Em dado momento Orlando (Jeremy Renner) pergunta a Ewa (Marion Cotillard) o que ela quer na América, a resposta é simples e pode até parecer piegas. “Eu quero ser feliz”, responde. Felicidade essa que parece impossível para todas as personagens femininas da obra de James Gray. Em meio a um ambiente sujo, dominado por homens egoístas e vis, todos querem apenas sobreviver.
Abrindo com uma imagem da Estátua da Liberdade – essa que estaria muito ligada a Ewa durante grande parte do filme – resguardando a cinzenta terra das oportunidades, A Imigrante (Immigrant, The) tem um cuidadoso trabalho estético. A cada tomada é possível perceber o esmero com que os planos foram preparados, além da excelente ambientação de uma América perdida, prestes a entrar na Grande Depressão de 1929.
Fugindo da Primeira Guerra Mundial, que assolava a Europa no começo da década de 1920, a polonesa Ewa chega à América junto de sua irmã Magda. Depois de uma longa viagem de barco cercada de mistério devido às acusações de imoralidade vindas de outros passageiros sobre Ewa, a polonesa tem sua entrada nos Estados Unidos negada. Magda, por sua vez, é diagnosticada com tuberculose e enviada a um hospital. Se não melhorar em seis meses, será deportada. Eis que um possível bom moço aparece. Bruno Weiss (Joaquin Phoenix) se apieda da situação de Ewa e a leva para sua casa, oferecendo a ela um emprego de costureira em sua companhia de teatro, que mais tarde se revela um show burlesco de prostitutas. Sem alternativa de emprego, Ewa se obriga a entrar para o show.
Então Orlando aparece. Um mágico que tem problemas com álcool e jogos, mas que promete ajudar Ewa. A construção verossímil dos personagens, bem como as atuações, é perfeita. Um triângulo amoroso é formado, cercado de sentimentos heterogêneos, como dúvida e zelo, interesse e ciúmes. Ewa e Orlando parecem se apaixonar, mas em meio às nuances de todos os personagens, nada é explícito na trama. Ninguém dá o braço a torcer, nem revela o que realmente pensa ou quer. Bruno se perde cada vez mais em sua desconfiança e inveja, tornando-se mais instável a cada momento.
Em seu quarto trabalho com Gray, Phoenix se destaca mais uma vez. Em um papel difícil, o porto-riquenho acerta o ponto em cheio, trazendo vida a um homem apresentado ao telespectador como salvador, mas que logo se mostra contraditório e traz a dúvida diante de suas escolhas e intenções. Marion Cotillard, como protagonista, não fica para trás. Tão profunda quanto Bruno, Ewa é uma moça casta e inocente, que se vê corrompida pelo cenário a sua volta. A composição mesclada de ambos, bem como seus conflitos, é vital para o bom desenvolvimento da trama.
A violência física é praticamente inexistente, porém a psicológica está presente a cada minuto. Ewa é humilhada por bêbados, destratada por outras dançarinas e pressionada pela loucura de Bruno, por vezes um apaixonado preocupado, por outras um obsessivo controlador. Em meio a tantos problemas, a protagonista busca apenas sobreviver, rouba e se prostitui, porém é apenas mais uma vítima.
Moralidade e religião também são temas levantados por Gray. O papel da mulher na sociedade da época é questionado o tempo todo. O homem se impõe galgado nos degraus da honra e faz o que bem entende, acusando e condenando. À mulher resta apenas orar e pedir perdão por seus atos.
É possível traçar um paralelo entre a imigração da década de 1920 e a que acontece atualmente. Na época, europeus fugiam da guerra em busca de oportunidades e paz nas Américas. Hoje, sul-americanos e africanos vão para a Europa e Estados Unidos em busca de oportunidades, e mesmo que seus países não estejam em guerra, buscam também a paz e a tranquilidade. Muitas vezes o que os imigrantes de hoje encontram é o mesmo que Ewa encontra no filme, corrupção, oportunismo, violência, e preconceito. Logo ela conclui que não tem casa, apenas quer estar perto da irmã, a única em quem pode confiar plenamente.
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