[Vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes retrata as dificuldades das instituições educacionais da França com os imigrantes das suas ex-côlonias ]
De uns anos pra cá, a França ganhou notoriedade no futebol. Venceu uma Copa do Mundo e foi finalista do último mundial realizado em 2006. Esse prestígio conquistado pelos franceses, no entanto, não tem origem apenas dentro de seus domínios. A base da seleção francesa que goleou o Brasil em 1998 era - e ainda é - formada por muitos atletas estrangeiros naturalizados ou filhos de imigrantes das ex-colônias africanas. É o caso de Zidane, Henry e Thuram, por exemplo, três dos principais jogadores daquela histórica seleção francesa.
Aspirantes a jogador vindos de países como Mali, Argélia e Marrocos não faltam na França. Junto com eles, há um grande contingente de jovens e adultos que migram para as periferias francesas trazendo na bagagem nada mais que a sorte. E o que fazer com essas pessoas?
Em Entre os Muros da Escola, o diretor Laurent Cantet não traz uma resposta definitiva. Tampouco aborda o assunto de maneira abrangente. O que ele faz – e cumpre esse papel com louvor – é testemunhar um microcosmo dessa sociedade emergente e desacreditada que se faz presente no seu filme dentro de uma escola pública. Lá dentro se misturam os mais diferentes estereótipos da imigração estabelecida no país europeu. Tem os estudantes africanos que trazem para a sala de aula sua revolta e os desajustes de uma infância desorientada. Os imigrantes muçulmanos vicejam seu estranhamento com uma sociedade que os olha de soslaio. No fim do túnel há também a luz de um aluno chinês dedicado em matemática, mas com dificuldades no francês.
Todos esses tipos fazem parte da turma de 8° ano coordenada pelo professor François Merin. O docente faz o perfil conciliador, aberto ao diálogo. Antítese do linha dura, ele tenta de todas as formas apaziguar os ânimos em sala de aula. Na contramão de outros colegas seus que se revoltam com a falta de respeito dos estudantes. Ele está ali, em meio a adolescentes com futuro incerto e professores queixosos, numa espécie de catalisador dessas máculas.
A relação professor/aluno e a maneira irremediável como a França lida com seus imigrantes são as tônicas desse filme, vencedor da Palma de Ouro em Cannes 2008. À medida que François luta para romper as barreiras que distanciam o professor dos seus estudantes ele se dá conta de que a conseqüência dessa relação não passa imune de conflitos. A aproximação dele com a vida pessoal dos alunos é fomentada através de um trabalho de aula onde cada um deverá apresentar o seu perfil em sala de aula. E o que dá margem a um pequeno desentendimento logo se ampliará num drama sufocante. Os erros e acertos do ensino cometido pelas instituições francesas são colocados em xeque no filme. Um problema bem conhecido em nosso país, mas que não passa incólume nem mesmo nas nações de primeiro mundo.
Tão interessante quanto o conteúdo é a forma como Entre os Muros da Escola se desenvolve. Num clima fortemente documental, o filme se utiliza de atores amadores, bem à vontade em seus papéis. Uma naturalidade que impressiona tanto quanto a simplicidade da produção que Cantet comprova em cada fotograma. Sem trilha musical, sem malabarismos de câmera e com poucas locações –quase todas dentro da escola – o diretor encontra sua força de inspiração em levar para a tela as idéias de um livro de experiências escrito por François Bégaudeau, que não por acaso interpreta o professor François do filme.
Assim como o restante do elenco, o professor da vida real não faz feio na ficção. Para que acertassem no tom da narrativa, ele e o diretor conversavam por uma hora antes das filmagens. Esse espírito de improvisação deu tão certo que fica difícil dizer o que é mais contundente: a mensagem que eles quiseram nos passar ou a ideia de que fazer cinema de qualidade não é lá um bicho de sete cabeças.
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