O diretor norueguês Hans Petter Moland vem construindo uma carreira chamativa fora do seu país ao redor de festivais europeus, principalmente Berlim. Com uma parceria de 25 anos com Stellan Skarsgård, ambos se projetam mutuamente desde Zero Kelvin até o belo drama policial O Cidadão do Ano, seu último encontro antes desse nova produção, vencedora do prêmio de contribuição técnica para a fotografia no festival de cinema alemão em 2019, e pela primeira vez essa parceria sai arranhada.
A obra original de Per Petterson não foi condensada a contento, e o roteiro (do próprio Moland) é o grande problema do longa, no qual sobram elementos não explorados pelo filme, apenas colocados em perspectiva sem desenvolvimento. Uma trama que nem chega a ser complexa ou intrincada, mas tratada de forma truncada pela adaptação, perdeu não apenas seu impacto, mas também seu interesse. Com inúmeras idas e vindas num tempo que nem é o atual (o presente do filme é, inexplicavelmente, 1999), e que ocupa a duração da projeção de maneira desordenada, com personagens que não mudam de roupa durante quase sua totalidade sem um motivo lógico, já que "o tempo passa" no passado. Saltos absurdos na cronologia e momentos absolutamente dispensáveis ganham destaque desnecessário, e tudo parece refém de uma dramaturgia demasiadamente novelesca e datada.
A fotografia premiada da dupla Thomas Hardmeier e Rasmus Videbæk (responsáveis por, entre outros, Na Próxima, Acerto no Coração e O Amante da Rainha) é, digamos, chamativa, porém também ela contribui para os inúmeros problemas do filme, porque cria uma extravagância etérea para um projeto que é quadrado, com uma trama não apenas antiquada, como também repleta de clichês que não conseguem ser disfarçados por esse trabalho técnico diferenciado. Principalmente porque a montagem do filme prejudica até a fruição desse trabalho fotográfico, que carece de continuidade. Já a banda sonora, embora tenha momentos superlativos, se transforma no destaque real da produção, tanto em trilha quanto na captação e edição do som.
Sem um destaque efetivo do elenco, todos parecem obedecer a uma norma de destacar exclusivamente o trabalho do diretor, que parecia querer elevar seu olhar ligado ao gênero policial, do qual sempre esteve em posição de dar verniz a projetos que poderiam ser até mais simples; porém, Moland traça um charme especial em seus projetos que não foi assimilado aqui, um projeto mais clássico no qual ele quis brincar com a edição, com resultados opostos aos de seus longas anteriores, talvez porque esse tipo de narrativa não peça a agilidade que ele tenta imprimir em meio à contemplação típica desse novo gênero. O resultado foi positivo para ele — o filme é o grande vencedor do Oscar norueguês, saiu premiado de Berlim e é o candidato do país ao Oscar oficial.
Esses resultados não encontram respaldo no material apresentado: um filme indeciso, inconclusivo e ao mesmo tempo com duração extrema e despropositada, que parece querer emular inúmeras escolas de cinema diferentes e com isso fica a dever em personalidade, parecendo um pastiche de tantos gêneros e linguagens, utilizados aqui somente para criar uma falsa imagem qualitativa que não consegue parecer minimamente orgânica.
Crítica da cobertura da 43ª Mostra de São Paulo
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