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Os encontros e desencontros do amor em 15 filmes

Nenhum regente pode ser mais romântico e ainda assim cruel quanto o destino. Nas histórias de amor do cinema, ele geralmente leva aquelas duas almas solitárias, muitas vezes até opostas, a se encontrarem ou reencontrarem sem querer. Ele acende aquela faísca inexplicável, aquela atração instantânea, a sensação de “amor à primeira vista”, para depois brincar com os corações apaixonados e parti-los, colá-los de volta e depois voltar a quebrá-los. Na vida e nos filmes, o tempo faz seu papel, o destino o ajuda, e o resultado é sempre um amor inesquecível, seja o final feliz ou não. Confira abaixo 15 dessas histórias que amamos ver e rever, seja pra rir, suspirar ou chorar: 


A Loja da Esquina (The Shop Around the Corner, 1940), de Ernst Lubitsch

Um dos mestres das comédias românticas, Lubitch conta em A Loja da Esquina a história de duas pessoas que se amam e se odeiam na mesma medida, porém sem saber. Como assim? Inimigos nos negócios, os personagens vividos por James Stewart e Margaret Sullavan passam o dia todo trocando farpas, mas em segredo trocam cartas anônimas de amor, sem nem imaginar que na verdade um é o correspondente secreto do outro. O filme foi de inspiração para outra adorável comédia romântica, Mensagem Para Você (You’ve Got Mail, 1998), com Meg Ryan e Tom Hanks, onde a diretora Nora Ephron atualizou a história e os colocou trocando e-mails ao invés de cartas. Mas é no filme de Lubitsch que a expressão “ironia do destino” se faz mais engraçada e romântica do que nunca. 


Casablanca (idem, 1942), de Michael Curtiz

A frase já é clássica: “de todos os bares, de todas as cidades, no mundo inteiro, ela entra no meu”. Após viver um romance inesquecível em Paris, Humphrey Bogart e Ingrid Bergman se reencontram inesperadamente nas mais trágicas circunstâncias. Ainda apaixonados, eles não mais podem ficar juntos, e esse é o grande dilema e a grande beleza de Casablanca, um dos maiores clássicos do cinema, e representante máximo dessa vertente de filmes românticos em que o destino força um reencontro capaz de reabrir feridas e trazer à tona um sentimento jamais esquecido. Sobra a sensação de coração apertado e o melancólico consolo de que eles sempre terão, em suas memórias, aqueles dias felizes em Paris. Claro que isso não é o suficiente, e talvez seja esse vazio no coração que torne Casablanca um filme tão atemporal e capaz de permanecer em nós, pois já dizia Woody Allen que só um amor incompleto pode ser romântico. 


Desencanto (Brief Encounter, 1945), de David Lean

A beleza das histórias de amor proibido é exprimida ao máximo em Desencanto e o tradicional desencontro na estação de trem, na cruel despedida dos amantes que sabem que terão de voltar para a rotina de suas vidas que perderam todo o sentido agora que se conheceram. Na pele de uma feliz e satisfeita esposa e dona de casa que um dia acaba cruzando por acaso com um charmoso desconhecido em um café qualquer, Celia Johnson encarna com perfeição os conflitantes sentimentos de culpa e prazer. Ela não tem motivos para ser infeliz, tem tudo o que sempre quis na vida e ama de coração seu marido. Mas o que ela sente pelo jovem médico desafia qualquer senso de razão e conforto, e ela é obrigada a guardar para si, em seu coração, o sentimento mais belo e arrebatador que já experimentou na vida. 


Tarde Demais Para Esquecer (An Affair to Remember, 1957), de Leo McCarey

Não há filme em que o destino tenha sido mais cruel com o amor do que Tarde Demais Para Esquecer. Eles se conhecem por acaso em uma viagem em um transatlântico, se apaixonam perdidamente, mas estão comprometidos com outras pessoas. Decididos a lutar contra essa sina, prometem terminar cada qual seu relacionamento e combinam de se encontrar algum tempo depois no Empire State Building, em Nova York, com data e horário marcados. Mas em se tratando de um melodrama clássico da Velha Hollywood, esse plot não poderia resultar em um final feliz. Por manobra o destino, o tão esperado encontro não acontece, partindo o coração apaixonado dos dois. Mas o tempo é irônico e muitas vezes cruel, manobrando os acontecimentos para que um dia, sem querer, Cary Grant e Deborah Kerr se encontrem novamente, agora despreparados e envergonhados, para um acerto de contas final. 


