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Cadê Edson?

(Cadê Edson?, 2019)
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Sua nota

Críticas

Cineplayers

A força por trás do homem

7,5

Se Tiradentes é prodigioso em alimentar o cinema de fluxo como um todo, de acompanharmos uma narrativa com a cadência particular de seus elementos, é válido também observar o surgimento de propostas na contramão desse movimento, sem perder em relevância. O filme de Dácia Ibiapina simplesmente não nos dá tempo de recuperar o fôlego em seus enxutos 70 minutos, um caleidoscópio de imagens e eventos que condensam com precisão quase 10 anos na História recente, até culminar no episódio que abre o filme, sendo exatamente seu clímax deslocado no tempo da montagem, que de maneira inteligente nos mergulha de cabeça em uma piscina que só veremos inteira ao longo da projeção.

Ao encontrar com o líder de movimentos sociais que batiza o longa, Dácia investiga a princípio ele, abrindo posteriores camadas sobre sua história que, como a de todos, é formada pela constituição de inúmeras outras. E assim vamos conhecendo Edson, através não apenas de sua voz, mas de várias que o completam, de eventos que o representam e das lacunas abertas pela narrativa que o espectador precisa acompanhar e montar; sem parecer didático, Cadê Edson? (2019) responde a pergunta do título encontrando esse homem escondido nas entrelinhas da narrativa, complexificando o homem por trás da luta.

De agilidade rara em documentários nacionais recentes, o filme tem um ritmo vertiginoso imposto pelo fluxo de eventos e pelo jogo estabelecido na montagem, que circula a vida de Edson a partir da sua ligação com o MTST através da retirada dos moradores do Torre Palace, hotel desapropriado do Plano Piloto, em Brasília. Essa ação policial criminosa veste toda a projeção com seus efeitos práticos e imagéticos, situando todo o contexto que fez os personagens chegarem até ali e o rastro de impunidade que segue pós mais um ato de truculência de quem deveria proteger justamente aquela população.

A presença de Dácia imageticamente ainda tem uma potência que raramente é atingida por um cineasta ao se registrar. Numa roda crítica foi mencionado o nome de Agnés Varda para amplificar seu rápido momento na frente das câmeras, e algum paralelo consegue sim ser percebido. Nessa cena curta, o corpo de Dácia não está ali como uma porta grosseira a ser aberta, muito pelo contrário. É o rosto da empatia, do lugar de debruçamento para além do interesse filmico, que se justifica pela postura de apaziguamento entre as pessoas que habitam sua obra. Através desse espaço pequeno, toda sua grandeza se faz presente.

Dácia ainda consegue ressignificar cinematograficamente uma cena gravada de maneira covarde pelas ditas forças de segurança com a chegada dos mesmos ao terraço do prédio do hotel, conferindo tensão e desespero a um episódio crucial pra entendermos mais do que a relação do protagonista com a justiça, mas de toda a luta dos Movimentos de Trabalhadores Sem Terra e sua relação com o poder público, que é muito mais complexa e enredada (inclusive internamente) do que o filme deixa vazar, por debaixo do retrato desse homem.

Crítica da cobertura da 23ª Mostra de Tiradentes

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