O filme Cidade dos Homens começou a ser produzido um ano após o fim da série, de mesmo nome, da Rede Globo. Espécie de continuação da obra-prima Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, na tevê o seriado fez grande sucesso, sendo visto, em média, por mais de 22 milhões de espectadores a cada semana. Entre 2002 e 2005, foram ao ar 19 episódios de Cidade dos Homens. Neles, Laranjinha (Darlan Cunha) chegou perto de entrar para o crime, enquanto seu melhor amigo, Acerola (Douglas Silva), perdeu a virgindade e engravidou a namorada. Apareciam na série, também, personagens que podem ser vistos no filme, como Madrugadão, ex-soldado que passou a comandar o tráfico em uma favela carioca, e Nefasto, ajudante de Madrugadão que começou a relutar em aceitar ordens. A boa notícia para quem nunca teve contato com a série global é que para um completo entendimento do longa não há necessidade de conhecer o que se passava na telinha.

O filme é dirigido por Paulo Morelli, que dirigiu também alguns episódios da série. O cineasta Cao Hamburguer, do ótimo O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, é outro que esteve à frente de alguns capítulos. Na telona, são mostrados os desafios dos dois amigos quando eles completam 18 anos de idade. Acerola tem um filho de dois anos, e tem que enfrentar as dificuldades de ter sido pai tão cedo. Já Laranjinha resolve partir em busca de seu pai, mas para isso terá de remexer em seu passado. Enquanto os dois jovens tentam realizar seus anseios, uma guerra explode no mundo do tráfico. Madrugadão, chefe do tráfico, perde o comando do morro para Nesfasto. Com o caos instalado na favela, os dois garotos terão de abandonar a rotina e se adaptar a vida em lugares diferentes. 

Se há um mérito incontestável neste Cidade dos Homens, é o fato de a produção fugir de um erro comum do cinema brasileiro: o formato televisivo. O filme de Morelli tem cara de cinema. O diretor, apesar de sua boa direção, inventou demais no posicionamento e cortes de câmera no início do filme. Depois de percorrido um tempo, Morelli passa a enquadrar melhor seus planos. Devido ao clima sempre pulsante da vida na favela, o cineasta optou por rodar as cenas com a câmera na mão, mantendo o estilo adotado por Meirelles em Cidade de Deus. O roteiro, escrito por Elena Soárez (roteirista de Casa de Areia), é bem amarrado e aproveita de forma inteligente passagens da televisão – tanto de Cidade dos Homens como de Palace II - para mostrar Acerola e Laranjinha aos 11, 13, 14, 15 e 16 anos. A edição de Daniel Rezende, que editou o filme de Meirelles em um trabalho que lhe rendeu uma indicação ao Oscar, é novamente competente.

Cidade dos Homens é um filme que cresce e melhora com o passar do tempo. O início não é dos mais interessantes, o diálogo dos amigos na praia, por exemplo, soa artificial. Mas, depois, o ritmo melhora, e a história entretém com a busca de Laranjinha ao pai, e com o enredo sobre paternidade e amizade. Darlan Cunha e Douglas Silva são grandes atores, e Morelli foi esperto ao se insipirar em Meirelles para dirigi-los. Os atores não seguiram ao pé da letra o que estava escrito no roteito, eles reconstruíram as falas para que elas ficassem mais próximas da realidade.

O resultado final de Cidade dos Homens é positivo. O filme chega aos cinemas cercado de expectativas, já que pode vir a ser a obra escolhida para representar o Brasil na tentativa de arrancar uma indicação ao Oscar. Porém, entre os longas nacionais, elegíveis ao prêmio da Academia, o melhor, ainda é, O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias.