O desejo da carne é algo incompreensível e impossível de se expressar através de palavras, músicas, livros e poesias. Está muito mais além da nossa compreensão e entendimento, sendo algo tão forte, capaz de arder como fogo ao mesmo tempo sutilmente como já dizia o ilustre - poema de Luíz Vaz de Camões. A paixão nos penetra agilmente de forma veloz e desenfreada, acesa por uma vontade lasciva e luxuriosa por dentro, podendo levar a uma loucura desesperadora, na ânsia de satisfazer uma incontrolável vontade carnal. É um sentimento tão profundo e inimaginável, que muitas pessoas pagam caro com suas vidas, dominadas ou atingidas por demônios ao invés de cúpidos (vamos dizer), por paixões avassaladoras que costumam culminar em tristes finais (na perdida esperança de encontrar paz em outra vida). Aí, há uma batalha interna violenta trazendo dor e angustia para essas pobres almas, incapazes de matarem a paixão que nutrem por dentro, abalando suas estruturas psicológicas, ficando em estado de insalubridade, insânia e principalmente a perca da sanidade. Muitos sem auxilio ou alguém para confortá-los, se desiludem da vida (Isso em ambos os sexos), e partem para um torpor ou pior: um flerte fatal. Neste trabalho surpresa do diretor Abdellatif Kechiche, que tem levado milhares de pessoas aos cinemas nas ultimas semanas, chamou a atenção do mundo nos mostrando sua leitura íntima de um olhar diferente justamente por tratar de um assunto comum em nossas vidas, de maneira tão radical e tocante.
O que eu mais gosto no cinema alternativo é a simplicidade dos fatos narrados e como as histórias são contadas. Acho muito interessante o trabalho com atores e atrizes desconhecidos (acredito que eles causam maior impacto ao público), do que as celebridades de Hollywood, pois as cenas são mais limitadas impossibilitando-os de aprofundar a fundo o personagem às vezes... Com suas frescuragens (claro que isso não se aplica à todos). Em “A Cor Azul é Mais forte”, vemos claramente através dos olhares de Adèle e Emma, a forte ligação que uma exerce sobre a outra. Isso Chama bastante atenção pelas cenas de sexo explicito (raramente proporcionadas a nós), conduzidas sem pudor, sem medo das reações, da sociedade e das criticas negativas. Fica então claro e escancarado o convite que Kechiche nos faz, a uma reflexão de que não entendemos nada sobre o amor e suas ambigüidades.
Adèle é uma linda jovem que ainda não se descobriu definitivamente. Suas verdadeiras vontades e ansiedades ainda não foram descobertas por completo (dá para ver em seu olhar a duvida disso); ela conhece Thomas, um rapaz de boa aparência na faculdade sob influência das amigas. Logo em seguida, eles começam um romance casual: a primeira cena de sexo que serviu como prelúdio para o que viria entre as duas protagonistas, se percebe bem um pouco a penetração de Thomas com ela, mas seria café pequeno aos minutos seguintes servindo como uma espécie de preparação. Apesar do bom romance entre os dois... Ela sente que há uma lacuna ainda não preenchida na sua vida sexual e sem saber exatamente o que fazer para saciar seus anseios; ela termina com o jovem rapaz por não se sentir completa. Os dias se seguem.
