Exibido na Mostra em São Paulo no ano passado, Cine Holliúdy conseguiu divertir toda uma plateia de uma sala de cinema com seu humor inofensivo e regional, trazendo a simplicidade do cativante povo nordestino e um pouco de suas singularidades. Um pedacinho do Ceará fora contrastado nas telonas paulistas, carregando, entre outras coisas, os curtos passos da arte cinematográfica no estado lá nos anos 70, através de um personagem que desejava manter uma sala aberta, porém precisava passar por cima de burocracia e de interesses, e principalmente concorrer contra a chegada dos aparelhos de televisão. Representar a arte do movimento era a ambição de Francisgleydisson, compartilhando com seu filho e esposa o desejo de levar o entretenimento para esse povo e finalmente garantir uma boa vida.
Há quem possa considerá-lo uma paródia do povo de um estado acostumado ao humor. São vários os humoristas reconhecidos nacionalmente oriundos do Ceará. Chico Anysio talvez seja o mais significativo. Não deixa de ser uma espécie de paródia, posto que trabalha a cultura e garante a presença de vários ícones da comédia popular local. Também há suscetibilidade demais na fita, há uma delicadeza entusiasta por trás de cada ato, todos bem construídos com paletas de cores quentes, explicitando o clima da narração, sempre descontraída e abarrotada de artifícios culturais. A montagem falha em conectar relações de cenas, parece feita apressadamente, todavia não compromete o bom ritmo e fundamento da obra.
O diretor e roteirista Halder Gomes banca um projeto humilde, sem maiores pretensões a não ser a diversão e a homenagem ao papel do cinema através da história. É inevitável em vários atos não se recordar da obra prima italiana Cinema Paradiso (Nuovo Cinema Paradiso, 1988), seja pelas crianças com os olhos vidrados assistindo encantadas uma ficção num telão; ou a relação que um grupo social diferente tem com o espaço/tempo apresentados na sala escura; ou pela própria paixão semeada pela lembrança, com o encantamento por histórias absurdas as quais o filho de Francisgleydisson o ouve contar.
Essa narração concebida para homenagear o cinema e o povo do Ceará ainda faz alusão a contemporaneidade com as condições dos cinemas e locadoras que tem a difícil missão de se manterem em tempos de pirataria. Semelhante a mencionada condição, Francisgleydisson mantém seu Cine Holiúdy aos trancos e barrancos, motivado a dar o melhor a sua família com o trabalho residindo sobre sua crença no espetáculo cinematográfico, projetando filmes de artes marciais que tanto lhe influenciaram.
Foi graças ao curta Cine Holiúdy - O Astista Contra o Cabra do Mal (idem, 2004), realizado pelo próprio Halder Gomes, que esta obra surgiu. É natural questionar o valor do filme em outras localidades, já que algumas piadas – originadas de expressões populares locais – podem não fazer sentido para alguns públicos. Nas cópias lançadas em outros estados, legendas facilitarão a compreensão. Taí um cuidado interessante para a propagação comercial do longa, potencialmente capaz de angariar fãs por todo lugar.
A conclusão tem relativo êxito enquanto inferência histórica através do apontamento temporal. A década de 70 está contextualizada, as novidades atrasadas se formando em solo carente, chegando revolucionando localidades marginalizadas. Esse meio vem temperado com a graça de uma população em particular, das dicções, do vocabulário próprio, dos estereótipos utilizados a favor da trama leve. Seguimos os anseios desta gente calorosa e batalhadora que não mede esforços em prol da conquista e do bem familiar.
Francisgleydisson, representado por Edmilson Filho, traduz sem exageros o povo nordestino, especialmente o cearense, movidos e motivados por paixões. Da terra em que o humor se exalta, provém um dos exemplares cômicos mais relevantes de nosso rico cinema que se expande pelos vários brasis.
Visto na 37º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
To louco pra ver esse. Chega logo aqui em SP!
Dei sorte em vê-lo durante a Mostra em São Paulo, pois é um filme que demoraria muuuito para chegar até aqui. Belo filme. Que tua terra nos presenteie com outras belezas dessa, Paulo. 😁
Há, eu acho que fui um dos primeiros a prestar atenção a esse filme, vi o trailer quando tinha menos de 1000 visualizações do youtube, humor conterrâneo, cotidiano, simplista e acima de tudo sincero, comecei a acompanhar as singelas propagandas que foram feitas quase que exclusivamente por meio de uma fanpafe no facebook, longe dos estardalhaços das divulgações dos filminhos da Globofilmes, esse aqui foi se destacando, aqui no nordeste em algumas salas trailer dele foi colocado antes de "Minha Mãe é uma Peça" e o publico ria mais com ele do que com o filme inteiro.
Tenho certeza que esse vai virar um clássico por aqui, assim como "O auto da Compadecida" que metade dos meus amigos tem dezenas de falas decoradas, pela inúmeras vezes que o assistiram.
Confesso que não li a critica por não ter o costume de faze-lo antes de ver o filme, e como já marquei minha sessão pra essa semana, lerei com certeza assim que sair dela, mas só o fato de a vê-la aqui me deixa bastante entusiasmado.
Valeu, Lucas e Marcelo. Tenho orgulho de ter entrevistado o diretor, o que ajudou muito na minha percepção externa sobre o filme. Segundo a Downtown Filmes, ele tem previsão de chegar agora em setembro nos cinemas do Sul-Sudeste.