Hiroshima Meu Amor (Hiroshima Mon Amour, 1959), de Alain Resnais

Através da linguagem não linear e subversiva da nouvelle vague, o diretor Alain Resnais fez de Hiroshima Meu Amor um tratado sobre o tempo, a memória e as relações humanas. O casal central se conheceu por acaso, no Japão, e iniciou um romance apaixonado que os remete a traumas passados. Ela se recorda da ocupação nazista na França, quando se apaixonou por um soldado alemão, e ele se lembra das pessoas que perdeu com a bomba atômica. Suspendendo tempo, espaço, realidade, memória, presente, passado, e os condensando em uma coisa só, Hiroshima Meu Amor coloca em evidência a paixão e a dor de duas almas que se agarram uma na outra para poder se manter em meio ao caos. Não se sabe muito de onde vieram e para onde vão, ou se o que sentem um pelo outro é duradouro, mas naquele presente, naquele encontro fortuito, eles se tornam um só. 


Duas Garotas Românticas (Les Demoiselles de Rochefort, 1967), de Jacques Demy

Mas esse jogo de encontros e desencontros nem sempre precisa ser trágico. Na concepção visual colorida e musical de Jacques Demy, ele é motivo para dança. Em uma cidade do interior da França, vários jovens descobrem o amor com a chegada do verão, exceto Delphine (Catherine Deneuve), que está sempre feliz, mas nunca acompanhada. Através das múltiplas histórias que comanda, Demy traça uma teia de encontros e desencontros em que nunca o destino de sua heroína se encontra de frente com o do personagem principal. Embora fique claro que um é o par ideal do outro, e mesmo com os dois de alguma forma já intuindo isso mesmo não se conhecendo, a correria do dia a dia nunca permite que esses caminhos se cruzem de vez. Para os otimistas apaixonados, resta acompanhar com o coração na mão o desfecho dessa linda e colorida história sobre o amor jovem, que pulsa mesmo à distância e sobrevive somente de sonhos. 


Tudo Bem no Ano que Vem (Same Time, Next Year, 1978), de Robert Mulligan

A primeira vez que se encontraram foi através de um empurrãozinho do destino, ou talvez um mero acaso. Mas todos os encontros seguintes foram planejados com antecedência e esperados com muita saudade. Tudo Bem no Ano que Vem traz a inusitada história de dois amantes que passam um fim de semana juntos todos os anos através de décadas. Cada qual tem sua família e vida em cidades diferentes, mas no encontro anual largam tudo para matar a saudade na mesma pousada em que se conheceram quando jovens. Robert Mulligan analisa aqui o amor através do tempo, sob a influência da distância, dos problemas da vida, e como ele de alguma forma perdura quando é verdadeiro. Se tudo começou por acaso, em um encontro ocasional, desta vez o casal encontrou uma brecha no destino e deu um jeito de continuar juntos, mesmo que separados.


O Fundo do Coração (One From the Heart, 1982), de Francis Ford Coppola

Eles já se amam, já são casados e já sabem que foram feitos um para o outro, mas por alguma razão o casamento agora se encontra em crise. O casal então se separa e cada um segue para um caminho diferente, percorrendo a euforia colorida da cidade de Las Vegas e conhecendo novas pessoas. Em O Fundo do Coração, Coppola emprega o destino como um agente que reconcilia e reaproxima os dois lados de uma relação partida e desgastada pelo tempo. Ao longo de uma mágica, musical, colorida e absurda noite, os dois passarão por incríveis experiências – só para perceber que não podem ficar longe um do outro e para na reta final correrem perdidos em meio a tanto jazz e neon, na esperança de um reencontro. Se não foi pelo destino que eles se conheceram e se apaixonaram, será por ele e por suas curiosas coincidências que o casal encontrará um meio de se reinventar e de prevalecer. 