Indo para a faculdade, ao longe, vem descontraidamente, parecendo não se preocupar com nada na vida, uma garota sorridente abraçada com outra, diferente e chamativa. Seu olhar bate nela corriqueiramente despertando algo em si. A linda moça de cabelos azuis, passa encarando-a misteriosamente não se importando, deixando-a desnorteada por alguns segundos perdendo até mesmo o fôlego. Nasce um desejo recíproco sem ela mesma saber explicar exatamente, como se um raio tivesse atravessado sua cabeça. Sua vontade começa a falar mais alto, se masturbando toda vez que vem a lembrança daquela menina alegre, que viu passar abraçada com outra. Os dias vão passando e a vida das jovens segue; como a de qualquer outra e aquela garota, que apareceu como uma fantasma, fica em sua lembrança no seu inconsciente, sem ela saber como fazer para encontrá-la ou se voltará a vê-la outro dia. Uma noite qualquer, Adèle vai até uma boate gay com seu amigo de faculdade fazendo uma companhia. Por se sentir entediada, ela sai e vai para outra boate (novamente seguindo seu instinto) em busca de algo que lhe dê prazer e preencha a sua lacuna sexual, chegando rapidamente a uma boate de lésbicas e lá; ela se depara com a mesma garota misteriosa dos cabelos azuis que viu semanas atrás. Rapidamente sem muita cerimônia, uma se aproxima da outra iniciando uma conversa e o mais interessante: uma é completamente o oposto da outra. Os gostos são diferentes em tudo e até para o cinema, nas artes em geral. Emma está no quarto ano de Belas artes quase se formando, Adèle, está no primeiro ano de letras e a partir daí, uma vai entrando no mundo da outra aos poucos, deixando-a mais excitada por uma experiência que ela deseja fortemente cada vez mais. Com o passar dos dias, o sentimento vai tomando conta de si, olhando até com admiração para aquela linda misteriosa, atraente de olhar violento e cabelos curtos azuis. Vemos claramente no primeiro beijo das duas, que ali seria mais que sexo casual. Uma paixão fora do comum, expressada pela excitação das duas nas telas.
O sexo explicito nos cinemas é visto por mal olhares por muitas pessoas e usado por raríssimos diretores como uma tática (muito boa), de botar o dedo na ferida, sem medo das criticas que podem ser cruéis. A admiração fica muito mais com os atores (atrizes aqui), que não tiveram medo e caíram de cabeça nos seus papéis, passando uma sensação estranha ao publico, tirando sussurros e exclamações de algumas pessoas. A narrativa é lenta e consegue prender muito bem, criando um clima tenso entre seus extremos conflitos até seu ápice. A atuação da atriz Léa Seydoux (apesar de estar mais masculina) nos passa uma áurea absurda de que ela está no comando, e sabe ser atraente ao seu modo, envolvendo todo o seu intelecto, com um olhar penetrante de personalidade forte, exibindo toda a sua segurança enérgica. A bela Adèle Exarchopoulos é o lado oposto de Emma ( interpretada por Léa), uma tímida e sensual estudante do curso de letras e professora do primário, nos mostra sua timidez sem saber qual dos sexos a satisfaz perdurando como um clímax até o beijo das duas.
Kechiche nos mostra uma longa seqüência filmada em sete dias coincidentemente em sete minutos de um sexo; até forte que tenho certeza, deixará muita gente roendo os dedos nas poltronas. Adèle abaixa até o clitóris de Emma, enquanto as duas entrelaçam o corpo uma consumindo a outra vorazmente como em um belo quadro de Gustav Klimt mostrado de longe. Adorei isso. Uma forma de expressar a arte das duas em seus desejos. Percebi que a personagem Emma é a mais forte emocionalmente, desapegada aos seus relacionamentos e eu adorei isso nela também. E mais interessante, foi ver ela com um olhar prazeroso e diabólico, socando os cinco dedos no anus de Adèle, mesclando dor ao prazer (e não são dublês), meu deu uma idéia de quem estava nas rédeas do relacionamento e iria sofrer com a separação no fim (acredite, um dos momentos mais divertidos do longa).
Pena que o final foi sem graça para mim como um capitulo de um seriado qualquer e algumas cenas desnecessárias. Fica cada um como queira ter acabado ou deduzido, talvez o trágico destino de uma das garotas (quem sabe o da querida Adèle).
Mas fica aqui a relevante reflexão que nos é despertada de que o amor...
Na verdade... O que nós sabemos sobre o amor não é mesmo? Um longa expressivo que mostra a força da natureza entre dois seres, que poderiam ficar séculos, copulando ao bel-prazer, nascidas uma para a outra sem se preocupar com o resto do mundo apesar de suas diferenças.
Boa Projeção.
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