Engraçado pensar que este Bad Boys Para Sempre tinha tudo para ser um filme deslocado do seu tempo, mas está longe disso. Will Smith e Martin Lawrence, em 1995, eram comediantes tentando a sorte grande no cinema de ação inspirado naqueles filmes de buddy cop que fizeram tanto sucesso principalmente nos anos 80, onde dois policiais que se completam formam a dupla perfeita para solucionar crimes altamente hediondos em uma Miami borrada de laranja na visão de filtro de Instagram que Michael Bay criou para aquele Os Bad Boys original. O background cômico da dupla foi essencial para estabelecer uma química instantânea em uma época onde correr em carros ostentosos, andar armados até os dentes e tirar a camisa em câmera lenta eram sinais de um produto cool para o ‘cinema de macho’.
Vinte e cinco anos depois, o cenário mudou e coube a Adil El Arbi e Bilall Fallah comandarem uma sequência da franquia para duas gerações a frente de consumidores de filmes de ação, no mesmo passo que tentam agradar o público que envelheceu junto àqueles personagens. E, surpreendentemente, ambos saem-se muito bem na difícil tarefa, mantendo tudo aquilo que fez do primeiro filme um sucesso, mas criando novas alternativas para adaptar os dois astros a uma nova e mais cética audiência, em um projeto que estava gerando desconfiança pela demora a sair e ter acumulado troca de diretores ao longo da produção.
Vale lembrar que esses filmes de ação dos anos 90 são mentirosos pra caramba, um endeusamento do herói intocável que sempre consegue dar um jeito de se livrar das mais adversas situações - e, sinceramente, dentro da proposta como entretenimento, isso jamais foi um problema, pelo contrário, sempre ficamos esperando a solução que o roteiro daria para determinados problemas. Em uma época onde o realismo é buscado a todo momento, é bom ver os dois protagonistas, agora cinquentões, tomando tiros, causando explosões, dirigindo imprudentemente carrões barulhentos e caros, fugindo dos protocolos para resolver as situações ao mesmo tempo que fazem piada com tudo isso - e com a idade de ambos também, afinal, já não são os mesmos de 1995 e nem de 2003, quando o insosso e altamente narcisista Bad Boys II chegou aos cinemas.
A dinâmica é basicamente essa: os anos passaram e agora eles têm “mais tempo vivido do que futuro pela frente”. Dói pensar assim, mas isso cria possibilidades para colocar os personagens em real perigo, algo que quando os astros eram mais novos e fazendo caminhões de dinheiro com as sequências era impensável. Isso é exaustivamente explorado tanto pelo fraco roteiro (que serve mais como uma simples linha condutora pro elenco brilhar) quanto pelas tiradas cômicas que a todo momento são criadas (gargalhei alto com diversos diálogos).
O Marcus de Lawrence continua reclamão e a idade trouxe mais verossimilhança às suas tiradas - no primeiro, ele era forçosamente diferente do Mike de Will com sua família, esposa que manda na casa e três filhos pra se preocupar. Já Mike segue solteiro, sem medo de terminar sozinho, com sua vida rica (herança do primeiro filme ressignificada aqui com seu envolvimento com uma personagem?) e um carro que deixaria qualquer fã de velocidade maluco. Sim, as piadas envolvendo Marcus fazendo alguma cagada no carro continuam funcionando e rendem bons momentos.
O roteiro é qualquer coisa sobre mexicanos querendo vingança de Mike e como isso adia a aposentadoria de Marcus, mas reconhece os inevitáveis clichês de filmes filhos dos anos 90 e brinca com eles, principalmente quando cita a novela mexicana. O que salva essa linha narrativa é mesmo a sintonia entre os dois, que acaba refletindo um pouco a carreira pessoal de cada um depois de Bad Boys: Will Smith viu a sua deslanchar e sempre teve oportunidades em blockbusters como Homens de Preto e Eu Sou a Lenda, além de protagonizar dramas como a cinebiografia Ali e À Procura da Felicidade. Já Martin Lawrence ficou rondando por comédias não muito relevantes e chega a este Bad Boys 3 quase aposentado do cinema como o seu Marcus Burnett está para a carreira policial. Não à toa Mike segue atlético mesmo com suas limitações enquanto Marcus está acima do peso para cenas mais acrobáticas, ao mesmo tempo em que a câmera lenta mostrando um Will Smith sem camisa correndo em direção à câmera agora é coisa do passado; a única vez em que Will fica sem camisa neste filme é para ser operado. E olhe lá.
Há a inclusão de novos personagens, um núcleo jovem que traz novas possibilidades à veterana dupla, novas tecnologias e novas maneiras de se pensar uma ação - que vai diretamente em confronto ao modo como eles agiam desde os anos 90. Com esse conflito de gerações, abre-se espaço para outros tipos de piadas entre eles e até mesmo subversões como o hacker bonitão e musculoso, uma tendência entre os jovens que deixa aquela imagem de magricela com óculos fundo de garrafa na preconceituosa década de 90. Além disso, o timing cômico de Will e Lawrence fornecem alguns improvisos maravilhosos - duvido que aquela referência ao High School Musical de Vanessa Hudgens estava no roteiro.
Para ser sincero, essa inserção de futuros possíveis protagonistas em séries já clássicas costuma ser um fiasco, mas aqui tudo pareceu em sintonia e, mesmo com a forçação de barra em achar um par romântico para Mike, dá para ver algum futuro para aqueles personagens. Gostei de como Marcus se interessa pela área tecnológica, por exemplo, tirando a exigência de cenas físicas de seu personagem e possibilitando-o se reinventar dentro de outras funções. Depois de 17 anos sem uma sequência, Bad Boys 4 está confirmado e com o retorno de Michael Bay para a direção - aqui ele faz uma pequena ponta, em um filme que respeita seu legado, mas, sinceramente, é muito mais redondo e enxuto do que os anteriores.
Estamos claramente diante de uma nova tendência que ressuscita filmes que estavam no limbo de Hollywood nesse deserto de ideias originais, criando releituras de personagens clássicos com algo que só a idade pode dar - a velhice e suas perspectivas. Foi assim com Indiana Jones, com Martin Scorsese e seus mafiosos favoritos e será assim com o recém anunciado Máquina Mortífera 5 e com a sequência / reboot de Os Caça-Fantasmas. Voltando para Bad Boys 3, não reinventa a roda, é quase bipolar a maneira como flutua entre comédia e violência explícita, mas é inegável que é divertido do início ao fim - exatamente como deveria ser dentro da sua proposta de diversão com o absurdo.
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