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Críticas

Cineplayers

Documentário deveras corajoso e de grande força discursiva em meio a realidade tecnológica do século XXI.

8,0
Aos que possuem consciência do mundo em que vivem nos últimos anos, foi um choque, mas também um evento de certa forma esperado, quando Edward Snowden revelou ao mundo uma pilha de arquivos secretos do sistema de vigilância dos EUA, que apontavam a violação da privacidade de todo e qualquer indivíduo do planeta pela monitoração de toda e qualquer forma de comunicação: celulares, facebook, instagram, twiiter... A barreira ética entre o que é pessoal e o que é de interesse público havia sido violada, e o desmascaramento de Snowden tomou de assalto todos aqueles (e neste caso, acredito que sejamos todos nós) que sequer imaginavam o constante monitoramento de suas linhas de comunicação.

Fato é que, com o avanço cada vez mais ligeiro da tecnologia, não são apenas as barreiras geográficas que estão sendo derrubadas, mas também a própria questão do que nos é permitido exibir e/ou esconder também tem ganhado cada vez mais força. Há quem diga que no momento em que começamos a interagir em meio a alguma rede social, somos nós permitindo que um pedacinho de nosso cotidiano, de nosso dia-a-dia, seja exposto para o mundo. A história de Snowden, portanto, chegou para denunciar a assustadora violação desta liberdade de escolha, tendo como justificativa a cultura do medo que passou a dominar os EUA após o fatídico 11 de Setembro.

Por sinal, não é a primeira vez que a diretora Laura Poitras aborda alguma das conseqüências do ataque às Torres Gêmeas, finalizando Citizenfour como o fechamento de uma trilogia que retrata o estado de paranoia do povo americano (e de outros) após o atentado cometido por Osama Bin Laden. Citizenfour ganha ainda mais força e importância ao assumir um tom de urgência global, o que lhe confere um poder de discussão ainda maior. O documentário tem início com o primeiro contato entre Poitras e Snowden, que inicialmente se identifica pela alcunha de Citizenfour, e que afirma possuir documentos que comprovavam que as agências dos EUA estariam recolhendo diversos dados pessoais da população. Acompanhamos todo o processo de elaboração sobre como a informação seria levada ao público, tendo como representante da mídia o jornalista Gleen Greenwald, do The Guardian, o que levou a perseguição do próprio, inclusive levando ao famosamente detido namorado de Greenwald num aeroporto de Londres. Greenwald, inclusive, escolhe o Brasil como local de base, levando-o até a prestar depoimento no Congresso Nacional.

Citizenfour fascina e intriga justamente pela paciência detalhada com que Poitras nos mostra os bastidores desta completa violação de privacidade, o que a leva a exibir longas entrevistas com Snowden e diversas passagens com narração em off, o que certamente deverá incomodar o público menos paciente. Mas somos recompensados com o pano que Poitras passa em nossos olhos para nos permitir enxergar e ter conhecimento do que realmente foi o acontecido, evitando discursos pessoais e permitindo que os fatos falem por si só. Não há nenhum arroubo criativo em termos de filmagem ou narrativa, mas é uma obra de grande valor histórico, poderosa o suficiente para manter as discussões sobre privacidade em alta ainda por um bom tempo. Vemos além da figura reclusa de Snowden, e com isso nos deparamos com reflexões deveras pertinentes em meio a nossa realidade.

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