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Críticas

Cineplayers

A história caminha bem, mas as resoluções finais detonam boa parte do filme.

5,5

Os Agentes do Destino (The Adjustment Bureau, 2011) começa intrigante ao trabalhar bem, sem pressa, sua premissa de que o destino não está em nossas mãos, fruto das escolhas que fazemos, mas, sim, está pré-determinado por forças maiores que por meio de agentes interferem no cotidiano de certas pessoas para que nada saia do previamente planejado. A simbologia de Deus e a filosofia de que tudo está escrito é evocada a todo instante. Chamado de presidente, o líder dessa “corporação” é mesmo como uma figura divina, e seus agentes funcionam como anjos, o que é confessado por um deles. Mas é bacana notar que não há uma interpretação fechada para essas pessoas misteriosas, que podem ser enviadas do céu ou apenas pessoas recrutadas por uma grande corporação secreta. A interpretação, acertadamente, recai sobre o espectador.

Obviamente, tais agentes devem, para que a história exista, interferir na vida de alguém que, por sua vez, causará trabalho para eles. Neste caso, a missão fica por conta de David Norris (Matt Damon), deputado de sucesso que sonha em representar o estado de Nova Iorque no Senado. Sua primeira tentativa falha em função da interferência de tais agentes, mas que providenciam logo na sequência para que tudo entre no rumo. A responsável por salvar o futuro político de David ainda no seu discurso de derrota é a dançarina Elise (Emily Blunt), a quem conhece em um local inusitado enquanto ensaiava suas palavras à população.

Só que o destino, a princípio, previa apenas que ela fosse o elemento a salvar sua carreira de congressista de um possível fracasso, já não prevendo mais a possibilidade de que esse “acaso” pudesse fazer com os que os dois se apaixonassem, o que acende o sinal de alerta para os agentes, que tentarão a todo custo impedir que os dois fiquem juntos. Assim, o filme mescla suas características iniciais de ficção científica com romance, entregando-se cada vez mais para o segundo e utilizando elementos que ainda o encaixem no primeiro. 

Dentro de sua lógica ficcional, Os Agentes do Destino comete falhas. Estabeleço aqui um paralelo com A Origem (Inception, 2010) apenas para explicar o raciocínio. No longa-metragem de Christopher Nolan, a criação do impossível era sustentada por argumentos que pareciam lógicos e críveis, tornando a realidade dos sonhos explicável do ponto de vista daquela narrativa. E, claro, facilitava o trabalho estabelecer uma história intrigada no universo inatingível e inexplicável dos sonhos. Já este exemplar dirigido pelo estreante George Nolfi precisa criar toda sua lógica no mundo real, o que torna a missão, sem dúvida, mais ingrata.

É aí que lacunas não são explicadas de maneira ideal. É plausível acreditar em agentes semelhantes habitando o mundo – e isso é necessário aceitar também para compreender a história. E também é possível considerar a interferência que podem ter nas atitudes da população e daqueles que por algum motivo precisam guiar. Até aí, enquanto as ações geram perguntas e mais perguntas na cabeça do espectador, tudo caminha dentro dos conformes. Porém, quando resolve começar a explicá-las acontecem problemas. Revelarei adiante parte da trama.

Na verdade, quando David presencia, por erro dos agentes, a missão de calibrar o pensamento de seu assistente pessoal, o roteiro se mostra incrivelmente adequado para gerar no espectador explicações e respostas. Passamos a saber quem são aquelas pessoas e o que fazem. Além disso, os agentes impõem uma série de condições para que David possa prosseguir sua vida normalmente. Entre elas, estão a de não comentar a existência deles e de se manter longe de Elise.    

Entretanto, ao mesmo tempo em que esses homens de sobretudos pesados parecem tão poderosos e capazes de prever ações seguintes ao consultar uma espécie de livro do destino, surgem, em outros momentos, inocentes e manipuláveis, mesmo que parcialmente, por aqueles que deveriam manipular. O acerto da história, nesse ponto, é não ser nada maniqueísta. Os agentes são apenas interlocutores do destino, responsáveis por fazer tudo sair como planejado por essa misteriosa entidade superior – e a não definição de quem são serve também para não impor qualquer tipo de crença, já que cada espectador pode interpretar como quiser quem são aquelas pessoas e também o chamado presidente. Mesmo que o filme termine em um arranha-céu e dê a entender a existência de certo fundo religioso.

Falando em final, ele não poderia ser de mais mau gosto do que esse. A história caminha bem, de maneira geral, mas as resoluções do último ato e a cena derradeira em si detonam com boa parte de Os Agentes do Destino. O desfecho é brega. Seria mais romântico, ou até mesmo sincero, se a história caminhasse para uma escolha, se invocasse sobre o debate da necessidade de renúncia de certos caminhos para se atingir outros, exatamente como a vida é. Mas, infelizmente, o encerramento caminha para um conto de fadas nada convincente.

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