mente barulhenta a partir de uma poesia visual metaforicamente construída. Nada parece existir fora de sua mente. Dirigida por Anton Corbijn e escrita por Matt Greenhalgh, esta é uma cinebiografia baseada na autobiografia de Deborah Curtis, esposa do rockeiro.

Lou Reed. David Bowie. Sex Pistols. Iggy Pop. Todas referências musicais sempre presentes no universo de Ian. É nesse contexto, durante um show, que se relaciona com Deborah, aquela que será sua esposa. O amor poderá destruir? O romance é impulsivo – como quase tudo na vida do artista – e carregado de emotiva paixão num colapso de sentimentos desenvoltos com aflição, algo que predomina e domina a angustiada narrativa. “Vamos isto! Vamos aquilo!”; Debbie apenas consente, demonstrando em poucos diálogos como fora seu relacionamento, concordando com as decisões prematuras de seu cônjuge.

Nesse meio de encontros, a rápida formação da banda. De Warsaw – nome anterior – à icônica Joy Division. O primeiro show. Do rádio à transmissão ao vivo. O ritmo das conquistas dão o tom e Ian, pouco a pouco, se transforma na referência lembrada até hoje. O lúgubre preto-e-branco do fotógrafo Martin Ruhe é climático e tem função importante de criar sensação de opressão, de irrefutável melancolia, ofertando ao espectador a constante sensibilidade de seu enigmático protagonista nos distintos tons de cinza que evoca em cada quadro. A obra busca o tempo inteiro transmitir tal impressão.

As turnês iniciam. Frenesi. Arrependimentos. O culto e os encantos. Casos. Confusão. Ilusão. Ódio próprio.

Não há maniqueísmo, algo que possa fornecer outro paradigma à existência de Ian, justificando qualquer atitude ou escolha. Trata-se dele, de suas impulsões e pulsões, de suas alternativas e decisões; de sua confusão pessoal. O roteiro abarca bem seu comportamento, funcionando como algo que não visa reverenciá-lo ou idolatrá-lo, mas explorá-lo psicologicamente, propondo uma anamnese que reporte sua personalidade contraditória e destrutiva. Também não é nenhum estudo psicológico, já que toda a complexidade é mostrada e jamais analisada. O realizador é esperto ao se esquivar de tal composição.

O diretor Anton Corbijn, fotógrafo neerlandês que criou trabalhos expressivos, tal como a capa do CD The Joshua Tree, do U2, parece querer representar Ian Curtis como num tributo, contar sua história intimamente, revelando ao mundo a figura estranha, desequilibrada e brilhante que o vocalista foi. Além da adaptação da autobiografia de Deborah Curtis, o próprio Corbijn tem muito a dizer, uma vez que acompanhou parte da turnê do Joy Division, o que o torna mais do que um admirador, alguém que vivenciou parte do sucesso junto aos garotos conhecendo de perto os bastidores.

Distintas cenas diagnosticam frustrações apesar da ascensão, tal como a responsabilidade de pai e marido que parece não fazer sentido diante ao repentino estrelato. Tudo aconteceu cedo demais. Ian está aprisionado como sempre se sentira, mesmo quando se liberta do passado; ou quando exigido no palco; quando descobre uma paixão; ou quando parece não conseguir se encantar pela filha que gerou. O diretor é bastante hábil ao revelar isto em distintas cenas sem pesar no sentimentalismo e ainda constrói passagens simbólicas, como aquela em que Ian está sentado ao lado da jornalista Annik Honoré, propondo uma barreira visual. A aliança na mão do cantor brilha entre os dois durante uma conversa. Martin Ruhe se apropria do estilo autoral do diretor na composição das imagens.

E tantas cenas funcionam graças aos seus artistas. Samantha Morton oferece uma atuação justa a Deborah Curtis, acompanhando o sofrimento do marido e garantindo sua presença física numa espiral de desencantos. Já Sam Riley, grande aposta à época, dá dignidade a Ian Curtis evocando a personalidade arredia, solitária e triste, seja na maneira de andar, no timbre da voz, no comportamento em shows e na dança delirante. Os trejeitos absorvidos não decepcionam os fãs do cantor. Tudo culmina na ruminante doença e na dificuldade de controle.

Ela perdeu o controle.

Atmosférico, Control é uma boa cinebiografia que consegue apresentar satisfatoriamente parte da vida de Ian Curtis, sua poética e suas miragens. No início do filme, a partir de uma narração em Off, Ian diz: “Existência. Bom, o que isso importa? Eu existo da melhor forma que posso. O passado agora faz parte do meu futuro. O presente está muito fora de controle.”

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