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Críticas

Cineplayers

Yimou Zhang usa novamente a rica cultura chinesa para embelezar uma história que não traz consigo algo de novo.

7,0

O que faz Yimou Zhang ser tão aclamado pela crítica e público é, acima de outras qualidades notáveis, a maneira como ele aproveita a rica cultura de seu país na hora de compor histórias que, em si, não apresentam grandes novidades. Talvez esse truque não seja exatamente eficaz entre o público oriental, mas para nós do Ocidente serve sempre como um atrativo a mais. Em Lanternas Vermelhas (Da hong deng long gao gao gua, 1991), por exemplo, o que há por trás de todo o apuro técnico e beleza estética é nada mais que uma história de mulheres disputando a atenção de um mesmo homem – enredo que em território americano já rendeu também diversos trabalhos. Ciente de que tem a cultura chinesa e tudo o que a envolve a seu favor, Zhang aposta sempre em premissas simples, que graças aos artifícios políticos e culturais de sua terra natal, ganham novos ares e parecem sempre tão inéditos. No caso de seu trabalho mais recente, A Árvore do Amor (Shan zha shu zhi lian, 2010), não é diferente. Investindo no tradicional enredo do amor jovem proibido, Zhang aproveita não somente a brecha para explorar sua estética apurada, mas também para nos ensinar, ainda que didaticamente, os pormenores de um dos eventos históricos mais importantes de China.

O pano de fundo para a nossa triste história de amor é a Revolução Cultural Chinesa, liderada pelo comunista Mao Tsé-Tung, e que mudou para sempre a história do país – para pior. O tal evento ocorreu logo após outros capítulos trágicos para a China, como a campanha do Grande Salto Adiante e a Segunda Guerra Sino-japonesa. A sociedade, economia, política e agricultura do país estavam em crise completa e as transições eram constantes e maléficas para os chineses. Como não se pode prever ou evitar o momento para se apaixonar, os jovens Jing e Sun (personagens baseados em um caso verídico) acabam o fazendo. Jing é uma moça introvertida e carente, que é mandada para uma vila de reeducação comunista após seu pai ser preso por oposição ao governo, onde conhece Sun, estudante de geologia e filho de um militar influente.

O contexto político da trama por vezes ganha uma atenção maior do que o romance entre os protagonistas, visando assim fazer com que o público aprenda o necessário para entender todas as implicâncias envolvidas no caso. Nasce daí um equilíbrio entre o amor inocente e condenado entre Jing e Sun com o cenário político da época, fazendo deste filme uma mistura um tanto estranha entre dois temas tão distintos, mas inevitavelmente unidos pelo roteiro. Por um lado Zhang faz questão de nos presentear com sequências singelas e tocantes sobre a descoberta do amor, em especial por parte de Jing, sempre inocente a tudo que a rodeia; por outro, há um clima de medo e repressão sufocante que paira no ar, mesmo que tais conflitos em si nunca sejam de fato priorizados ou expostos em excesso. No fim das contas, o romance acaba ganhando um foco maior a princípio, mas aos poucos vai se aproximando o inevitável, até que tudo se mistura em um clímax deveras interessante.

Muito recorrentes na filmografia de Zhang, alguns elementos simples ganham um significado simbólico para ilustrar os sentimentos e os atos dos personagens. Em Lanternas Vermelhas, o próprio título já indica quais são os objetos escolhidos pelo cineasta, assim como em O Clã das Adagas Voadoras (Shi mian mai fu, 2004). Mas no caso de A Árvore do Amor, o elemento escolhido é uma flor, como também acontece em A Maldição da Flor Dourada (Man Cheng Jin Dai Huang Jin Jia, 2006). Em determinado momento da trama, nos é apresentado um espinheiro que rodeia a vila para onde Jing é mandada, batizado pelos moradores da região como “espinheiro dos heróis”, em memória dos soldados mortos na Segunda Guerra Sino-Japonesa. No tal arbusto começam a brotar, no lugar das costumeiras flores brancas, as de cor vermelha (uma representação do amor proibido e do sangue inocente espalhado pela sucessão de acontecimentos injustos na China dessa época). Cada vez mais escarlates e menos brancas, essas flores são a tão necessária simbologia usada por Zhang para representar a essência dos temas abordados em seu trabalho.

Apesar dessa atmosfera de morte representada pelo espinheiro dos heróis, o que realmente ganha espaço em A Árvore do Amor é o clássico melodrama dos jovens que tem de lidar com o amor proibido (sair escondidos dos pais, evitar lugares públicos, amarem com sofreguidão e angústia etc). Um tanto quanto recorrente nas tramas ocidentais, esse enredo ganha um ar especial nas mãos de um diretor chinês, embora não apresente nada de novo em termos de texto e condução narrativa. Em vários momentos lembra o clássico de Shakespeare, Romeu e Julieta, ou talvez o filme-ícone da década de 1970, Love Story – Uma História de Amor (Love Story, 1970).

O erro mais explícito talvez esteja na necessidade de Zhang em parar sua narrativa para nos explicar com detalhes o que está acontecendo, como se o público não fosse capaz de juntar as peças por si próprio. O uso constante de subtítulos e o formato tradicional hollywoodiano provam, por fim, que seu foco é agradar o espectador ocidental, não o público geral. Por conta disso, ele apela bem mais neste trabalho para seus artifícios estéticos, com o fim de disfarçar essa sua preferência pelas narrativas americanizadas.

Por conta disso, a história de A Árvore do Amor nada mais é do que sobre um amor proibido. Porém, a estética apurada e a riqueza de detalhes culturais presentes na cenografia de Zhang conferem frescor e uma falsa sensação de ineditismo ao trabalho. A princípio a reação é de que você acabou de presenciar uma pequena mostra de originalidade no cinema atual, mas depois o que sobra é a sensação de déjà vu. Mesmo assim, não é nada mau ter esse tipo de sensação quando se trata de um filme tão bem conduzido e sensível. Um clichê é bom de vez em quando, desde que haja diretores como Yimou Zhang para utilizá-los das maneiras mais diferentes possíveis.

Comentários (2)

Patrick Corrêa | terça-feira, 25 de Outubro de 2011 - 17:41

Eu prefiro usar o nome dele na ordem contrária à do texto, como ficou consagrada aqui no Brasil.

Patrick Corrêa | segunda-feira, 21 de Abril de 2014 - 15:09

Adorei o filme e, na cena final, a história me ganhou de vez.
A crítica ficou ótima, pra variar, mas caiu em uma certa repetição nos últimos parágrafos.

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