Harry e Sally: Feitos um Para o Outro (When Harry Met Sally, 1989), de Rob Reiner

Pode existir uma amizade entre um homem e uma mulher? Para Harry, isso não é possível, já que a questão da atração sexual irá sempre interferir. Já Sally acredita totalmente na amizade sem segundas intenções. Ao longo de anos, esses dois opostos provarão na prática que cada um tem um pouquinho de razão, já que o destino dá sempre um jeito de cruzar o caminho deles de tempos em tempos. Quando se conhecem, se odeiam de imediato. No reencontro, passam a se suportar. Anos depois, voltam a se ver por acaso e iniciam uma amizade verdadeira. Mas as constantes decepções na vida amorosa os levam a perceber que talvez o sentimento entre eles seja um pouco mais forte. Harry e Sally é uma deliciosa comédia romântica que atravessa uma linha do tempo em que dois personagens neuróticos vão se cruzando e se envolvendo cada vez mais. Neste caso, o tempo e o destino não saíram como vilões e acabaram exercendo o papel de cupido.  


Sintonia de Amor (Sleepless in Seattle, 1993), de Nora Ephron

Como pode existir uma história de amor em que o casal principal só se encontra na cena final? Sintonia de Amor mostra que nem sempre o romance envolve beijos, abraços e declarações apaixonadas. Após ficar viúvo, o personagem de Tom Hanks desiste do amor, mas seu filho de 8 anos insiste para que ele arranje uma nova mulher e acaba ligando para um programa de rádio noturno e faz um apelo por uma nova mãe. De todas as mulheres que enlouquecem com o pedido, é a personagem de Meg Ryan a que mais parece compreender a situação. Ela tenta encontrá-lo, mas nem tudo sai como planejado. Ele tenta contatá-la, mas não sabe ao certo quem é ela. Nós sabemos que um foi feito para o outro, mas os constantes desencontros os afastam cada vez mais. Fazendo uma doce releitura de Tarde Demais Para Esquecer, Ephron aposta aqui em um novo encontro marcado no Empire State Building, onde desta vez o destino talvez não opte por um final tão cruel. 


Antes do Amanhecer, Antes do Pôr do Sol e Antes da Meia-Noite (1995, 2004 e 2013), de Richard Linklater

O encontro de Jesse e Celine em um trem inicia uma das trilogias mais amadas do cinema contemporâneo. No período de um único dia, os dois jovens decidem abandonar os planos que os trouxeram ali e partem em uma caminhada pelas ruas de Viena, na Áustria, conversando sobre os mais variados assuntos e aos poucos se apaixonando perdidamente. Nove anos depois e os dois, por acaso, se cruzam novamente em Paris, agora mais adultos e com outra mentalidade. Descobrem que aquele sentimento despertado há quase uma década atrás ainda existe. Já em 2013, depois de outros 9 anos, sabemos que os dois estão finalmente juntos e enfrentando as crises comuns de casamento, filhos e chegada da meia-idade. Richard Linklater erigiu através dessa trilogia dos tratados mais singelos sobre o tempo e sua ação sobre a vida, sobre os sentimentos e sobre as relações humanas. Pé no chão demais para creditar tudo ao destino, resta ao diretor crer numa sorte muitos grande que uniu por mais de uma vez esses dois corações apaixonados. 


Pequeno Dicionário Amoroso (idem, 1997), de Sandra Werneck 

Através de um literal escrito que narra as idas e vindas de um casal que se conheceu por acaso, Pequeno Dicionário Amoroso se aventura pelas pequenezas cotidianas que aproximam e afastam as pessoas nas relações modernas, aos poucos montando um quebra-cabeças que revela as personalidades de Luiza e Gabriel, vividos por Andréa Beltrão e Daniel Dantas. Um dos filmes mais singelos do cinema nacional, esta pequena pérola atravessa toda a tradicional trajetória de uma relação comum, desde a atração inicial até a separação, dos momentos de felicidade às decepções, das coincidências que os juntam aos problemas que os afastam: tudo em uma relação a dois se encontra reportado nesse dicionário delicado, engraçado e tocante da diretora Sandra Werneck, que inclusive ganhou uma continuação em 2015. 


