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Críticas

Cineplayers

O primeiro filme falado da história pode não ser o melhor, mas é uma belíssima curiosidade para os amantes do cinema.

7,0

Talvez, se os irmãos Warner não tivessem apostado suas últimas fichas em O Cantor de Jazz, o primeiro filme da história a utilizar o invento do som no cinema, ficássemos sem alguns dos grandes clássicos da história. Isso porque este foi o filme que salvou a Warner Bros. da falência, em 1927, graças a inovação que trouxe às telas. As pessoas adoram novidades. O filme foi um estouro e, se não ajudou a firmar o advento da nova técnica, pelo menos foi o pioneiro, quem deu o primeiro importante passo para sua consolidação nos anos a seguir.

Isso porque alguns importantes cineastas, como Chaplin ou Eisenstein, posicionaram-se contra a implementação do som, com medo de que ele apenas deixasse tudo mais relaxado. O russo, inclusive, chegou a escrever um "Manifesto do Som", em que dizia que o som não deveria ser usado para a ambigüidade da imagem, e sim que ele deveria trazer algo novo à construção das seqüências. Ele queria dizer que o som não deveria reproduzir exatamente aquilo que a imagem estava mostrando, como por exemplo a imagem de uma arma disparando e o seu som; e sim que o recurso deveria ser utilizado para expandir os limites que ela possuía, não ser redundante.

Com o tempo, aprendemos que o som aumentou os limites do filme dos quatro cantos da tela, pois, graças a ele, temos a possibilidade de saber algo que está acontecendo fora das quatro linhas que determinam a imagem. Se há um grito, um tiro ou qualquer outro efeito sonoro óbvio fora da imagem, e o personagem reage a ele, sabemos o que está acontecendo. Isso expandiu o espaço. Não seria mais necessário colocar a imagem de uma arma disparando, cortar para um personagem reagindo a ela e assim por diante. Agora, através apenas da imagem de uma pessoa se retorcendo, somado ao ruído anterior de tiro, saberíamos que ela havia sido baleada.

O Cantor de Jazz ainda não utilizava desses complexos - e hoje comuns - efeitos do som. Ele aposta no básico do básico para trazer uma novidade e assim dar o primeiro passo à um novo mundo. O som é totalmente redundante a imagem, mas ele traz algo mais: a magia das músicas. Um espetáculo da Broadway, por exemplo, poderia ser quase perfeitamente transposto para a tela (ainda não tínhamos cores). E aí está o ponto forte de O Cantor de Jazz: mesmo sendo o primeiro filme falado da história, sabe usar muito bem, a seu favor, as sensações que belas canções do gênero podem trazer a um filme.

Ele conta a história de uma tradicional família de cantores religiosos que têm um filho que não está seguindo os mesmos passos das cinco gerações anteriores. O seu sonho é se tornar um grande cantor de jazz, algo que choca o seu pai. Expulso de casa, ele depende apenas de seu talento para subir na vida. É a já contada e recontada história feijão com arroz do preconceito, da quebra de estigmas e todas as conseqüências que tem de sofrer quem o faz.

Apesar de ser o primeiro filme falado, não ache que tem a estética de produções de alguns filmes de 30, 40, quando o som já estava dominando a área. Toda sua estrutura básica vem dos filmes mudos, inclusive com os tradicionais letreiros de diálogos. Há apenas um único diálogo entre os personagens durante todo o filme, o que é assustador, devido sua sincronia e verossimilhança - lembrando que o som direto só chegou ao cinema nos anos 50, 60.

Há uma frase, que se tornou marca do filme, dita entre uma canção e outra. É, sem dúvida, a melhor cena do filme. O personagem de Al Jolson vira para a tela e, com convicção, diz: "acalmem-se, vocês não viram nada ainda", logo após uma das primeiras seqüências musicais do longa. Aliás, é em suas costas que o filme inteiro está. Ele convence não apenas nas seqüências mudas, pois é um ator absurdamente expressivo - a cena que ele chora quando está pintado de negro é incrivelmente sensível. Mas o seu carisma na hora do espetáculo é tão grande que fica difícil não se contagiar e reagir à música que está sendo cantada.

Se hoje em dia já não é a obra-prima que fora na época, pelo menos é uma 'curiosidade obrigatória' para os amantes do cinema. Para quem não tem saco para assistir um filme mudo com leves traços de canções, fica a dica para tentar achar o longa sutilmente adicionado ao último filme de Martin Scorsese, O Aviador. Ele faz sua pontinha, uma pequena participação na história do magnata da aviação. Se o cinema há muitos anos já transmitia suas mensagens, com a chegada de O Cantor de Jazz ele ganhou um leque enorme de outras opções. Agora ele podia falar, cantar, gritar, sussurrar...

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