8,5
O diretor esloveno Matjaz Ivanisin de fato não tinha uma ideia melhor quando decidiu tocar o projeto Homens que Jogam, como ironicamente sugere o próprio filme, ou sua sagaz decisão coroou a vitória da simplicidade? O longa acaba de vencer o Olhar de Cinema e o juri surpreendeu a todos com tal decisão. Não porque faltem méritos ao longa, mas porque como disse o jurado Roger Koza, "festivais de cinema não costumam privilegiar a leveza", nem em sua seleção e muito menos em sua premiação. Primando a ousadia, o júri saiu do lugar comum das histórias densas e arrojadas tão comuns a qualquer mostra e apostou na proposta de Matjaz, tão inusitada quanto poderia ser.
A palavra 'play' tem conotação tripla em inglês, e o longa brinca com as diversas possibilidades, brincar, jogar e interpretar, ao abordar uma série de jogos tradicionais em países distintos, a relação dos homens envolvidos com elas e o absurdo de tantas, quase todas. Combates físicos, adivinhações, de estratégia, sorte ou esforço mental ou corporal, a intensidade com que cada atividade é desempenhada por seus participantes traduzem tanto seus costumes quanto uma radicalidade de atos, que explodem na tela com força diversa, que podem ir da estupefação a chacota, e que o realizador consegue traduzir todas em imagens marcantes.
Uma espécie de luta greco-romana ao ar livre num calor escaldante, o jogo do queijo maiorchino que rola uma ladeira italiana, a disputa de adivinhação de somas resultantes em apostas com os dedos, essas são apenas alguns dos episódios desse filme muito curto - 1 h apenas - que está muito mais interessado em travar uma observação nos participantes e em suas reações extremadas do que necessariamente em seus jogos. O choro compulsivo dos participantes do primeiro, a histeria coletiva que toma conta dos integrantes do terceiro, cada povo e suas reações mostram o potencial efêmero dessas sensações diante de vitórias e derrotas.
Em determinado momento, uma voz em off avisa: o diretor Matjaz Ivanisin perdeu sua imaginação e não sabe o que fará para terminar o filme. Nesse momento percebemos que o autor estava disposto também ele a ir até as últimas consequências com seu filme, passando a ser seguido pelas câmeras, a filmar sua estampada melancolia. Nesse arco, o filme passa a integrar o grupo cada vez maior de documentários onde não sabemos onde termina a realidade e começa a ficção, renovando a proposta do todo e criando camadas insuspeitas a um filme que parecia dedicado a radiografar a ausência de limites do bizarro em uma sociedade que celebra isso.
O filme é ressignificado então, e todas as cenas em revisão parecem servir ao propósito múltiplo de interpretar, inclusive do próprio espectador, que se vê forçado a reinterpretar cada uma das cenas propostas anteriormente. Assim sendo, o próprio 'Homens que Jogam' passa ele mesmo a ser um jogo curioso e divertido, onde as múltiplos personagens envolvidos (diretor, objetos filmados, jogos, espectador) são alvo de um propósito maior, levando o 'play' do título original a possibilidades infinitas e também elas absurdas.
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