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Críticas

Cineplayers

Manchas de sangue e paixão.

7,0

A arte circense disposta no cinema ganhou um exemplar espanhol sem rédeas, atrapalhado e debochado, fazendo alegoricamente menção à ditadura franquista. Estranho em sua composição, os palhaços, enquanto alma do circo, estão no centro dessa tragicômica história de amor abarrotada de referências ao seu oprimido regime fascista. Os palhaços, o triste e o bobo, disputam o coração da estrela do espetáculo, uma acrobata irresistível. Sobre ela se insere ideais românticos, partindo do amor brutal de Sérgio, o palhaço rei do picadeiro, e o obsequioso de Javier, o palhaço triste, novato e perdido em anseios. Trata-se, nesse contexto, e enquanto analogia, de um duelo de representação histórica entre fascistas e republicanos com a Espanha cobiçada por distintos ideais.

A história tem início num circo em Madri no distante ano de 1937 com dois arlequins apresentando um número para crianças. Não demora para o espetáculo ser interrompido. Barulhos, gritos, explosões. A guerra civil está assolando, palhaços são recrutados juntamente a outros profissionais para ingressar no conflito em defesa dos republicanos. Um destes palhaços está armado com uma machete e causa um estrago descomunal com violência explícita e desmedida, indicando o que virá a ser o longa. E revelando o que viria a ser o país. A cor vermelha se destacará na palidez da luta descolorida onde o cinza salienta a frieza em meio a efervescência. Um desses palhaços termina capturado. Seu filho, Javier, almejando seguir os passos tradicionais da família na arte de representar fazendo rir, vê o pai preso e é inspirado a buscar vingança.

Vários anos se passam culminando em 1973, quase no fim do regime franquista que tanto tempo perdurou (1939 a 1976) condenando vidas e sonhos. Javier (Carlos Areces) busca um emprego em circos. Motivado por seu passado, decide assumir a persona do palhaço triste. A trajetória desenvolvida pelo roteiro do diretor Álex De La Iglesia exprime a acuidade grotesca de uma história de vida sem sorrisos, contrariando o papel do humorista, o qual representa sem talento. Uma vez empregado no circo do violento palhaço Sergio (Antonio de la Torre) – um verdadeiro apaixonado pela profissão –, se vê obrigado a seguir a linha austera do patrão, principalmente quando este está alcoolizado.

Mal vemos os espetáculos, mas acompanhamos os bastidores. Dentro desses, a disputa cada vez mais violenta que leva arduamente a consequências inacreditáveis. Um embate grotesco pouco crível fomenta a narrativa que conta sobre um duelo travado com sangue, semelhante a história do país que vivera na ditadura, com povos em conflito nas ruas vislumbrando poder. Entre os palhaços, o desentendimento transcende o picadeiro, se forma pela disputa da linda trapezista Natalia (Carolina Bang) que lascivamente faz acrobacias num tecido ganhando a atenção e desejo de seus espectadores como se fosse uma sereia cantarolando.

Esteticamente o filme é exuberante. A fotografia com paletas escuras prioriza o cinza em várias tonalidades, dando impressão de obscuridade naquele universo triste, frio e oprimido. Cores quentes chamam atenção, especialmente o vermelho que vem representar paixão e sangue, amor e ódio. Extremista em sua aplicação, Álex De La Iglesia se predispõe a eloquência da câmera, acompanhando com fascínio exacerbado a sucessão de eventos. Em alguns momentos tudo se delonga demais, comprometendo a atenção do espectador anestesiado, já que o que está acompanhando está muito longe de qualquer horror convencional. O filme se estrutura, então, sobre a história de um país e tem sua mácula em um de seus símbolos mais significativos, no Valle de los Caídos.  

Os palhaços representados são palhaços em essência: são bizarros, estranhos e desajeitados. Provocam riso pelo excesso de esforço, atraem pelo sadismo da violência sofrida para o outro sorrir. São notoriamente sádicos e dentro desse viés, o exagero explodirá antes da primeira metade de projeção, tempo em que, talvez, algumas pessoas ainda sigam assistindo. Bagunçado e enlouquecido, igualmente o período retratado, tempos que não deixam saudade e que são lembrados com pesar. Igualmente a um circo de horror, horror no sentido de seu encaminhamento composto para um estupor de violência o qual o sangue jorra e mancha os que em guerra estão, seja com sangue próprio, ou com o sangue do outro.

Comentários (2)

Adriano Augusto dos Santos | terça-feira, 16 de Julho de 2013 - 08:23

Gosto bastante.Tem um melodramão bonito e uma violencia visual pesada,movimentada bem chamativa.

Antonio Montana | domingo, 21 de Julho de 2013 - 14:00

Queria assistir...não acho em lugar nenhum!!!🙁

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