Amor à Flor da Pele (Fa Yeung Nin Wa, 2000), de Kar Wai Wong

O que fazer se você acaba conhecendo o amor da sua vida depois de já estar comprometido com outra pessoa? Ao se mudar para um novo apartamento com a esposa, Chow Mo-wan acaba descobrindo na sua vizinha a pessoa que sempre quis para si. Mas em uma cultura em que a separação não é uma opção, resta a esses dois apaixonados reprimirem o sentimento inesperado e lutar contra os próprios instintos. Um dos maiores estetas do cinema contemporâneo, Kar Wai Wong literalmente pinta com cores quentes a tortuosa relação de duas pessoas que se veem obrigadas a se encarar todos os dias, na rotina cotidiana, sem poder extravasar qualquer sentimento. Na tensão dos silêncios, no rubor dos olhares furtivos, na dança de insinuações, nasce um dos grandes romances do cinema. Como quase todos, também castigado pela ação do destino, que insiste em colidir os caminhos daqueles que não podem ficar juntos. 


Carol (idem, 2015), de Todd Haynes

Na conservadora sociedade americana dos anos 1950, a dona de casa Carol (Cate Blanchett) acaba encontrando por acaso, em uma loja de departamentos, durante a correria das compras de natal, a jovem vendedora Therese (Rooney Mara). Nasce ali uma delicada atração instantânea, obviamente proibida para aquela época. Haynes explora nesse filme o lado trágico do amor e assim faz uma versão mais atualizada de Desencanto, tratando através do melodrama toda a sofreguidão de duas pessoas que redescobrem a sexualidade em um momento delicado da vida. Dentro dessa atmosfera pessimista e fatalista, o tempo e o destino agirão novamente como vilões, potencializando o efeito dramático de um amor que não pode ser concretizado da maneira como deveria, restando as amantes o gosto amargo da terrível experiência de não poder escolher o próprio caminho.   


Me Chame Pelo Seu Nome (Call Me By Your Name, 2017), de Luca Guadagnino

O que era para ser apenas mais um verão de tédio e descanso na vida de uma família de intelectuais abastados, na Itália dos anos 1980, torna-se um momento de descobrimento para o jovem Elio (Timothée Chalamet), que acaba conhecendo o estudante Oliver (Armie Hammer), por quem se sente atraído de imediato. Mais do que uma história de primeiro amor, Me Chame Pelo Seu Nome sobrevive como recorte de uma lembrança de verão perdida no tempo, mas importante o suficiente para mudar a vida dos envolvidos. O pai de Elio lhe diz francamente que muitas pessoas passam a vida inteira sem viver uma conexão tão forte quanto a dele com Oliver, e nós sabemos que a situação não permite que aquela relação tenha qualquer futuro duradouro, mas o simples acaso do destino permitiu a esses dois personagens a oportunidade de conhecer um sentimento que talvez valha por toda uma vida – uma melancolia que só os amores incompletos e eternos podem proporcionar. 

Comentários (4)

Paulo Faria Esteves | quarta-feira, 13 de Junho de 2018 - 03:31

Bacana, o artigo. Senti falta da trilogia Albergue Espanhol, mas pronto.😋

João Vitor G. Barbosa | quarta-feira, 13 de Junho de 2018 - 10:26

Belíssima lista. Se fosse pra acrescentar algum filme pensaria no lindo Vestígios do Dia (1993), de James Ivory. Não é uma história de amor como trama principal, e sequer vemos os personagens se declararem ou expressarem claramente isso. Porém, é dolorosa a constatação de que o sentimento é subjacente e parece querer emergir, mas nunca ocorre. Brilhantes atuações de Anthony Hopkins e Emma Thompson.

Walter Prado | quinta-feira, 14 de Junho de 2018 - 16:13

Vestígios do Dia é magnífico mesmo.

Araquem da Rocha | sexta-feira, 28 de Setembro de 2018 - 04:58

Harry e Sally,e Sintonia de Amor,são duas excelentes comédias românticas,que gosto muito. S2

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