Eis o Cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo...?
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8,0
Em um convento na Polônia, freiras se guardam em sua fé durante os idos de 1945, já no fim da segunda guerra mundial, de baixo da neve invernal que embranquece todo o cenário, contrastando com seus hábitos escuros que esconde seus corpos. É um preto e branco naturalizado na imagem. Reservadas, as mulheres possuem pouco contato com o mundo exterior. Mas a fortaleza de credos nem tudo protege. As ideias entram. A violência invade.
Fotografado de modo a mostrar a opressão daqueles tempos, esse novo trabalho de Anne Fontaine é uma obra contemplativa cujo visual implica no contexto que assistimos. As imagens geralmente são belas, com potencial de serem emolduradas. A luz fria incide nas relações de seus personagens. A cinematografia extravasa toda a angústia da vivência atormentada, daquelas que sofrem caladas e de mãos agarradas, orando. É nessa angústia que o roteiro investirá. Há uma esfera enclausurante a qual vivem e tudo em volta, também por nós, é inacessível. Sabe-se da guerra, mas não a vemos. Sabe-se do que acontece no país, mas ninguém diz.
Soldados soviéticos avançam sobre o convento e estupram as mulheres. Chegam e vão. A violência dá-se pela dominação que julgam ter sobre as vitimadas e indefesas religiosas. O roteiro não se interessa exatamente em discutir isso, mas tratar dos traquejos, de como aquelas freiras suportam tal ação e quais são suas atribuições a esse crime mudo. Aí se destaca tantas individualidades, com cada uma das mulheres reagindo de uma maneira, experimentando a dúvida da crença. Pecado? Punição? Destino? Provação? As perguntas lhes são respondidas com silêncio.
O embate que guiará o filme surge com a presença de Mathilde, enfermeira voluntária da cruz vermelha que presta socorro aos franceses feridos. Uma das freiras parte em busca de socorro e encontra a enfermeira que se nega, mas cede ao convite após vislumbrar pela janela uma tocante prece, para logo descobrir a situação das irmãs e o despotismo da madre superiora. Aí o filme se desenrola: o fundamentalismo das religiosas frente a libertária, comunista e ateia Mathilde que detém a solução para elas. Às escondidas, então, a enfermeira passa a cuidar de todas, compartilhando daquelas vidas. Não são poucas as questões que o Agnus Dei lança ao público, nunca tomando partido. É um retrato social e real.
O filme não tem interesse em chocar seu público, ainda que por vezes seja praticamente inevitável. Há pelo menos 3 cenas climáticas memoráveis. Há freiras doentes e 7 grávidas, prestes a dar à luz os bebês. Após nascerem, são levados a outro lugar a fim de preservar o segredo que as acometem. O roteiro bem planejado se encarrega de equilibrar e trabalhar com nuances de situações, sendo o extremo de fato reservado a imaginação do espectador. A talentosíssima diretora Anne Fontaine dá direcionamento aos diálogos bem ensaiados, tendo um elenco competente e uma protagonista vivida por uma interessantíssima atriz, Lou de Laâge.
Indigesta, mas precisa no que propõe expressar, essa obra realista foi inspirada por um caso envolvendo 25 freiras que foram violentadas e assassinas por soldados russos. É um registro intrínseco da brutalidade, algo não tão diferente do que vemos diariamente por aí.
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