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Angela

(Angela, 2019)
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Críticas

Cineplayers

Uma ode à sororidade

8,0

Quantos são os filmes que lidam de forma sóbria com o início da terceira idade, observando a ficha cair na vida de alguém a respeito do tempo que ainda se tem pela frente? E que além de mostrar esse tempo, se debruça sobre ele com realismo, sem fetichismo de nenhum extremo não há uma despreocupação absurda nem uma melancolia abissal. Apenas há uma mulher consciente do tempo em que se está, sem fantasias a respeito do futuro mas com sede crescente de se agarrar ao presente. Esse é Angela, delicado filme de Marilia Nogueira sobre algo pouco debatido, e a produção deixa claro que não precisa ser assim.

Ao criar uma intimidade com o espaço de sua protagonista, sua rotina, Marília nos une a essa mulher em compasso de espera, que estuda seu caso de saúde sozinha, os olhos que perseguem a cura dos olhos, a parede de anotações compondo a direção de arte esmerada para comentar o debruçar sobre uma realidade que ela não domina, mas faz parte de si. Sua letargia em perceber uma possível forma de fuga dessa realidade é acentuada com a vida que bate literalmente à sua porta, e lhe cobra um posicionamento. Angela precisa, de uma hora pra outra, sobreviver ao seu casulo que a oprime... e um primeiro passo precisa ser dado, dentro ou fora.

Angela é essencialmente um filme sobre sororidade, sobre o nascimento particularizado e natural desse conceito, sem panfleto e sem discurso. É uma linha muito fina que delimita a vontade de fazer umas pelas outras e se prostrar, e o filme retrata um pequeno levante de ajuda à próxima, que no futuro poderia ser qualquer uma das retratadas. Nesse impulso de encarar a vida de frente e transpor obstáculos, a protagonista se liberta de um ciclo de comiseração e se empodera diante do que está por vir, seja lá o que for. Um convite feito a personagem narrativamente, mas que a própria Marília metaforicamente extende aos espectadores, para negar a inércia e vibrar positivamente ao mundo.

A fotografia de Lucas Barbi fecha um ciclo de signos, primeiro acinzentando os planos fechados em mãos e olhos de Teuda Bara - em composição emocionada, como a protagonista - para gradativamente liberar luz àquela atmosfera, até encerrar o filme literalmente em festa, dando a produção de Marília algo já inerente no roteiro: uma imensa vontade de sair, ver a vida, experimentá-la, aproveitar cada segundo com quem nos quer junto, porque não se chega no fim da jornada ao negá-la, mas caminhando por ela e sentindo cada nova pegada. Angela agora não está mais sozinha, seus passos contém muitos outros.

Crítica da cobertura do 52º Festival de Brasília

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