Sensível, profundo, triste, extremamente belo.
Rir, chorar, brincar, pular, coisas tão simples e as vezes tão insignificante, ganham peso, vida e fôlego nesse filme tão simples, porém tão intenso e comovente. Minha vida sem mim é uma bela história sobre viver. Sem ser piegas ou se prender a clichês (sobre moça com câncer que vive intensamente e aprende algo muito importante sobre a vida e acaba morrendo no leito de um hospital, derramando lágrimas afirmando que foi feliz, ao som de uma música melodramática, levando a todos a chorar), o longa mostra a vida em direção a iminente morte e como momentos bobos podem trazer tão impressionante voracidade e desejo pela vida.
Ann (Sara Polley) é uma jovem mãe de duas pequenas garotinhas, casada com um homem brincalhão, Dom (ver nome) que trabalha num emprego não tão bom assim. Eles moram num trailer no jardim da casa da mãe dela, entretanto Ann não possui uma relação muito afetiva com ela. Enquanto seu marido trabalha durante o dia, ela descansa, pois seu turno de trabalho é a noite, limpando os chãos de uma universidade. A vida não é fácil e ela não se sente feliz. Uma consulta ao médico, devido a alguns problemas com a saude, faz com que ela descubra que tem um câncer em estágio terminal e sem muitas chances de tratamento. Ann ao saber dessa notícia fica balanceada, mas resolve não tratá-lo, não quer passar os últimos dias de sua vida num hospital internada, ou ver sua família a vendo debilitada. Ela guarda a doença para si e resolve fazer um balanço de sua vida e colocar numa lista um singelo número de metas que deseja realizar antes de morrer: pintar o cabelo, almoçar num especifico restaurante, pintar as unhas com cores coloridas e juvenis e ter um caso, por fim, pede para que o seu médico entregue uma série de fitas gravadas por ela ao marido, sua mãe, seu breve caso e suas filhas, explicando o motivo pela qual não contou sobre a doença e como ela deseja que eles continuem suas vidas. Com passos lentos, de forma singela e bem intimista, o longa vai nos mostrando esse caminho por qual Ann atravessa e como aos poucos ela vai realizando esses desejos.
O filme tem uma sensibilidade tão terna com cada personagem que nem mesmo a traição dela fica como algo perverssivo (?). Lee (Marc Ruffalo), o amante, é um homem amargurado pela vida, de fala mansa e pouco diálogo, ele se interessa por ela, mesmo ela dizendo que ele não saberá nada sobre ela. A relação dos dois é algo muito comovente, apesar dela ser casada, a forma como ela guiada, faz com que torçamos por eles, mas nessa história, a felicidade não se dá tão facilmente. Da mesma forma, a vizinha que ela conhece próximo ao final do filme, que Ann vê como possibilidade para ser a mãe das filhas delas e esposa de seu marido, quando ela não estiver mais por perto, é trágico, doloroso e sensível, porém como ela mesmo fala a certa altura, a vida deles continuarão e tudo prosseguirá e ela se preocupa com eles, por isso, tenta aproximar essa mulher da família dela.
A trilha sonora é soberba, a melodia que guia o filme é lenta, suave, bela e profunda, capaz de despertar uma tristeza que nos faz chorar, em falar nisso, lágrimas é o que mais se derramará nesse filme. A música que inicia o filme e é tocada em diversos momentos é realmente muito linda. A cena do supermercado é extremamente bonita, revelando o tom que o filme quer nos propor: apreciar a beleza em momentos não tão belos assim.
A fotografia gélida ajuda a manter o filme um pouco distante, mantendo um certo equilíbrio com a história, para não tornar o longa muito melodramático. Algumas cenas não são mostradas justamente por esse motivo, o momento em que ela revela para Lee sobre a doença e sua vida, o momento de sua morte, a do marido e sua mãe ouvindo as fitas. Essas fitas são gravadas quase ao final do longa, nas cenas são mostradas ela gravando as mensagens para sua mãe e seu marido, sendo que essas ações são realizadas por eles, dando a entender que a ouviram. Apenas com Lee, o mostra ouvindo a fita, com essa cena encerrando o filme, num estilo bem tradicional, a voz dela em off, eles continuando com suas vidas e ao fundo, uma bela e terna melodia. Esse recurso é bem utilizado, já que a história é intensa, a trilha é profunda e faz um contrabalanço, deixando o longa mais limpo, menos trágico.
A direção é de Isabel Coixot, essa diretoria tem feito trabalhos excelentes que vão nessa mesma linha: filmes de poucas palavras, porém com muitos sentimentos. É dela também o ótimo A vida secreta das palavras. Uma diretora talentosa que sabe retirar das imagens, dos momentos silenciosos, do belo trabalho com a trilha, o melhor que esses elementos podem oferecer: causar no espectador uma tensão, comoção e sensibilidade sem apelar para um diálogo sofrível, meloso ou cenas direcionadas para as lágrimas fáceis. Nesse filme, tudo é bem equilibrado, a lentidão do filme faz com que se crie uma intimidade com os personagens e seus dramas, a trilha suaviza, mas ao mesmo tempo confere peso ao momento, ou seja, nenhum sentimento vem de graça, eles são bem trabalhados pela diretora.
O elenco está ótimo, Sara Polley é uma atriz excepcional, segura bem a personagem, inclusive nas cenas em que há maior tensão. Marck Rufalo no papel de um homem amargurado que tem um peso sobre a face, se saiu muito bem. Ele soube fazer uma ótima escolha ao optar por um filme que, apesar de ser pouco comercial, tem uma ótima história e um excelente roteiro.
Minha vida sem mim é um belo drama sobre viver, sobre a vida, mesmo que essa seja, em alguns momentos, tão miserável. Afinal, rir, chorar, sofrer, pular, brincar são atitudes tão simples, mas que nos mostram que ainda estamos vivos, e se estamos vivos, ainda podemos lutar, pois depois da morte não há mais nada, nem dor, alegria, receio ou arrependimento.
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